Seca, calor, incêndios e fumaça são extremamente preocupantes, mas não colocam em risco o abastecimento nacional de alimentos. O impacto deve ser sentido no IPCA, de forma pontual mas não a longo prazo. Segundo especialistas consultados por VEJA.
Durante a 12ª edição do painel das Perspectivas para a Agropecuária, na terça-feira, 17, o diretor de Política Agrícola e Informações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) Silvio Porto, afirmou que a intensificação dos eventos climáticos desafia as previsões para a safra 2024-2025 e o país está registrando níveis de aquecimento muito antes do que do que o projetado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
“Nos últimos 14 meses, tivemos uma elevação de 1,5°C acima da média histórica, algo que era projetado para acontecer apenas em 2050”, disse Porto. Segundo ele, a Conab já se prepara para monitorar de perto os impactos climáticos, mês a mês na produção, já que o cenário é complexo e incerto.
“É algo que é bastante preocupante, nós estamos vendo possivelmente um atraso novamente no plantio em função das chuvas que ainda não chegaram, nós não sabemos se esse atraso será intenso ou se as chuvas serão muito irregulares”, disse Porto.
Responsável por 30% do PIB brasileiro, o Agronegócio irá cada vez mais enfrentar intempéries climáticas. “Se a gente olha de uma forma sistêmica, o que a gente observa é um desequilíbrio estrutural que tem impactos em todas as dimensões. Tanto na dimensão da qualidade de vida, do bolso, no sentido da economia, da geração de empregos”, diz o economista Gilberto Braga, professor do Ibmec.
Com ações emergenciais, focadas em corrigir eventos já detectados, e sem uma política consistente de médio e longo prazo que gere impacto econômico e melhore a qualidade de vida, a agenda do governo se desintegra, segundo o especialista.
Pequenos e médios produtores são os mais afetados pelos eventos climáticos. Embora haja prejuízos, o agronegócio industrial já utiliza tecnologias avançadas, como maquinário, armazenamento de colheita e irrigação, permitindo manejar e minimizar os impactos,
“A gente observa uma degradação muito mais do ecossistema natural, das áreas de preservação, dos parques e das agriculturas, dos pequenos e médios negócios, ou o que é chamado de agricultura familiar, pequenas propriedades, que não têm esses mesmos mecanismos de defesa e de proteção”, diz Braga.
As secas vão deixar os alimentos mais caros?
Tendem a subir produtos que são culturas perenes, como laranja, café e melão. Esses produtos são mais afetados pelas más condições climáticas, já que sua qualidade depende de fatores como ar, chuva e o solo.
Desequilíbrios alteram a cor e sumo do fruto, prejudicando o padrão de qualidade. Os preços da laranja pera continuam subindo, com a média da fruta na árvore atingindo R$ 113,89/cx nesta semana, um aumento de 4,3%.
Pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – CEPEA da Esalq/USP atribuem a alta ao calor em São Paulo, que impulsionou a demanda, e à nova estimativa do Fundecitrus, que prevê uma safra menor do que o esperado. A oferta limitada e a falta de chuvas, que deixam as frutas murchas, também contribuem para a alta dos preços.
Além disso, também há impactos regionais em culturas como a cana-de-açúcar, atingidas pelos incêndios. Os preços do açúcar cristal branco seguem em alta no estado de São Paulo. Pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – CEPEA Esalq/USP indicam retração na oferta por parte das usinas, devido à seca e às queimadas, e à ligeira melhora na demanda.
Impactos na inflação serão pontuais, segundo Braga. “Vai ter movimentos de oferta afetados de maneira mais pontual. E isso também abre aspectos para repiques de inflação, repiques no IPCA, mas a gente não pode dizer que serão permanentes e longevos”, diz. Embora haja aumento pontual nos preços, não há risco de desabastecimento significativo, segundo ele.
Arroz e feijão mais baratos
Em meio aos desafios climáticos que se apresentam a cada nova safra, a Conab no entanto afirma que a combinação básica da mesa do brasileiro está garantida: Arroz e feijão devem apresentar novo crescimento no volume a ser colhido no ciclo 2024/2025. A alta é influenciada pela ligeira recuperação na área plantada dos dois principais produtos.
Com avanço de 11% na área de cultivo, o arroz é um dos destaques positivos e deve pesar menos no bolso. “Isso nos dá tranquilidade em relação ao abastecimento interno, há uma perspectiva de maior disponibilidade, redução de preços, o governo espera que nós possamos ter preços para 2025 inferiores ao patamar que nós estamos vivendo nos últimos 5 anos”, disse nesta terça-feira, 17, o diretor Conab, Silvio Porto.
“Depois do Rio Grande do Sul, o governo deu tanto estímulo que as indicações até agora sugerem que vários agricultores nessa retomada, e mesmo aqueles que não foram afetados, foram plantar arroz, porque o governo começou a dar incentivo”, explica o professor da Ibmec.