Até outro dia, palacete digno desse nome tinha de ter uma bela piscina no jardim. Mas, diante da competição e das dimensões cada vez mais extravagantes das mansões dos milionários, o espaço para se refrescar também deu um salto qualitativo: chique mesmo é poder exibir seu próprio lago, com peixinhos, plantas aquáticas e água onde se pode mergulhar e nadar. Ter um lago para chamar de seu não é novidade e várias empresas, no Brasil e no exterior, se especializaram em construir do nada uma extensão de água tranquila e cristalina. A maioria delas se enquadra na categoria ornamental, destinadas apenas a enfeitar, mas o know-how para tornar a água própria para banho também é conhecido e utilizado há tempos. No último ano, no entanto, as encomendas se multiplicaram, mais um efeito colateral da — sempre ela — pandemia. “Muitas pessoas viram que seus apartamentos não as representavam e mudaram de vida, buscando mais contato com a natureza”, teoriza Carlos Oliveira, coordenador de projetos da Ecosys, que constrói lagos artificiais.
No Reino Unido, os paisagistas registraram um aumento de 150% nos pedidos de projetos de lagos para nadar durante e após os meses de isolamento. Ajuda a turbinar a demanda o fato de estarem presentes nas casas de campo de celebridades como o cantor Ed Sheeran e David e Victoria Beckham. O casal inclusive demorou meses para convencer os vizinhos de que seu gigante de mais de 4 000 metros quadrados não causaria danos ao meio ambiente. No Brasil, o ator Bruno Gagliasso postou recentemente fotos do lago particular que construiu em seu sítio em Membeca, no estado do Rio, onde nadam — ele, a mulher, Giovanna Ewbank, e os filhos — na companhia de carpas e ciclídeos, esse um peixe de água doce natural do Malaui, na África, onde nasceram os dois adotivos. “Participei de todo o processo de construção com a equipe. Quando ficou pronto eu pirei. Não tinha ideia do amor que ia sentir pelos peixes”, derrama-se Gagliasso.
Ter um lago no quintal de casa requer um caixa reforçado. Para manter a água cristalina, sem lama nem resíduos e imune a algas, são utilizados seis tipos de filtro em operação 24 horas por dia, além de bombas de recirculação e oxigenação da água — um maquinário complexo que costuma ficar escondido sob um deque. O metro quadrado da obra varia entre 3 000 e 6 000 reais, dependendo da profundidade e das características do terreno. Nada que desanime os entusiastas: Ricardo Caporossi, dono da Geneses Ecossistemas, de São Paulo, que tem entre seus clientes os apresentadores Xuxa e Serginho Groisman, diz que vendeu trinta projetos no último ano. Do portfólio de Oliveira, da Ecosys, que atende Rodrigo Faro e Isabella Fiorentino, consta um lago monumental em uma mansão em Bragança Paulista, interior de São Paulo, com 4 metros de profundidade, 2 milhões de litros de água, mais de 60 000 peixes e 100 000 mudas de plantas aquáticas. “Demorou dez meses para ficar pronto e a casa de máquinas precisou ser disfarçada sob um morro suave coberto de vegetação”, descreve.
Os cuidados para manter a água sempre cristalina distanciam os lagos para nadar dos ornamentais, que, embora bem cuidados, têm certa liberdade para exibir algas e resíduos comuns em represas naturais. “Eventualmente vão aparecer minhocas, insetos, outros peixes. É a natureza seguindo seu curso”, diz o biólogo Abílio Soares Gomes, da UFF. Por mais que os donos evitem o termo, o lago para se banhar não deixa de ser uma piscina estilizada. “A água não tem cloro, mas exige tratamento contínuo”, ressalta Gomes. Curiosamente, a maioria dos pedidos parte dos homens. “As mulheres têm receio de que vá se tornar um espaço sujo, cheio de lama. Mas depois de pronto elas também se encantam”, afirma Caporossi. Em Uberaba, Minas Gerais, o administrador de empresas Alceu Vieira, de 52 anos, trocou há um ano a piscina por um lago e está feliz da vida. “Fico em paz só de olhar para ele”, diz. Que dirá nadando entre peixinhos e plantas coloridas.
Publicado em VEJA de 16 de março de 2022, edição nº 2780