Tânia Maria, revelação de ‘O Agente Secreto’, a VEJA: ‘Vi meu primeiro filme aos 72 anos’
Uma das estrelas do filme de Kleber Mendonça Filho cotado para o Oscar, atriz de 78 anos fala sobre os prazeres de ter se encontrado nas telas
Brilha em O Agente Secreto — thriller político nacional que pode concorrer ao Oscar — a personagem dona Sebastiana, uma senhora que cuida de um prédio habitado por refugiados políticos durante a ditadura militar brasileira. Com seu jeito acolhedor, ela reúne pessoas de diferentes contextos que têm em comum a procura pela sobrevivência – entre elas o protagonista Marcelo (Wagner Moura), que vai a Recife buscar seu filho e fugir do país. Interpretada por Tânia Maria, de 78 anos, a atriz foi uma descoberta do diretor Kleber Mendonça Filho durante as filmagens de Bacurau (2019). Atuando como figurante na obra, ela conquistou Kleber e foi lembrada por ele durante a escrita do roteiro de O Agente Secreto. Espontânea e despreocupada, dona Sebastiana rouba a cena em O Agente Secreto: sua atuação passa longe de parecer roteirizada, seu humor vem de forma simples nas falas e nos maneirismos da personagem e o entrosamento com Wagner Moura é nítido.
Artesã e residente do interior do Rio Grande do Norte, Tânia Maria teve um início tardio no mundo do cinema, mas não se intimidou com isso, como conta a VEJA. Sua performance nos sets de gravação foi bastante natural: “Eu não estava nem aí se estavam gravando ou não. Não me emocionava com nada, só estava sendo eu mesma”, diz ela. Sobre interpretar alguém responsável por cuidar de perseguidos políticos, Tânia compara sua personagem a ela mesma: “Eu sou desse jeito, sou acolhedora. Em todo filme que eu faço, eu sou acolhedora”.
Como resultado dessa identificação com o ofício de atriz, Tânia Maria pode chegar ao Oscar, a mais importante premiação de cinema do mundo. Pela revista americana Variety, Tânia já foi até apontada como uma das possíveis indicadas a melhor atriz coadjuvante. Em entrevista, ela conta sobre seu início na atuação, o equilíbrio entre suas duas profissões e também a expectativa pelo reconhecimento nacional e internacional. Confira:
Como foi sua trajetória até entrar no mundo do cinema? Quando eu era mais nova, trabalhava como costureira. Eu ia para as casas em João Pessoa e fazia vestido de noiva e das damas. Do homem, só não fazia o paletó — mas fazia calças, camisas, tudo. Preparava os noivos e as daminhas. Depois que eu fui ficando mais velha, voltei para minha casa na zona rural do Rio Grande do Norte, em Cobra, no município de Parelhas, e resolvi que não ia mais costurar, mas sim me tornar artesã. Comecei fabricando tapetes e conjuntos de banheiro e de cozinha. Ainda hoje eu faço. Ainda sou artesã.
O ofício vem de família? Não, minha mãe era costureira. Eu continuei com a costura e hoje sou artesã. Eu trabalhava nisso por aqui na época de Bacurau. Vieram aqui no meu povoado procurar figurantes. Eu estava dentro de casa costurando, escutei umas falas aqui na sala, fui até lá e disse: “Boa noite”. Quando eu disse isso, Renata Roberta, que era quem estava inscrevendo os figurantes, disse: “Era dessa fala que eu estava precisando”. Então ela me inscreveu para ser figurante de Bacurau pela minha fala, porque eu sou rouca. Fumei por 65 anos, acendia um cigarro no outro.
Como foi a experiência? Quando eu cheguei para gravar Bacurau, todo dia eu queria entrar em cena. Todo dia eu chegava logo cedo no povoado da Barra e Kleber me dava a chance de eu entrar em cena, para ser figurante. Todo dia ele me dizia o que era para fazer. E um dia aconteceu uma história engraçada. Em Bacurau, morre muita gente. Morria gente todo dia, e Kleber me dizia como era para eu passar no velório. Todo dia ele dizia para eu passar séria, correndo, sem olhar. Um dia, ele cochichou no meu ouvido e eu não entendi muito bem. Aí eu fechei os olhos e passei. Nisso, passei perto de uma câmera e um tripé, tropecei no tripé e a câmera caiu. Kleber perguntou o que havia acontecido, e eu questionei: “Você não mandou eu passar cega?” E ele disse: “Não, eu mandei você passar séria”.
