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Crise e mudanças nos hábitos elevam a idade dos veículos no Brasil

O fenômeno traz preocupações ambientais e de segurança

Por Luiz Felipe Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 19 jun 2022, 08h00

Durante um périplo pela Europa, em 1990, Fernando Collor de Mello causou certa indignação ao dizer que “comparados aos carros do primeiro mundo, os brasileiros são verdadeiras carroças”. O presidente, que deixaria o cargo dois anos mais tarde em um rumoroso processo de impeachment, tinha razão: a maioria dos veículos estava obsoleta e uma política de abertura à importação era mesmo necessária ao país. Três décadas depois, a declaração de Collor, quem diria, volta a ecoar na indústria automotiva nacional. Em meio à crise econômica e à queda de renda, o Brasil depara com números preocupantes sobre o envelhecimento da frota.

Diversas razões explicam o fenômeno, sendo a mais visível o aumento do preço dos carros zero-quilômetro. Atualmente, os modelos mais baratos do mercado, o Fiat Mobi e o Renault Kwid, não saem por menos de 60 000 reais. As SUVs, queridinhas dos brasileiros, superam a marca dos 100 000 reais. Por esse motivo, comprar seminovos ou manter os atuais, ainda que velhos e desgastados, é uma opção cada vez mais comum. Um estudo do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) mostra que, em dez anos, o número de carros novos caiu quase pela metade e aqueles com tempo de uso entre seis e quinze anos subiu de 38,1% para 57,1% (veja o quadro). “Uma frota envelhecida causa problemas ao meio ambiente, aumenta os acidentes e prejudica o trânsito”, alerta Flávio Padovan, sócio da MRD Consulting, especializada no ramo automotivo.

arte frota

O avanço da idade média dos veículos — de oito para dez anos entre 2012 e 2022 — é resultado de um movimento que começou quase uma década atrás. Em 2013, melhor ano da história da indústria, o Brasil produziu 3,6 milhões de automóveis e comerciais leves e a expectativa era chegar a 5 milhões em um futuro próximo. No entanto, os sacolejos na economia de 2014 a 2016 e, mais adiante, os efeitos da pandemia frearam a euforia. Fábricas foram fechadas, cadeias de suprimento acabaram rompidas — projeções indicam que só deverão se recuperar plenamente em 2025 — e, sobretudo, o poder de compra dos brasileiros caiu. Assim formou-se a tempestade perfeita que desabou sobre o setor.

ENCALHADOS - Lojas em crise: inflação alta afetou as vendas de novos e usados -
ENCALHADOS - Lojas em crise: inflação alta afetou as vendas de novos e usados – (./Divulgação)

O cenário é de fato alarmante, segundo reforçam recentes estatísticas. Quase metade dos 46,6 milhões de veículos que compõem a frota nacional foi produzida antes de 2013, ou seja, em um período anterior à implementação de leis de redução de emissão dos gases de efeito estufa. Automóveis antigos, ressalte-se, poluem mais e, claro, estão sujeitos a variados problemas de manutenção. Diante de tais efeitos colaterais, George Ru­gits­ky, diretor de economia do Sindipeças, defende a adoção de rígidos programas de inspeção veicular: “A medida teria um custo adicional insignificante perto dos riscos que evitaria”, diz. O especialista acredita que carros eletrificados serão um produto de nicho por um bom tempo, em razão dos altíssimos valores envolvidos, e aposta em veículos híbridos a etanol como a solução mais sustentável à mão. O programa de renovação da frota de caminhões e ônibus, anunciado pelo governo federal e ainda não regulamentado, também poderia ajudar.

A crise econômica e as relevantes mudanças nos hábitos de consumo, como o desinteresse das novas gerações por carros, têm tudo para desembocar em um quadro inédito. Nos últimos dois anos, a indústria cresceu só 0,7% e as vendas, abaixo do esperado nos primeiros meses de 2022, abrem a possibilidade de redução da frota, algo que jamais ocorreu na história deste país. “O Brasil não retomará o efervescente patamar de 2012 antes de 2032”, prevê o consultor da Bright Consulting, Cássio Pagliarini. Tudo do que o meio ambiente não precisa é a volta das famigeradas carroças.

Publicado em VEJA de 22 de junho de 2022, edição nº 2794

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