Chile quer mostrar a diversidade de vinhos produzidos no Vale do Maipo
Consumidores estão acostumados a buscar apenas "rótulos chilenos", mas há um esforço dos produtores em apresentar as características de cada terroir
Em países com longa tradição na produção de vinhos, como França, Itália ou Portugal, os consumidores já estão mais acostumados a pedir rótulos de regiões específicas. É assim que escolhem um vinho verde da região norte de Portugal, ou um Chianti da Toscana, ou ainda um rosé de Provence ou um tinto de Bordeaux. Mas quem escolhe um vinho do Chile pensa apenas no país, e dificilmente nas regiões em que ele foi produzido. Agora, produtores locais estão fazendo um esforço para mudar essa situação e associar diferentes rótulos a terroirs específicos.
Essa busca pela identificação das características individuais de diferentes vinhedos, parcelas e regiões não é exclusiva dos chilenos. Assim como acontece na Borgonha, produtores do mundo todo estão se debruçando de forma mais intensa sobre o tema. E, no Chile, um dos locais que têm explorado a maneira como as variações climáticas e geográficas impactam no sabor do vinho é o Vale do Maipo.
A região, próxima a Santiago, reúne 411 produtores que possuem quase 11 mil hectares (de um total de 130 mil em todo o Chile). Por lá, a Cabernet Sauvignon é a variedade tinta mais plantada, seguida pela Carmenere, em menor quantidade. Entre as brancas, há um equilíbrio entre Chardonnay e Sauvignon Blanc. O Vale é dividido em zonas distintas: Maipo Costa, mais próxima do Oceano Pacífico, Maipo Entre Cordillera, na área entre o oceano e a Cordilheira dos Andes, e Maipo Andes, aos pés das montanhas.
O Vale Costa, por exemplo, tem uma importante influência marítima que cria um clima mais fresco. “A colheita acontece um mês mais tarde do que em outras regiões”, conta Camilo Rahmer, enólogo da vinícola Três Palacios. O solo é de origem granítica muito antiga. Assim, os vinhos lá produzidos têm um perfil mais herbáceo e floral e são versáteis gastronomicamente. É o caso do Merlot Merlot feito pela Tres Palacios. “É uma casta subestimada no Chile e difícil de ser usada em rótulos de alta qualidade, mas que conseguimos produzir pelas características da região”, diz Rahmer.
A poucos quilômetros, no Maipo Entre Cordillera, as condições são totalmente distintas. O solo é composto por areia e pedra aluvial, e há uma oscilação térmica grande, com calor mais intenso. “O sol incide de forma tão forte que o ideal é o cultivo de uvas com peles mais grossas”, diz Rodrigo Bauzá, gerente-geral da Casa Bauzá, localizada na região. “O resultado são vinhos com grande perfil frutado, muito aromáticos.” Por lá é possível cultivar a popular Carmenere, que requer condições especiais para atingir o amadurecimento ideal e não vai tão bem em qualquer lugar.
Por fim, Maipo Andes, aos pés da Cordilheira, é uma região mais alta, com influência mais fria, especialmente à noite. Trata-se de um clima apropriado para a produção de vinhos mais elegantes e longevos. Pela proximidade com a cidade de Santiago, vinícolas como a Aquitania ainda resistem à pressão imobiliária. “Estamos rodeados de casas”, conta Eduardo de Solminihac, diretor comercial da Viña Aquitania. Os rótulos feitos com a uva cabernet sauvignon na região, como o Lazuli, um ícone que é produzido pela vinícola desde 2002, tem perfil herbáceo e mentolado e boa presença de fruta.
“Entender o terroir, o momento certo de colher e o que plantar, é fundamental para a produção de vinhos mais elegantes”, diz Hector Riquelme, eleito melhor sommelier do Chile em 2005 e coautor do Guia Descorchados por 11 anos. “Hoje, sabemos que dá para produzir rótulos com menos potência de fruta, ou musculosos, como se diz, que nem sempre envelhecem tão bem.” Se o consumidor tiver interesse em buscar algo além do “vinho chileno”, há muita diversidade a ser descoberta.