Em maio, o governo de Mauricio Macri pediu ao Fundo Monetário Internacional um socorro financeiro de 30 bilhões de dólares. O empréstimo foi a última alternativa de Macri para evitar o colapso da economia argentina. Ele sabia bem o que aconteceria em Buenos Aires uma vez que a medida fosse anunciada: revolta imediata da população. Ao assumir, com a promessa de reduzir a inflação altíssima do país, o presidente fora recebido pelo eleitorado e pelo mercado financeiro de braços abertos. Mas, ao fazer o pedido de ajuda e aceitar as condições de austeridade que a instituição propõe, Macri viu sua popularidade ruir — e el amor acabó. Pudera. Um de seus compromissos de campanha era evitar qualquer relação com o FMI. Desde os anos 1980, os portenhos têm ojeriza ao FMI, a quem culpam por suas sucessivas crises a partir de então. É um caso clássico de confusão entre causa e consequência, mas a confusão faz um barulho danado.
Macri também não ajudou. Depois de falhar em atingir as metas de inflação por dois anos seguidos, o governo trocou os pés pelas mãos em uma série de medidas apressadas, como a venda acelerada das reservas do país em dólar. No momento em que pediu o socorro financeiro, a Argentina só tinha recursos em moeda estrangeira suficientes para pagar suas despesas até o fim do ano.
Não bastassem as responsabilidades de Macri, a Argentina carrega problemas de longa data. Em 2001, sem condições de honrar os empréstimos que contraíra com o FMI, o país tentou um último pedido de socorro. Teve o pleito negado, pois não havia cumprido plenamente as medidas de austeridade acordadas anteriormente, como o corte de despesas do governo e o aumento das taxas de juros. A Argentina, em resposta, declarou moratória e acabou mergulhando numa grave crise — e boa parte dos argentinos culpa o FMI pelo desastre que sobreveio.
Agora, com o desemprego beirando os 10%, a inflação na casa dos 30% ao ano e o aumento do rigor fiscal, a população revisita a crise do início dos anos 2000. Apesar de tudo, Macri já anunciou que tentará a reeleição à Casa Rosada em 2019. Seu único trunfo é que a oposição também é alvo da fúria hermana.
Publicado em VEJA de 26 de dezembro de 2018, edição nº 2614