Até a metade do século XIX, homens usavam roupas coloridas, perucas, joias, saltos e maquiagem. Sob a influência do dândi inglês George Bryan “Beau” Brummell (1778-1840), eles passaram a adotar vestimentas mais simples e de cores neutras. Descrito como a personalidade mais elegante da Londres pré-vitoriana, com um estilo que priorizava a alfaiataria, ele fez história na moda ao se transformar na grande inspiração para os ternos. Desde então, de forma mais tímida do que a feminina, o jeito de vestir masculino transitou por diversas propostas: da rebeldia do jeans e jaqueta de couro de James Dean (1931-1955) nos anos 1950, passando pelo oversized da década de 80 e os metrossexuais dos anos 2000, o homem vem evoluindo em busca de um estilo próprio como forma de identidade e expressão. A novidade: em um mundo em que as fronteiras do discreto e do exagerado já não existem, em que vale quase tudo, o macho tão cioso de sua vaidade perdeu o medo da ousadia.
Um retrato desse momento foi visto nas últimas semanas durante a Semana de Moda Masculina de Milão, na Itália, e no tapete vermelho do Grammy, que aconteceu no domingo 5, nos Estados Unidos (leia mais sobre o prêmio na seção Gente). Nas passarelas despontaram transparências e laços de Yves Saint Laurent. Brotaram ternos desconstruídos da Fendi e camisetas cor-de-rosa da DSquared2. No principal prêmio da música, o cantor inglês Harry Styles fez jus ao papel de relevante representante dessa moda sem amarras ao chegar de macacão bordado com cristais Swarovski, apresentar-se coberto de brilho e depois, na hora de receber os três cobiçados troféus que ganhou, surgir com paletó curto cobrindo uma regata prateada e calça de alfaiataria. Não imagine que veremos as peças nas ruas, em mortais comuns. Não.
Contudo, o barulho foi imenso, associado ao glamour das passarelas e dos holofotes. Serviu como plataforma de comportamento — como uma senha a autorizar o risco, a aposta sem constrangimento. “O homem de hoje tem mais segurança com o que vai vestir”, diz o estilista Ricardo Almeida, referência em roupa masculina. “E o bom é que não existe só um modo de se vestir.” Exemplo desse movimento é a adoção das saias por eles, ou por alguns deles. A peça já foi e voltou nos looks masculinos, e parece enfim ter achado o seu lugar depois que Brad Pitt apareceu vestido com uma em 2022. De lá para cá, veem-se homens usando as peças, geralmente mais longas, em bairros descolados e novidadeiros das metrópoles. As transformações engordam um mercado que trabalha com 2 trilhões de dólares ao ano. É muita coisa, indício de que a coragem de vestir o que der na telha é quase um pedido de liberdade de estilo.
Publicado em VEJA de 15 de fevereiro de 2023, edição nº 2828