A Câmara dos Deputados aprovou a retomada do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), tribunal administrativo que julga conflitos tributários entre a Receita e os contribuintes, por votação simbólica.
O voto de qualidade, que desempata julgamentos no Conselho a favor da Receita Federal, havia sido extinto em 2020 pelo Congresso, mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, decidiu retomar o dispositivo por meio de medida provisória, que caducou. Com a aprovação, a pauta da Câmara está destravada para a votação do Arcabouço Fiscal, porém o novo marco fiscal deve ficar para agosto.
Prioridade no início ‘supersemana’ na Câmara, a matéria perdeu espaço para a reforma tributária, que ganhou empenho direto do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Porém, após a aprovação da PEC sobre o sistema de impostos sobre o consumo, o governo conseguiu reunir um consenso para o tema. “Essa é uma vitória para o país. Agradeço aos líderes, aos deputados, por termos construído esse consenso”, disse o líder do governo, José Guimarães (PT-CE) após a conclusão da votação do texto-base e destaques.
A medida é uma das prioridades na agenda de Haddad, isto porque o texto é uma das frentes que o governo abriu para engordar a arrecadação — e fundamental para a sustentação do novo marco fiscal. Os processos tributários que correm no conselho superam a marca de 1 trilhão de reais, mas demoram a ser julgados. Em 2021, foram julgados cerca de 30 mil casos, com 47,6 bilhões de reais em discussão; no ano passado, apenas 11 mil casos foram apreciados, mas o montante foi de 132,5 bilhões de reais. E os casos não param de subir: saíram de 90,9 mil em 2021 para 92,4 mil em 2022.
O parecer do deputado Beto Pereira (PSDB-MS), no Carf, manteve o voto favorável ao governo quando houver empate nas decisões do tribunal administrativo que julga causas tributárias. Desde 2020, o empate entre os julgadores beneficia o contribuinte, após alteração do Congresso. O parlamentar, no entanto, colocou no texto um acordo entre o governo e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que exclui as multas e juros cobrados dos contribuintes quando o julgamento for favorável ao Fisco pelo voto de qualidade.
O relator mexeu no texto e manteve o atual limite de alçada em 60 salários mínimos (79,2 mil reais). A proposta inciial do governo era de (1,32 milhão) de reais. Esse é o valor mínimo que define a competência do Carf para julgar um processo administrativo — ou seja, é o valor a partir do qual o contribuinte pode recorrer ao Carf. “Houve um apelo do setor produtivo, frentes parlamentares e diversas confederações, um questionamento muito grande sobre cercear um direito do contribuinte com limite de alçada de mil salários mínimos. O degrau era muito grande”, disse.
A maior pressão contrária ao projeto está ligada à Frente Parlamentar do Agronegócio, que na véspera se posicionou contra a volta do voto de qualidade e aumentou a desconfiança quanto a aprovação das medidas econômicas. Os deputados ligados ao agro levaram a Haddad uma proposta para que a execução de garantias de contribuintes derrotados no Carf só ocorra depois do trânsito em julgado (decisão final) de recursos apresentados à Justiça. Isto porque, após perder o julgamento, as empresas costumam procurar o judiciário.
Segundo a OCDE, grupo que reúne as economias mais comprometidas com a modernização dos regimes fiscais, poucos países permitem o envolvimento do setor privado no julgamento administrativos de recursos fiscais. O argumento da OCDE, aliás, é uma das principais armas de Haddad para convencer os deputados a votarem a favor da medida, dizendo se necessária para o ingresso do Brasil no grupo dos países ricos.
Vinculado à Receita Federal, o Carf julga, na esfera administrativa, questionamentos de contribuintes sobre cobranças do Fisco.