Tendência do umbigo de fora volta a aparecer nas passarelas e nas ruas
Trata-se de um manifesto de liberdade que vai e vem como ondas no mar

Para os budistas, é a essência do universo. Os obstetras o tratam com respeito. As dançarinas do ventre, como um modo de vida. No mundo ocidental, há conotação sensual. Na praia, soa tão indiferente quanto um grão de areia. O umbigo, a cicatriz que nos leva a lembrar da ancestralidade materna, foi sempre um elemento decisivo da moda — ora escondido e recatado, ora descoberto e imodesto. Mostrá-lo, a rigor, nunca deixou de ser tabu, mesmo em tempos de maior liberdade, de corpos em exposição. Eis que, agora em 2025, tê-lo desnudo voltou a virar tendência nos desfiles de moda, no verão do hemisfério ocidental, no inverno cá embaixo. E dá-lhe barrigas à mostra.

Grifes como Chanel, Gucci, Dolce&Gabbana, Chloé e Courrèges puseram modelos nas passarelas com a calça ou a saia um tantinho para baixo e a camisa e camiseta um tantão para cima. Apostaram, com pompa e circunstância, nos croppeds minimalistas — o cropped (cortado, em tradução livre) é a blusa feminina que parece ter comprimento mais curto do que o esperado. A cantora americana Jennifer Lopez, que não perde oportunidade de não perder oportunidade, foi ao Grammy dentro de um vestido assinado pelo estilista Stéphane Rolland, de saia transparente e brilhante com um top preto de mangas compridas e luvas — mas chamou mesmo atenção pela parte do corpo que não levava pano algum. A atriz e modelo brasileira Bruna Marquezine usa e abusa do recurso, sem censura nem vergonha alguma.


Não se trata, é verdade, de movimento inédito. É onda que faz parte do vaivém da moda, o tal ciclo de vinte anos, em marolas que vão e vêm, sem fim — mas brotou forte demais, hoje, para ser empurrada para debaixo do tapete. Soa tão anos 1990, tão antigo e batido, justamente por ser atemporal. É estilo que reafirma uma convicção: quando a sociedade quer dizer alguma coisa, pode cantar, pode escrever, fazer filmes e obras de arte, ou então tirar roupas do armário. A maré conservadora que se espraia pelo mundo, e é natural que ela também contamine a seara do comportamento, conduziu a algum tipo de resposta, e o jeito de mostrar o corpo é uma delas. “A moda cultua o desejo”, diz a designer Vivi Ruiz. “Em tempo de Ozempic e Mounjaro, de padrões de magreza que parecem voltar no tempo, é natural que exibir a barriga seja uma escolha.” São as mulheres dando o recado, rompendo tabus. Ressalve-se, porém, que uma singela barriguinha e mesmo barrigões de grávidas como a de Rihanna já não movem montanhas. Deixaram de provocar o espanto de antes.

É ilusão, contudo, supor que não incomodem. Incomodam, sim, tiram do conforto os preconceituosos de quatro costados. Vale lembrar uma frase recente de Britney Spears, a pioneira que lá nos anos 2000 carimbou o look: “Mostrar a barriga era minha forma de ser forte, de ser eu mesma”. É isso. Definitivamente, o umbigo é o centro do mundo — e da moda.
Publicado em VEJA de 25 de julho de 2025, edição nº 2954