1 – Years and Years (HBO)
Os Lyons notam a existência da subcelebridade Vivienne Rook (Emma Thompson) porque ela “detona” em um programa na TV ao afirmar que está pouco se lixando para israelenses e palestinos. Viv viraliza e lança uma carreira política que até pouco tempo atrás pareceria piada. Não mais, claro — e Years and Years prevê que a era do populismo crasso está só começando. Nos quinze anos que a trama abarca, os Lyons serão tocados por uma escalada de crises: fúria anti-imigração, quebradeira bancária, ataques nucleares, supressão de liberdades. Com ritmo vertiginoso, dom para aterrorizar e delicioso senso do absurdo, a minissérie faz o presente germinar em um futuro que, mais até que plausível, parece inevitável.
2 – The Politician (Netflix)
A série do roteirista Ryan Murphy (de Glee) se passa no ambiente frívolo de um colégio americano, mas seu conteúdo não tem nada de superficial. Por meio da história do estudante e milionário Payton Hobart (Ben Platt), Murphy faz uma brilhante — e divertidíssima — análise dos traços constitutivos de um político. Ao mesmo tempo, ele pinta um retrato corrosivo do circo da política contemporânea, da manipulação cínica da defesa das minorias às táticas populistas. Cercado por aspones juvenis e até por uma típica “mulher de político”, Hobart move montanhas em nome de sua obsessão: eleger-se líder do grêmio de seu colégio, na Califórnia — o que vê como primeiro passo na ascensão rumo à Presidência americana.
3 – Chernobyl (HBO)
Precisamente à 1h23 de 26 de abril de 1986 começou o pior pesadelo do planeta pós-II Guerra Mundial: o reator 4 da usina ucraniana de Chernobyl explodiu, expondo 195 toneladas de combustível nuclear incandescente e contaminando áreas rurais e cidades populosas num raio de centenas de quilômetros. O governo soviético primeiro optou pelo silêncio criminoso — e, depois, jogou meio milhão de trabalhadores desprotegidos na tarefa de conter o desastre. Em sua primorosa reconstituição do acidente e do que se seguiu a ele, esta minissérie conjura um horror e uma angústia quase intoleráveis, e deixa seu recado alarmante: não há perigo maior que a indiferença de um Estado que se coloca acima de seus cidadãos.
4 – Fleabag (Amazon Prime Video)
Uma mulher de 30 e poucos anos, escrachada, sedenta por sexo e em crise com a família. À primeira vista, o mote de Fleabag cheira a uma reunião de clichês das séries femininas moderninhas. Um mergulho nos episódios, porém, prova o contrário. Phoebe Waller-Bridge, protagonista e roteirista, subverte os chavões feministas com uma apetitosa dose de picardia britânica e, com olhadelas de cumplicidade para a câmera, traz para seu lado os espectadores. Criada em 2016, a série brilhou no Emmy em 2019 com sua segunda temporada. O casamento do pai com uma detestável madrasta (Olivia Colman) aproxima a heroína de um padre bonitão (Andrew Scott), que desperta nela um inusitado dilema entre carne e espírito.
5 – Sob Pressão — terceira temporada (Globo)
Primeiro drama médico de sucesso da TV brasileira, a série deu aulas de produção e atuação em sua temporada de 2019. Os protagonistas Evandro e Carolina (Júlio Andrade e Marjorie Estiano) assumem a ala cirúrgica de um precário hospital público do Rio, que tem como agravante a localização: uma vizinhança dominada pela milícia. Para além da saúde, os dramas dos pacientes refletem o caos e a violência do entorno. Num ótimo episódio gravado em plano-sequência, o hospital virou campo de guerra ao ser invadido por milicianos que trocavam tiros com a polícia. Essa deveria ter sido a última fase da série — felizmente, a Globo adiou seu fim e fará uma quarta temporada, ainda sem data prevista de estreia.
6 – Watchmen (HBO)
Em Tulsa, Oklahoma, um novo ciclo de violência irrompe, opondo uma facção subterrânea de supremacistas brancos a uma polícia que anda mascarada, age nas sombras e faz as próprias regras. Enquanto isso, tempestades de lulas (sim, lulas) se abatem sobre a cidade — e, numa mansão no campo inglês, um homem faz experimentos bizarros de clonagem. Desdobrando para o presente o universo da célebre graphic novel publicada pelo inglês Alan Moore nos anos 80, Damon Lindelof, um dos criadores de Lost e agora de Watchmen, concentra na tela o clima instável e imprevisível de um mundo em que o neofascismo avança, convidando a respostas quase tão nocivas quanto o próprio mal que procuram combater.
Publicado em VEJA de 1º de janeiro de 2020, edição nº 2667