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Sites para montar árvore genealógica viram moda entre os jovens

Eles envolvem toda a família no projeto e correm para mostrar os resultados nas redes sociais

Por Camille Mello Atualizado em 4 nov 2022, 10h24 - Publicado em 4 nov 2022, 06h00

Reza um preceito da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, a religião dos mórmons, que as famílias voltarão a se unir na vida depois da morte e, por isso, é essencial identificar e preservar os laços com todos os ancestrais. Imbuída desse propósito, a igreja, desde sua fundação, em 1894, se empenha em buscar todos os dados familiares dos fiéis — e, em varreduras que vão de certidões de nascimento, casamento e óbito a testamentos e compra e venda de imóveis, acumulou ao longo de mais de um século cerca de 5 bilhões de documentos digitalizados, tornando-se o maior acervo genealógico do mundo. Esse imenso arquivo é aberto a consulta gratuita e alimenta árvores genealógicas há anos, sobretudo depois que foi organizado no site Family Search. A novidade agora é que reconstituir o passado familiar virou moda: no TikTok, tambor de tudo o que cai no gosto dos jovens (de bom e mau), os conteúdos relacionados à plataforma ultrapassam 50 milhões de visualizações

Foi justamente um dos vídeos que viralizaram na internet que despertou o interesse da designer curitibana Camila Opieco Christofis, 33 anos, em construir sua árvore genealógica. “Vi pessoas que diziam ter encontrado informações sobre ancestrais na era dos vikings, entre reis e rainhas. Fiquei curiosa em conhecer meu passado também”, explica Camila. A brincadeira acabou virando uma investigação de amplo interesse familiar. “Perguntei à minha avó coisas sobre meus bisavós para cadastrar na plataforma e isso gerou uma comoção no grupo da família. Agora estamos combinando reuniões com parentes de outras cidades para procurar mais dados”, diz. Outro usuário, o corretor de imóveis cearense Carlos Gabriel Lira, 28 anos, afirma que se sentiu um personagem da história ao deparar com figuras do século XVI em longínquos ramos de sua linhagem. “Para minha surpresa, aprendi que sou descendente do rei dom Manuel I, de Portugal, e também de Branca Dias, uma das primeiras judias que chegaram ao Brasil fugindo da Inquisição”, relata Lira.

Para facilitar a busca de dados, a equipe de trabalho da igreja mórmon, em parceria com arquivos nacionais, tribunais de Justiça e dioceses, instalou 5 700 unidades de digitalização em mais de 140 países — o Brasil concentra o segundo maior número desses centros de dados, atrás apenas dos Estados Unidos. A precisão das árvores genealógicas criadas pelo Family Search é validada por especialistas, mas requer a colaboração contínua do usuário. “Quanto mais a pessoa vai alimentando a própria árvore com nomes, sobrenomes e fotos, mais a inteligência artificial recomenda documentos e sugere familiares distantes”, explica Fabio Falcão, gerente-geral do FamilySearch Brasil. A magia da tecnologia adicionada a um muito ambicionado senso de pertencimento formaria a base da atração dos jovens pela antiquíssima ciência da genealogia. “As novas gerações têm múltiplas referências de identidade, mas elas são fragmentadas e fluidas. É compreensível que busquem raízes sólidas e de confiança”, analisa o cientista social Leonne Domingues.

PASSO A PASSO - A designer Camilla Christofis, 33 anos, se interessou pela árvore genealógica vendo vídeos de pessoas que acharam reis e rainhas na sua. A família se empolgou. “Combinamos reuniões com parentes de outras cidades para buscar dados”, diz. -
PASSO A PASSO – A designer Camilla Christofis, 33 anos, se interessou pela árvore genealógica vendo vídeos de pessoas que acharam reis e rainhas na sua. A família se empolgou. “Combinamos reuniões com parentes de outras cidades para buscar dados”, diz. – (./Arquivo pessoal)

Além de montar a árvore dos antepassados, os sites genealógicos prestam outro serviço: facilitam o acesso a antigos registros de imigrantes nos processos de aquisição de cidadania estrangeira. A frieza do propósito não apaga a emoção dos usuários ao deparar com fatos e fotos do passado. A estudante peruana Ivanna Benites, 25 anos, passou a admirar ainda mais a avó, que faleceu recentemente, ao descobrir que ela teve outro filho, além de sua mãe, aos 13 anos. “Isso me fez pensar no quanto ela deve ter sofrido naquela época. O que contribuiu para ela se tornar a mulher séria e forte que eu conheci”, diz Ivanna.

Alvo de contínuo fascínio de mórmons e também de não mórmons, o acervo genealógico da igreja está acondicionado desde 1965 no Cofre de Registros da Montanha de Granito, uma série de salas escavadas em uma rocha perto de Salt Lake City, no estado de Utah, onde a religião foi fundada. A entrada é exclusiva de funcionários, que cuidam, entre outras funções, da digitalização de uma inestimável coleção de microfilmes. Tal qual o Family Search, outros sites oferecem preciosos dados genealógicos, mas a maioria é paga ou se restringe a certas áreas ou grupos de pessoas. Um dos mais usados, o MyHeri­tage, oferece o serviço extra de apontar relação entre as árvores dos usuários. O JewishGen, ligado ao Museu da Herança Judaica de Nova York, dá acesso a registros exclusivos das famílias judaicas. O britânico FindMyPast tem um acervo de mais de 2 bilhões de documentos da Inglaterra, Escócia e País de Gales. O Ancestry oferece um teste de DNA que revela as origens étnicas do cliente. Nenhum deles, no entanto, conta com a abrangência e a diversidade de informação do arquivo guardado dentro da pedra em Utah. Acessá-lo é uma aventura — irresistível, dada a facilidade.

Publicado em VEJA de 9 de novembro de 2022, edição nº 2814

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