Depois disso, como se aproximou a Kleber? Um dia eu estava lá no refeitório em Barra, e Kleber estava numa mesa com Leonardo Lacca [diretor assistente de O Agente Secreto] e Juliano Dornelles [cineasta]. Aí eles disseram: “Senta aqui na mesa para almoçar com a gente”. Então ele disse: “Conta aí um pouquinho da sua vida”. Eu comecei a contar como era a minha vida, e Leo disse: “É de você que eu estou precisando para a história do meu avô”. Aí pronto, quando terminou Bacurau, eu fui fazer o filme de Leo Lacca em Recife, Seu Cavalcanti. Depois, gravei com Juliano Dornelles e Tiago Melo. Na mesma época do filme de Tiago, estava acontecendo O Agente Secreto em Recife. Eu gravava um dia em Picuí, na Paraíba, e outro dia em Recife. Eu fiz 15 viagens de onde eu moro até Recife, em torno de 6 horas de viagem. Recentemente, eu fiz outro filme, gravado em Caicó, no Rio Grande do Norte, chamado Almeidinha. Nunca tinha feito tantas viagens. Eu só vivia em casa trabalhando. Mas como atriz, pude ir para Brasília, assisti O Agente Secreto com Lula no Palácio da Alvorada. Depois fui para a pré-estreia do filme em Recife. Participei da pré-estreia de O Agente Secreto em Natal, no Rio Grande do Norte e em São Paulo. De novembro a fevereiro, gravo um filme em Fortaleza.
Como era a relação da senhora com filmes antes de se tornar atriz? Eu não sabia nem o que era filme. Nunca tinha assistido. A primeira vez que eu assisti foi com Bacurau, já aos 72 anos. Eu pensava em costurar, mas nunca em ser atriz. Assisto televisão, mas não acompanho nada porque não tenho tempo. A única novela que eu assisti foi Pai Herói (1979). Assisti de verdade porque sou fã de Tony Ramos.
A senhora passou de uma pessoa que não via filmes para uma pessoa que virou atriz de cinema. Como reagiu a essa mudança? Eu reagi normal. Quando eu estava gravando, falaram que ia chegar um ator bem famoso, aí diziam: “Olhe, não vá se emocionar que vai chegar um ator muito famoso”. Aí eu disse: “Quem é”? Ele disse: “Wagner Moura”. Eu digo que nunca ouvi nem falar. Eu nunca tinha assistido filme com ele. Aí foi normal. Mas a minha amizade com o Wagner Moura é grande. Aí quando a gente se encontra, é muito bom. Sou muito amiga dele.
E estando no set de Bacurau, seu primeiro filme, como foi a sensação de saber que estava sendo gravada? Era tão normal. Eu não estava nem aí se estavam gravando ou não. Não me emocionava com nada. Eu estava sendo eu mesma. Eu sou desse jeito, sou acolhedora. Em todo filme que eu faço, eu sou acolhedora, e eu sou de verdade. Quem chegar na minha casa é bem acolhido. Todos os filmes que eu fiz até hoje foram fumando e acolhendo.
Um tempo atrás, viralizou uma frase da senhora falando que não sabia o que era Oscar. Agora, depois do sucesso do filme, você já conhece um pouco mais desse mundo? Agora eu estou entendendo mais ou menos. É muita felicidade. Só de colocarem meu nome, já é muita coisa. Só de Tânia Maria poder ir para o Oscar, já é muita coisa.
O que mais gosta em O Agente Secreto? Quando a gente pensa que está começando, já está terminando. São 2 horas e 40 minutos de filme, mas passa tão rápido, que eu queria mais. É um filme que a gente não cansa de assistir. Os diretores são bons. As personagens são ótimas, a gente se tornou uma família. Kleber é um amor, Leo Lacca e Wagner Moura me ensinaram muita coisa. É bom demais, todos eram meus professores.
O que diria para pessoas que têm a vontade de começar a atuar, mas acham que está muito tarde para isso ou não conseguem encontrar uma motivação para perseguir esse desejo? Eu me sinto feliz demais fazendo filmes, adoro quando vem um filme. E nunca é tarde. Estou vivendo o tempo, e a idade não ofende. Eu tenho 78 anos, tenho facilidade de decorar. Eu só sou meio cansada para caminhar, porque tenho muita ansiedade. Mas nós vamos à luta. Nunca é tarde.
Tem vontade de protagonizar algum filme um dia? Não, acho muito difícil. Eu não tenho nem ideia de outras coisas que quero fazer no cinema. Estou só vivendo o tempo.
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