Toda vez que o presidente Jair Bolsonaro ou algum de seus assessores mais próximos abre a boca para comentar assuntos relativos ao ambiente e ao cenário internacional, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, tem arrepios. Isso porque cada desaforo disparado das cercanias do gabinete presidencial balança os alicerces de uma das principais conquistas econômicas da atual gestão — e que teve a participação direta da ministra. Foi ela quem encarou uma agenda pesada de reuniões com os representantes do bloco europeu para garantir a qualidade dos produtos agrícolas brasileiros e assim fechar, enfim, em junho, os termos do Acordo de Livre-Comércio entre o Mercosul e a União Europeia, depois de vinte anos de idas e vindas. A expectativa é que, uma vez em vigor, a medida elimine os impostos sobre mais de 90% dos produtos negociados entre os dois blocos, o que aumentará substancialmente a competitividade na Europa do que se produz por aqui e alavancará o PIB nacional em 400 bilhões de reais em quinze anos.
O problema é que, para entrar em vigor, o acordo precisa ser ratificado pelas 32 Casas legislativas dos membros dos dois grupos comerciais e pelo Parlamento Europeu. E as constantes barbeiragens diplomáticas do chefe de Tereza Cristina tornam essa possibilidade cada vez mais remota. O desmatamento recorde nas florestas brasileiras e a inépcia para o controle do vazamento de petróleo nas praias do Nordeste tisnaram a imagem do Brasil na Europa (leia mais). “Não podemos assinar um acordo comercial com um país que não respeita a Amazônia”, atacou a ministra do Meio Ambiente da França, Elisabeth Borne, em outubro. Para que o acordo não naufrague, o Itamaraty, sob o comando errático do ministro Ernesto Araújo, terá de se empenhar muito em mudar a péssima imagem do Brasil no exterior. Não será tarefa fácil para 2020.
Publicado em VEJA de 1º de janeiro de 2020, edição nº 2667