A modernização da monarquia britânica – nobre objetivo que o casamento do príncipe Harry com uma atriz afro-americana de time B, duas vezes divorciada, ajudaria a alcançar – demanda uma atualização também de seus súditos. As críticas que a nova duquesa de Sussex, Meghan Markle, vem sofrendo por se sentar de pernas cruzadas em público denunciam um claro preconceito de quem as emite.
Quem ataca Meghan defende a ideia de que o correto, para uma integrante da família real, é se sentar como faz Kate Middleton, quase sempre vista com as pernas lado a lado, levemente inclinadas, e tornozelos colados, postura que os ingleses já batizaram de “duchess slant”, a “inclinação da duquesa”. Em meio a uma dessas ondas de, digamos, resenhas negativas sobre a forma como Meghan se posiciona em público, o jornal inglês The Sun escreveu: “A mãe-de-três (Kate) aperfeiçoou o que é conhecido como ‘The Duchess Slant’, que consiste em colocar os tornozelos juntos em um lado, evitando qualquer visão estranha”.
A observação de que o modo de Kate se sentar não permite que se tenha, como diz o The Sun, “qualquer visão estranha” faz pensar que a postura da duquesa de Cambridge agrade mais que a da duquesa de Sussex pelo recato que a impede de mostrar mais do que deveria. Uma avaliação impregnada por machismo – ou misoginia: uma representante da realeza não pode deixar escapar qualquer traço de sensualidade, de feminilidade, sob o risco de se tornar inadequada para o papel.
A verdade é que não há uma regra escrita que determine como uma integrante da realeza deve se acomodar sobre uma cadeira. A própria Kate Middleton já foi fotografada em público de pernas cruzadas, e durante uma visita a uma escola. Estava de meia-calça escura, o que encobria as pernas, é verdade, mas não foi a única. A sogra das duas duquesas, a princesa Diana, foi clicada diversas vezes de pernocas cruzadas, e com saias muito mais curtas, ao sabor da moda da época, que deixavam ver mais de suas coxas.
É diante dessas evidências que surge a suspeita de que, mais do que machismo, haja um preconceito – de classe ou mesmo de raça – dirigido a Meghan Markle. Um preconceito que se converte em censura à nova duquesa. Como se admitisse um erro, em um dos eventos em que cruzou as pernas a atriz “se corrigiu”, como disseram diversos veículos britânicos, assumindo em seguida a “inclinação da duquesa”.
Se a monarquia britânica quer investir pesado no marketing da modernização, não deveria ceder a críticas eivadas de preconceito. Deveria, isso sim, combatê-las.