O escritor português José Saramago (1922-2010) era um mestre em definir os principais ímpetos humanos. “De que adianta falar de motivos, às vezes basta um só, às vezes nem juntando todos”, escreveu o lusitano. Não bastasse a situação econômica, as novas — mesmo que legais e declaradas — revelações em torno dos investimentos do ministro da Economia, Paulo Guedes, deram armas para a contestação por parte da classe política. Membros do Centrão veem a oportunidade perfeita para minguar a imagem de Guedes, com a revelação de que o ministro mantém uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas. Segundo parlamentares, a intenção não envolve, expressamente, derrubar o ministro, mas enfraquecê-lo e torná-lo mais, diga-se, flexível às demandas da classe política.
Se, em outro momento, os movimentos pela recriação do Ministério do Trabalho deram certo, parlamentares estão ávidos pela volta da pasta do Planejamento — com indicação, claro, de alguém que atenda às vontades de deputados e senadores. A recriação de uma pasta “carimbadora de projetos” é um dos desejos mais inerentes de políticos, que veem em Guedes um muro para seus anseios. Para parlamentares, não adianta derrubar o ministro sem ter quem botar no lugar. Por um simples motivo: membros do governo e do Congresso Nacional não vislumbram um substituto à altura do ministro, que passe a confiança ao mercado de que o presidente Jair Bolsonaro manterá que sejam resquícios de uma agenda liberal na gestão da Economia.
Segundo deputados e senadores, os depoimentos de Guedes à Câmara e ao Senado prometem ser marcados por cobranças ao ministro — que, reitere-se, não leva desaforo para casa. Em abril de 2019, em um sessão na Câmara dos Deputados sobre a reforma da Previdência, o ministro reagiu às provocações do deputado Zeca Dirceu (PT-SP), que chamou Guedes de “tchutchuca de banqueiros”, e a sessão foi encerrada. Membros do Centrão admitem que a personalidade do ministro dificulta a aprovação de projetos enviados pela pasta da Economia. Não bastassem a pressão pública por resultados, a necessidade da aprovação de reformas e os índices inflacionários e de recuperação da economia, tudo o que o ministro não precisava era de mais um motivo para ser achacado pelos parlamentares. Saramago tem razão.