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A aposta na diversidade leva a boneca Barbie de volta ao topo

A sessentona rejuvenesce com exemplares que valorizam todo tipo de corpo. Com o empurrão da quarentena, a marca encanta a criançada de novo

Por Sabrina Brito Atualizado em 4 jun 2024, 14h33 - Publicado em 6 nov 2020, 06h00

Eram os anos dourados da economia americana e a feira de brinquedos de Nova York atraía visitantes de diversas partes do mundo, principalmente varejistas interessados nas novidades. Em 1959, eles faziam os pedidos em março para garantir o produto nas lojas pelo menos dois meses antes das festas de fim de ano. Os negócios corriam bem, mas uma boneca em especial, com 28 centímetros de altura, cabelos loiros e traços adultos — diferente dos bebês de brinquedo comuns à época —, chamava atenção de quem passava pelo estande da Mattel, uma empresa fundada catorze anos antes pelo casal Ruth e Elliot Handler com o sócio Harold “Matt” Matson, conhecida por fabricar instrumentos musicais de plástico, carrosséis e bolas mágicas. O evento marcou o nascimento da Barbie, um fenômeno mundial e o principal produto da companhia, junto com os carrinhos Hot Wheels, lançados alguns anos depois.

Como bom desempenho no passado não é garantia de sucesso futuro, a boneca preferida das meninas começou a perder o charme no século XXI. As vendas entraram em declínio e ela acabaria cedendo espaço não só para jogos eletrônicos como também para outras linhas da própria Mattel. Para complicar, a Barbie se tornou alvo de críticas. Ela seria mais um produto a sinalizar o machismo intrínseco da indústria, inclusive a de brinquedos. Assim, passaram a ser comuns comentários sobre os ideais que a boneca representaria, com seu rosto de traço ocidental, corpo magérrimo, pele clara e guarda-roupa de última moda — tudo muito distante da realidade de boa parte das consumidoras, as meninas de até 10 anos, de etnias variadas, miscigenadas, de países, climas e classes sociais distintos.

arte-Barbie

A polêmica durou duas décadas, até que, em 2016, a Mattel — que já vinha oferecendo a boneca em versões de outras etnias — fez seu movimento mais arrojado, lançando modelos com tipos diferentes de corpo, além do original: alto, baixo e com os quadris mais largos, além de uma variedade de tons de pele, penteados, cor de cabelo e olhos. A notícia chegou à capa da revista Time daquele ano, que estampou a chamada: “Agora podemos parar de falar do meu corpo?”.

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A partir de então, a diversificação não parou mais. Nos últimos anos, foram criados 170 modelos de Barbie, inclusive com vitiligo, sem cabelos (fazendo alusão a crianças que passam por quimioterapia) e com próteses nas pernas, além de versões inspiradas em astronautas, cantoras e artistas de cinema. A iniciativa, embora tardia, revelou-se acertada, e a Barbie voltou a encantar a criançada. “É fundamental que todo jovem se identifique com seus brinquedos”, diz Sandra Haddad, diretora da rede Ri Happy. Segundo a executiva, o mercado infantil tem se apoiado em todas as iniciativas que promovam a diversidade, e as vendas crescentes em diferentes segmentos provam que a decisão faz todo o sentido.

Com a recente repaginação e um empurrãozinho da pandemia, que trancou as crianças em casa, a Barbie recuperou boa parte de sua glória. As vendas da matriz americana subiram e, ainda que os números no Brasil não tenham sido divulgados, a rede Ri Happy reportou resultados bastante expressivos. A Mattel, inclusive, voltou ao centro das polêmicas ao pôr no mercado a linha que celebra o Día de los Muertos, um dos feriados mais celebrados do México, que rivaliza em importância com o Carnaval brasileiro. Com maquiagem facial e ornamentos coloridos típicos da ocasião, a Barbie apareceu em duas edições especiais (2019 e 2020) vendidas a preço de brinquedo de adulto: 75 dólares, ou aproximadamente 430 reais. Algu­mas vozes latinas bradaram queixas de apropriação cultural — o que não teve muito efeito no mercado, uma vez que os primeiros lotes das duas versões se esgotaram.

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OUSADIA – Edição especial: tributo ao Dia dos Mortos – (./Divulgação)

O nome Barbie foi escolhido por ser o apelido de Barbara, filha dos Handler. Foi ao ver a menina brincando com suas bonecas de papel que Ruth teve a ideia de lançar um brinquedo com corpo e estilo de mulher adulta. Deu certo: só no ano do lançamento, aproximadamente 300 000 unidades foram vendidas, apesar do preço acima da média de mercado. O sucesso arrebatador fez com que a Mattel abrisse seu capital na bolsa e escritórios em outros países — ela chegaria em 1988 ao Brasil, onde antes reinava a Susi, uma espécie de clone inspirado no original americano.

Em seus altos e baixos, a Mattel vendeu cerca de 1 bilhão de unidades de Barbie desde seu lançamento, há 61 anos. Se a companhia conseguirá superar ou ao menos repetir o feito nas próximas seis décadas, é impossível dizer. Até que outra consiga tirar seu cetro e igualar essa marca, a Barbie ainda será por muito tempo a rainha de todas a bonecas.

Publicado em VEJA de 11 de novembro de 2020, edição nº 2712

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