Menina Veneno faz quarenta anos em 2023. Como explica a longevidade de seu hit? Lembro quando os Beatles completaram 25 anos de Sgt. Pepper’s e fiquei maravilhado como uma obra pop podia durar tanto. Agora, estamos falando de quarenta anos de uma canção infinitamente inferior a qualquer composição dos Beatles. Fico feliz de estar com saúde para encarar o que considero minha segunda grande turnê. Depois do sucesso nos anos 80, enfrentei uma espécie de ostracismo.
O que a música dos anos 80 teve de especial para ser tão lembrada? Os anos 80 foram mágicos. Foi um momento de abertura política. A censura estava desmoronando. Por algum motivo, as sutilezas e perversões de Menina Veneno passaram batido pela censura.
Afinal, debaixo de seu sotaque inglês em Menina Veneno, a letra diz “abajur cor de cáqui”, “carmim” ou “de carne”? Não é cor de cáqui. E cor de carmim é um pleonasmo: é como dizer cor de vermelho. O correto é cor de carne, mesmo. Engraçado que só homens implicam com essa cor. Deve ser porque eles nunca compraram uma meia-calça. Pensam logo no churrasco.
Seu estilo de música pop teria influenciado até o sertanejo romântico que surgiria tempos depois no Brasil, concorda com essa teoria, defendida por muitos críticos daqui? As primeiras duplas sertanejas beberam da minha música, tenho certeza disso. Eu era um artista popular, não de rock. A MTV brasileira nunca me deu espaço, eu fazia programas populares, como o do Chacrinha.
O senhor gravou Shy Moon, de Caetano Veloso. Nunca pensou em gravar London, London, a mais conhecida música escrita em inglês por ele? Caetano não queria gravar Shy Moon. Ele achava o inglês muito infantil. Mas, quando eu disse que queria gravar, ele mudou de ideia. Caetano gostou de saber que um britânico tinha aprovado. Coisa que não aconteceu com London, London. Recusei gravá-la porque ali tem uns erros de inglês que eu não ficaria confortável em cantar. Deram para o Paulo Ricardo, do RPM, e ela virou aquele enorme sucesso. Ele cantou o inglês errado com uma convicção que eu não teria.
Como ocorreu sua mudança para o Brasil, nos anos 70? Estava em um estúdio em Londres quando conheci Rita Lee. Ela e a sua turma queriam conhecer a região e fomos para o País de Gales escalar uma montanha. Lá no alto, no meio de violões, flautas e outras coisas, um deles me disse que eu deveria conhecer o Brasil. Sabe aquele convite de brasileiro, “Passa lá em casa”? Acreditei. E eles se surpreenderam quando apareci no Brasil. Morei com os Mutantes na Serra da Cantareira, em São Paulo. Casei-me com uma brasileira. Comecei a dar aula de inglês para Gal Costa e ela mostrou uma fita demo para um executivo da CBS. O que veio depois superou todas as minhas expectativas.
Publicado em VEJA de 21 de Junho de 2023, edição nº 2846