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‘Era uma vez em… Hollywood’: por que amamos ver crimes reais no cinema?

Novo filme de Quentin Tarantino estrela Brad Pitt, Leonardo DiCaprio e Margot Robbie em trama inspirada em assassinatos de Charles Manson

Por Juliana Varella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 20 mar 2019, 22h10 - Publicado em 20 mar 2019, 20h21
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  • O nono e possivelmente penúltimo filme de Quentin Tarantino, Era Uma Vez em… Hollywood, ganhou seu primeiro trailer nesta quarta-feira, 20. Nele, são devidamente apresentados os personagens de Leonardo DiCaprio, Brad Pitt e Margot Robbie: o primeiro é um ator de filmes de ação chamado Rick Dalton; o segundo é seu dublê; e a terceira é Sharon Tate, atriz que ficou mais famosa por se tornar uma das vítimas de um assassinato em massa ocorrido em 1969, enquanto estava grávida do diretor Roman Polanski.

    É sobre esse ano em particular e sobre Hollywood, como diz o título, que fala a obra: uma comédia sarcástica e potencialmente sangrenta que promete traçar um diálogo entre a violência do cinema – aquela que alimenta os filmes de artes marciais, faroestes e outros gêneros “de brucutu”, inspirações inegáveis da obra do próprio Tarantino – e a violência da vida real, aquela que alimenta o noticiário e as narrativas do dia a dia.

    História real

    Esta é a primeira vez que o diretor americano mergulha numa história real, mas o evento que inspirou a obra mais parece ficção: o assassinato de celebridades cometido por uma seita com crenças apocalípticas, comandada por um líder que não esteve sequer presente na cena do crime. Esse homem, Charles Manson (Damon Herriman, no filme), morreu em novembro de 2017, preso, sem nunca deixar de ser idolatrado por uma legião de seguidores.

    Na época, o crime ganhou grande repercussão na imprensa americana e causou comoção nacional. “É comum que o público se envolva pessoalmente com uma tragédia que vê nos jornais ou na televisão, como se conhecesse intimamente a vítima”, explica o professor do departamento de psicologia social da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Hélio Deliberador. “As pessoas sentem uma necessidade de participar, de se solidarizar e demonstrar publicamente suas emoções e opiniões, mesmo que nunca tenham tido contato com o personagem.”

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    Para a antropóloga Diana Paola Gómez Mateus, a opção por uma história tão sensível para o público americano pode ser uma forma de o diretor “obrigar a sociedade a se voltar a eventos muito violentos, que causaram grandes danos, e pensar no presente que está vivendo”. Um presente, no caso, marcado pelo retorno de discursos de ódio e segregação, tanto nos Estados Unidos quanto fora dele.

    Por outro lado, é difícil dizer se o filme de Tarantino quer provocar uma reflexão ou se ele é simplesmente fruto de um “caldo de cultura da violência”, como descreve Deliberador, que já está no contexto da obra e de seu criador. “Não se pode dizer o quanto da ficção imita a realidade ou vice-versa”, reflete. O cinema e a vida real sempre vão dialogar e se complementar.

    Banho de sangue em Hollywood

    A violência, é verdade, não é nenhum território inexplorado para Tarantino. Seus jatos de sangue vermelho-groselha, suas cabeças decepadas e a inesquecível overdose grotesca de Uma Thurman em Pulp Fiction ficaram quase tão famosos quanto as histórias que ele contou nos oito longas que lançou até aqui (ele promete, infelizmente, que serão apenas dez).

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    Mas a violência de Tarantino não é como a violência real – ela é exagerada, propositalmente falsa e beira a caricatura. Ela é cômica, mais do que trágica, e é nessa linha entre um extremo e outro que, na opinião do professor de psicologia, o diretor faz seu espelho da humanidade. “Esse fio tênue em que Tarantino atua é muito próximo da experiência humana. Seus filmes fazem pensar sobre a reação que cada pessoa tem quando se vê no limite entre a comédia e a tragédia”, afirma, “e não é verdade que tudo o que chora também pode fazer rir?”

    Para Diana, filmes que exploram a violência, como os de Tarantino, fazem sucesso porque permitem ao público “tocar o impossível”, especialmente quando se vive numa sociedade cheia de proibições, regras e com poucas perspectivas para o futuro. “Eles não são apenas agressivos”, explica, “mas também usam a velocidade, uma junção entre o risível e o condenável e uma visão da transgressão das regras”. Ela acredita que Hollywood “treinou” o olhar do público ao longo dos anos para buscar esse tipo de produções e que, por isso, a violência mostrada ali agrada mais do que incomoda.

    Incômodo ou fascinante, o fato é que Era Uma Vez em… Hollywood vai tentar repetir o feito de Bastardos Inglórios (2009) e trazer um pouco de humor a um momento sombrio da realidade, como poucos cineastas seriam capazes fazer. No dia 15 de agosto, o público vai descobrir se ele conseguiu.

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