Novo ‘Matrix’ abraça nostalgia e faz graça com a própria história
Em 'Ressurections', quarto filme da franquia, Neo e Trinity estão de volta, agora vinte anos mais velhos e presos na Matrix

Lançado em 1999, Matrix provocou um abalo sísmico no cinema. Um filme quase perfeito, diriam os entendidos. Como, então, superá-lo? As criadoras da franquia, as irmãs Wachowski, tentaram duas vezes, nas dispensáveis continuações Reloaded e Revolutions, ambas de 2003. Não deu certo. Pretensiosos e confusos, os dois filmes bagunçaram a história e, no fim, a sensação foi de que eles só existiram como meras obras caça-níqueis. Seria possível, então, 22 anos depois do lançamento do original, que a quarta parte da história fosse, enfim, melhor? Também não. E essa nem era a pretensão da diretora Lana Wachowski, que co-escreveu o novo roteiro com David Mitchell e Aleksandar Hemon. Sua tática: abraçar a mitologia e se divertir com ela.
Matrix Resurrections, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 23, não se leva a sério – e isso é bom. O longa arranca sinceras risadas da plateia com sua torrente sem fim de autorreferências. Boa parte da graça vem do ator Yahya Abdul-Mateen II, que entrou no lugar Laurence Fishburne, no papel de Morpheus. Acredite: a substituição faz todo sentido. Dizer mais que isso é dar spoilers desnecessários. Os astros Keanu Reeves e Carrie-Anne Moss estão de volta como os protagonistas Neo e Trinity. Aos 50 e tantos anos, ambos continuam usando roupas de couro e lutando kung-fu como nunca.
No enredo, Neo está vinte anos mais velho e escolheu tomar a pílula azul, em vez da vermelha – e por isso continua preso dentro da Matrix. Os sonhos com o passado de lutas contra as máquinas parece uma grande alucinação da sua cabeça. Agora rico, ele usou essa alucinação, que é a história do filme de 1999, como enredo para criar um videogame dos mais bem-sucedidos. De seu sócio, no entanto, escuta que o mercado exige lançamentos de continuações, “ainda que as continuações sejam ruins” – captou a ironia?

Embora a pílula azul mantenha Neo preso na Matrix, são as sessões com um terapeuta interpretado pelo excelente Neil Patrick Harris que o mantêm são e acreditando que a guerra apocalíptica é apenas um delírio. Em alguns momentos, aliás, as falas do terapeuta parecem estar sendo direcionadas para a diretora Lana Wachowski, que entre o primeiro filme e agora mudou de sexo, assim como sua irmã. “Você não pode abraçar o futuro sem chegar a um acordo com o seu passado”, diz o personagem de Harris.
Em suma, fica uma sensação de dejá vù ao assistir ao novo Matrix, com sua infinidade de personagens do passado indo e vindo. Mas o objetivo de Neo agora não é salvar a humanidade e, sim, conquistar novamente Trinity (que está casada e com dois filhos). No fundo, Matrix Ressurections é uma grande história de amor, cujo alicerce é a química entre os dois personagens.
Claro, há ainda as armas. Muitas delas. Os efeitos especiais e o tal “bullet time” (que são as cenas em câmera lenta) estão lá também, bem como as elaboradíssimas cenas de luta. Perseguições de carro, de moto e naves futurísticas também compõem as cenas de ação. O novo Matrix, enfim, é um tributo ao passado – e, de quebra, entrega uma conclusão mais satisfatória para a franquia que aquele lamentável desfecho de Revolutions, que nunca convenceu ninguém.