Cinco anos atrás, a professora de história da arte Isabel Cristina Correia de Lima Lima ouviu um pedido de sua filha, Isabela — ou Belinha, como gosta de chamá-la. A moça manifestou o desejo de trocar a carreira de publicitária pela de cantora. E perguntou se a mãe a ajudaria na realização do sonho. Dona Isabel quis saber o óbvio: que tipo de música ela queria interpretar. Questionou se Belinha queria soltar a voz ao ritmo de axé como Ivete Sangalo, se preferia fazer R&B à la Beyoncé, ou talvez cantar covers. Mas a jovem revelava-se indecisa sobre qual caminho seguir. Mesmo em apuros por estar recém-separada do marido, a mãe de classe média de Botafogo não negou fogo — foi vender sanduíches nas escolas onde lecionava para bancar fotos e vídeos da caloura.
O esforço compensou: a carioca Belinha — mais conhecida como IZA — é a novidade mais fulgurante do cenário pop brasileiro. Desde o início da carreira, em 2015, a intérprete de 28 anos já emplacou uma canção entre as dez mais ouvidas nas rádios — o reggae Pesadão. Tem outra faixa — Brisa — indo pelo mesmo caminho. Ostenta uma indicação ao Grammy Latino pelo álbum Dona de Mim (2018) e uma agenda de dez shows mensais, a um cachê médio de 100 000 reais. Nesta semana, estreia como jurada do The Voice, substituindo Carlinhos Brown no sucesso da Globo. “Os diretores acham que sei falar para a minha geração”, diz. Também dá voz à leoa Nala na versão live-action de O Rei Leão. O fato de ser a mesma personagem dublada por Beyoncé no original da Disney impõe um paralelo inevitável. IZA, a aspirante a cantora que não sabia o que queria cantar, transmutou-se na artista mais bem posicionada para ser a resposta brasileira à estrela americana que sabe bem o que quer.
Nas redes sociais, IZA exibe números grandiosos: soma 229 milhões de streamings no Spotify, 2,3 milhões de seguidores no YouTube e outros 7,2 milhões no Instagram. Mesmo assim, ainda está longe de Anitta (39,7 milhões de devotos no Instagram e 12,3 milhões no YouTube) e Ludmilla (5 milhões e 16,6 milhões, respectivamente). Mas ela apresenta diferenciais invejáveis em outros quesitos. Comunga com Beyoncé duas qualidades raras: a voz refinada e a altivez. É linda, mas cultiva uma sensualidade distante do padrão “cachorra”. “A gente vive num mundo em que o sexo foi muito vulgarizado”, entende. A elegância com que se abstém da exposição da vida pessoal afasta fãs agressivos nas redes. “Quase não tenho haters. Sou abençoada”, comemora.
Os vídeos no YouTube chamaram a atenção da gravadora Warner, que a contratou em 2016. Mas, como ela se limitava a fazer cover de sucessos do pop internacional, foi necessário dar uma cara ao trabalho. Coube ao Dogz, time de produtores liderados por Sérgio Santos, a missão de criar uma música de pegada internacional, porém sem os vícios das cantoras brasileiras que tentam emular os trinados de Mariah Carey. IZA, aliás, tem visto esses tiques nos candidatos do The Voice. “Eu nem viro a cadeira. Uma voz pequena mas cheia de sentimento é melhor do que malabarismos”, diz.
Santos é mais que produtor: ganhou o coração de IZA. O romance surgiu nas gravações de Dona de Mim. “Eu já mostrava interesse, mas ele sempre me respeitou. Um dia, cheguei ao estúdio e ele estava com uma namoradinha. Fechei a cara”, lembra IZA. Cantora e produtor casaram-se em dezembro e, por enquanto, sabem separar a vida de casados da profissional. “Às vezes, a gente passa dias sem se falar. Tenho de mandar mensagem para tratar de trabalho”, diz ele.
IZA não é militante aguerrida, mas faz questão de se posicionar. “Existe um ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento negro. Mas uma mulher branca nunca vai saber o que é ser uma mulher negra.” Não à toa, a cantora é fã de Pantera Negra — seus bailarinos fazem o sinal de “Wakanda forever”, um dos bordões do sucesso de bilheteria sobre o herói negro da Marvel.
A chegada ao The Voice é celebrada pelos colegas. “Ela é talentosíssima”, diz Michel Teló. Dona Isabel, a mãe que acreditou na cantora que só tinha exibido seus dotes em festas da infância, vê seu sucesso com satisfação. Mas exige que a filha continue humilde. “Ela é IZA da porta para fora. Aqui, ela é a Belinha.”
Publicado em VEJA de 31 de julho de 2019, edição nº 2645