Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Continua após publicidade

As Bahias e a Cozinha Mineira: a Parada LGBT+ precisa de autocrítica

Primeiro grupo com artistas trans contratado pela Universal Brasil, a mesma de Ivete Sangalo, trio diz que evento precisa destacar músicos da comunidade

Por Clara Valdiviezo 10 jun 2019, 20h23
  • Seguir materia Seguindo materia
  • A 23ª Parada do Orgulho LGBT+ em São Paulo acontece no domingo, dia 23 de junho e, segundo o trio As Bahias e a Cozinha Mineira, precisa de uma “autocrítica”. O grupo, composto por Assucena Assucena, Raquel Virgínia e Rafael Acerbi — duas mulheres transgênero (pessoas que não se identificam com seu sexo de nascimento) e um homem cisgênero (que se identifica com seu sexo biológico) —, diz que o maior evento do tipo do mundo precisa dar mais visibilidade a artistas que são parte da comunidade LGBT+ e não a músicos de sucesso, como Anitta e Ivete Sangalo. “São artistas geniais, sou fã de todas, mas existem momentos para que certas figuras ganhem destaque”, diz Raquel.

    Ivete e As Bahias e a Cozinha Mineira fazem parte da mesma gravadora, a Universal Brasil — é a primeira vez que o braço brasileiro da gigante do showbiz tem em seu elenco artistas transexuais. No dia 31 de maio, o trio lançou Tarântula, o seu terceiro álbum e o primeiro fora da cena independente. O nome é uma apologia à operação que exterminou pessoas transexuais durante a ditadura militar. Assucena, Raquel e Rafael falaram a VEJA:

    Por que batizar um álbum com o nome de uma operação transfóbica? (Assucena) É a segunda vez na verdade que a gente faz isso. Nosso segundo álbum se chama Bixa, que sempre foi o pejorativo do que é ser travesti, do que é ser homossexual, do que é ser sapatão. É minorar ainda mais o indivíduo. Além da LGBTfobia, também tem o machismo intrínseco. A gente se apropria daquilo que antes era a nossa mácula, do que era nossa vergonha, e agora é nosso orgulho. Eu não tenho mais vergonha disso.

    Falando de orgulho, o que é a Parada do Orgulho LGBT+ hoje? (Raquel) Eu tenho uma série de questionamentos a respeito de onde saem as decisões sobre quem vai ganhar o destaque. Mas eu acho também que é um lugar de festa, e o público LGBT tem o direito de escolher o seus ídolos. Não é obrigatório gostar de artistas LGBTs só porque você é LGBT, mas nesse caso específico eu acho que a gente precisa fazer um ponto de reflexão e autocrítica para saber a quem a gente está dando destaque num momento desse. Eu já fui muitas vezes na Parada, tinham artistas que eu admiro profundamente, mas que eu acho que não era o momento de o holofote estar neles.

    Por exemplo? (Raquel) Por exemplo, Ivete Sangalo e Anitta. São artistas geniais, sou fã de todas, mas existem momentos e momentos para que certas figuras ganhem destaque.

    Existem artistas e marcas que não estão necessariamente inseridos na comunidade, mas falam e investem no assunto. Como veem isso? (Raquel) Eu acho que marcas não são oportunistas. É óbvio que empresas querem lucro, a gente não pode perder isso de vista. Mas eu quero mais é que empresas que invistam na causa LGBT ganhem muito dinheiro com isso. Quanto mais lucro vier dessa causa, mais vão investir, e a causa vai se expandir, popularizar. Vai virar um debate onde mais pessoas têm acesso. Mesmo que uma marca fale assim: “Vou investir nelas, porque eu quero o público delas”. Tudo bem, é uma troca. Não tenho essa leitura de oportunismo. Acho que oportunismo é não dar um centavo à causa e querer ganhar com ela.

    Continua após a publicidade

    Pode dar um exemplo? (Raquel) Por exemplo, fazer uma campanha sobre pessoas trans sem pessoas trans. É diferente de você pegar pessoas trans e construir uma campanha com elas. Ser oportunista é quando, uma novela, por exemplo, diz que está debatendo questão trans, mas usa artistas cisgênero. Isso é ser oportunista, querer falar do assunto sem as pessoas do tema.

    Eu acho que marcas não são oportunistas. Eu quero mais é que empresas que invistam na causa LGBT ganhem muito dinheiro com isso. Quanto mais lucro vier dessa causa, mais vão investir, e a causa vai se expandir, popularizar

    Raquel Virgínia

    Rafael, sendo um homem cisgênero, branco e heterossexual, já sofreu preconceito por estar junto de duas mulheres transexuais? (Rafael) Nunca sofri. Não sei o que é ser uma mulher travesti, mas sei exatamente o que é ser um homem branco e o que me cabe dentro dessa história.

    Como é ser trans e viver de arte no Brasil? (Raquel) O mundo trans é desconhecido por grande parte da população mundial. A gente ainda não teve nem a oportunidade de se explicar, porque os espaços são muito pequenos. Qual artista trans você conhece de projeção nacional? As pessoas confundem Pabllo (Vittar), um homem branco, gay e cis, que tem uma personagem que se chama Pabllo Vittar. Mas quem são as personalidades trans que circulam nacionalmente e são populares? Não existe. A Roberta Close talvez seja a personagem mais icônica.

    (Assucena) As pessoas trans sofreram por muito tempo com falta de credibilidade. Os espaços que nos eram dados eram os jocosos, não existia a oportunidade de trabalho. O que estamos representando é que podemos ser qualquer coisa: funkeiras, como a Linn da Quebrada, artistas de palco, como Liniker, ou MPB, como As Bahias. Nós sabemos que somos capazes, mas o mundo precisa entender que podemos ser muito mais. Ser trans não traz um deficit criativo ou estético. Ser artista em um país como o Brasil já é difícil, sendo trans, muito mais. A junção dessas duas coisas só dificulta. Ideia todo artista tem, a dificuldade é colocar em prática. Você precisa de uma pessoa que realize seu projeto. Participei de festivais que impulsionaram a minha arte com base em uma lei. Em um país de dimensões continentais, a cultura deveria ser vista como investimento, não como gasto.

    Continua após a publicidade

    Já usaram a Lei Rouanet? (Raquel) A gente não usou diretamente, mas acho que a gente participou de muitos festivais que usaram. A lei nos beneficiou indiretamente.

    Como foi a transição da carreira independente para uma gravadora como Universal? (Assucena) Sempre quis expandir os nossos horizontes. Dentro da cena independente, tem um lugar que você chega e não consegue ampliar. Não tenho dinheiro para pôr em rádio, a gravadora tem. Não tenho dinheiro para veicular a minha arte no Brasil como a gravadora tem. Acho que as gravadoras não morreram, elas não estão perto de morrer, elas estão se reinventando, e muito bem.

    De onde vem a principal renda do grupo? São shows, vendas de discos? (Assucena) A principal renda é de shows. Eles são a medula óssea da carreira de um artista. Mas ao entrar em uma gravadora temos mais opções, como a publicidade ou influência digital. Quando estamos em alta temporada, no lançamento de um disco, a gente faz uma média de 8 a 12 shows por mês. Em baixa temporada, fazemos por volta de 4 a 5 por mês, pelo menos um por semana.

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

    a partir de 39,96/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.