As joias produzidas nos vinhedos centenários da região de Toro, na Espanha
Trabalho da Bodega Numanthia é referência na elaboração de rótulos elegantes com a Tinta de Toro, como a Tempranillo é conhecida no local
Entre as principais denominações de origem do vinho espanhol, a região de Toro ocupa um lugar curioso. Não tem a fama de Rioja, por exemplo, ou da Ribeira Del Duero, ambas de enorme fama internacional obtida graças a condições climáticas ideais e ao trabalho meticuloso de algunas das maiores vinícolas do mundo. Mas têm uma rica e única história que, agora, vem sendo reconhecida.
Trata-se de uma sub-região de Castilla Y León, no centro-norte da Espanha. Foi lá que os primeiros vinhedos do país foram plantados, ainda na época dos romanos. Tem um clima desafiador. Não à toa, os produtores dizem que são nove meses de inverno e três meses de “inferno”. As temperaturas sobem muito na temporada quente, e podem cair para menos de 10°C no inverno. Nessas condições, as uvas lá plantadas, principalmente a variedade tinta Tinta de Toro, como a Tempranillo é conhecida, se aclimataram de forma muito particular.
Há ainda uma grande quantidade de vinhedos muito antigos, com cem, cento e cinquenta e até duzentos anos, que sobreviveram à filoxera, a praga que devastou as zonas vitivinícolas da Europa no século 19. Apesar do histórico, seus vinhos eram conhecidos pela rusticidade e pela potência, e não pega elegância. Essa situação vem mudando rapidamente.
E uma das maiores responsáveis por transformar a imagem dos vinhos de Toro na Espanha e no mundo é a Bodega Numanthia. A vinícola jovem, fundada em 1998, foi batizada com o nome de uma lendária cidade da região, ao norte de Madri, que sobreviveu por mais de 20 anos aos ataques das tropas romanas. Após duas décadas, o poderio militar superior dos conquistadores se mostrou imbatível, mas antes da derrota final a cidade inteira se suicidou como um gesto simbólico de recusa à dominação.
A vinícola foi comprada em 2008 pelo conglomerado de luxo LVMH (dono das Maisons de champagne Veuve Clicquot e Krug, do whisky Glenmorangie e de outras 21 marcas de luxo). A partir daí, começou uma transição focada na elaboração de vinhos mais frescos e elegantes, com menor passagem por barricas de carvalho. A chegada do atual diretor, Lucas Löwi, acelerou o processo.
Hoje, a Numanthia tem apenas três rótulos. Termes, a linha de entrada; Numanthia, vinho intermediário que mostra o potencial da região, e Termanthia, topo da linha, cujo nome é uma referência a outra cidade local que resistiu aos romanos.
As uvas que são usadas nos vinhos Numanthia são provenientes de 100 parcelas, sendo que os vinhedos mais jovens têm 55 anos e os mais antigos, 150. O rendimento dessas plantas está entre os menores do mundo, e Löwi afirma que a vinícola é a única a mesclar uvas dos oito diferentes terroirs de Toro. No caso de Termanthia, os vinhedos mais jovens têm 120 anos e os mais velhos, possivelmente mais de 200.
Outra estratégia adotada para transformar a imagem de vinhos rústicos é reduzir o tempo em barricas, mas deixá-los mais tempo descansando em garrafas antes de finalmente colocá-los no mercado. “Às vezes, eles só são lançados cinco, seis ou sete anos após a colheita”, conta o diretor da vinícola. “Mas quando chegam ao mercado, estão prontos para beber. Não são vinhos de colecionadores”.
O reconhecimento da crítica parece confirmar que a decisão faz sentido. A safra 2017 de Termanthia recebeu 100 pontos do crítico James Suckling, um dos maiores do mundo, e a safra 2015 foi eleita a melhor representação de Toro pelo Guia Espanha 2023 da revista Adega.