Datas: Charlie Watts e Roberto Stuckert
O roqueiro apaixonado por jazz e o repórter fotográfico

Charlie Watts se preparava para dormir depois de um show em Amsterdã, em 1984, quando um embriagado Mick Jagger, na companhia de Keith Richards, ligou para seu quarto de hotel e disparou: “Onde está meu baterista?”. Minutos depois, Watts surgiu no quarto de Jagger impecavelmente vestido — e desferiu um soco no rosto do colega arrogante. “Nunca mais me chame de ‘seu baterista’. Você que é ‘meu vocalista’ ”, disse. A anedota resume a personalidade forte, porém reservada, de Watts, o elegante baterista dos Rolling Stones.
Nascido em 1941, em Londres, ele se apaixonou pelo jazz na infância, influenciado por ícones como Miles Davis, Dexter Gordon e Charlie Parker. Começou a tocar bateria aos 14, e nunca mais parou. Em 1963, após passar por grupos jazzísticos, foi convidado para entrar nos Stones. Com suas pancadas certeiras e sem afetações, Watts deu à banda a personalidade que faltava. Em mais de cinquenta anos de carreira, nunca se deslumbrou com a fama: era o oposto do estereótipo do rockstar. Casado desde 1964 com Shirley Shepherd, sempre se manteve longe das festas e baladas que os amigos de banda frequentavam. Por isso, era considerado pelos outros integrantes como o porto seguro dos Stones.
Embora parte da lendária banda de rock, o jazz era sua paixão. Nos grandes shows, Watts dizia se imaginar tocando em um clube intimista. Em sua carreira paralela, formou grupos de jazz e lançou álbuns em homenagem a seus ídolos. No início de agosto, Watts — que fez um tratamento de câncer de garganta em 2004 — submeteu-se a uma cirurgia por razões não divulgadas, e anunciou que desfalcaria a turnê americana dos Stones. Morreu em 24 de agosto, aos 80 anos, de causas não reveladas, em Londres.
Uma imagem sem palavras

Em 1966, então jovem repórter fotográfico da Folha de S.Paulo, o paraibano Roberto Stuckert foi chamado a registrar uma visita do ministro da Guerra, Arthur da Costa e Silva, ao Congresso. Stuckão, como era chamado, foi lá e fez a foto diante da imensidão de assentos vazios. A imagem ocupou discreta página interna do jornal. Em dezembro de 1968, com Costa e Silva já presidente, o AI-5 em vigor e o Congresso fechado, o repórter de VEJA José Carlos Bardawil viu uma cópia do trabalho de Stuckert numa gaveta. Como a revista preparava uma capa a respeito da tragédia política, Bardawil intuiu ter ali perfeito resumo dos humores daquele tempo. A edição de VEJA com o Costa e Silva de Stuckert estampado sem palavras foi retirada de circulação pela censura. Patriarca de um competente clã de fotógrafos, Stuckão morreu em 23 de agosto, aos 78 anos, em Brasília.
Publicado em VEJA de 1 de setembro de 2021, edição nº 2753