Não há avenida mais festiva, bonita e animada durante o carnaval. A Marquês de Sapucaí, que está completando 40 anos, já foi palco para homem voar, “mendigos” fazerem festa, presidentes sambarem aos olhos das arquibancadas, astros internacionais se divertirem em camarotes… Inaugurado em 1984, idealizado pelo vice-governador Darcy Ribeiro do governo Leonel Brizola, com projeto do arquiteto Oscar Niemeyer, o sambódromo também é complexo educacional ao longo do ano. Na pandemia, com inédita suspensão dos desfiles, serviu de posto de vacinação contra Covid-19. A seguir, a coluna selecionou quarenta momentos marcantes dessas quatro décadas de muito ziriguidum.
- Em 1984, primeiro ano dos desfiles na Sapucaí, a Mangueira se consagrou a primeira campeã na Marquês. O samba-enredo foi Yes, nós temos Braguinha e a escola surpreendeu com uma meia-volta na pista.
- A Mocidade Independente de Padre Miguel levou para avenida um enredo atemporal: Tupinicópolis, de Fernando Pinto. Em 1987, o mundo conheceu uma metrópole indígena futurista. Nos termos do artista, tratava-se de uma “ficção científica tupiniquim”.
- Em 1988, a Vila Isabel conquistou seu primeiro título, com Kizomba, para celebrar o centenário da Abolição da Escravatura. O samba é dos mais belos que já passaram por lá.
- No mesmo ano, 1988, a Mangueira levou o tema do centenário da Abolição em 100 anos de liberdade – realidade ou ilusão?.
- Enoli Lara fez história em 1989 como a primeira mulher a desfilar completamente nua na avenida da Marques de Sapucaí, pela União da Ilha, sem calcinha ou tapa-sexo. No ano seguinte, foram proibidas “genitálias desnudas”.
- A Beija-Flor de Nilópolis fez um desfile memorável em 1989. Idealizado por Joãosinho Trinta, Ratos e urubus, larguem minha fantasia contou com teatralização de mendigos e um carro do Cristo Redentor censurado pela Arquidiocese do Rio.
- A Mocidade Independente de Padre Miguel levou o bicampeonato em 1991 com Chuê Chuá As Águas Vão Rolar. O carro Planeta Água representava a união dos continentes pelos mares e um feto inserido no globo terrestre.
- Em 1992, a Viradouro apresentou E a Magia da Sorte Chegou, sobre a história do povo cigano. A escola era uma das favoritas, mas um dos carros alegóricos pegou fogo perto da dispersão.
- Também em 1992, a Estácio de Sá foi campeã com o enredo Paulicéia desvairada, 70 anos de modernismo no Brasil, que comemorou 70 anos da Semana de Arte Moderna. As arquibancadas enlouqueceram com o samba.
- Luciana Sargentelli, que desfilava pela Estácio em 1992, se exibiu descalça sobre o tripé O velho e o novo, e saiu da avenida com os pés ensanguentados. Substituída à frente da bateria pela modelo Monique Evans, ainda assim fez história.
- Em 1993, Salgueiro desfilou com o samba Peguei um ita no Norte, interpretado por Quinho do Salgueiro. Sua voz ficou marcada pelo famoso refrão “explode, coração, na maior felicidade” cantado por mais de 60 mil pessoas.
- A modelo Lilian Ramos foi destaque de um dos carros da Viradouro. Porém, o que marcou foi a foto sem calcinha ao lado do então presidente Itamar Franco, num camarote da Sapucaí. Era o carnaval de 1994.
- No mesmo ano, a Imperatriz Leopoldinense foi a primeira tricampeã da Sapucaí com o enredo Catarina de Médicis na Corte dos Tupinambôs e Tabajères. O desfile consagrou a carnavalesca Rosa Magalhães.
- Em 1996, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, foi homenageado pela Império Serrano no emocionante enredo E Verás Que Um Filho Teu Não Foge À Luta.
- A Viradouro surpreendeu a Sapucaí com “paradinha funk” na bateria em 1997. O abre-alas era inteiramente preto. A intenção do genial Joãosinho Trinta, que garantiu o título, era representar o nada no enredo Trevas! Luz! A Explosão do Universo.
- Rainha de bateria da Tradição, Luma de Oliveira apareceu no desfile de 1998 usando uma gargantilha com o nome de Eike Batista, seu marido na época. Deu o que falar. Ela, aliás, tem muitos momentos marcantes. Em 2001, na Viradouro, ao se ajoelhar em pleno desfile, junto com os ritmistas de Mestre Ciça, arrebatou o público.
- O coreógrafo Carlinhos de Jesus ousou reunir Noel Rosa, Pixinguinha, Cartola, Candeia, Tia Ciata e Clara Nunes em uma caracterização impressionante dos bailarinos, na comissão de frente da Mangueira em 1999. Fez história.
- No mesmo ano, atores da Intrépida Trupe vieram à frente da Mocidade, com fantasias de sapos-cururus. O enredo Villa-Lobos e a apoteose brasileira de Renato Lage ficou em quarto lugar.
- Em 2001, a Beija-Flor fez um lindo desfile com A saga de Agotime, Maria mineira Naê, sobre a rainha africana escravizada no Brasil.
- De novo ele: Joãosinho Trinta fez um homem-foguete sobrevoar a Marquês de Sapucaí em 2001. Era Eric Scott, 38 anos, dublê de efeitos especiais do Texas, que virou celebridade do desfile da Grande Rio.
- Devido a um atraso no desfile, a Portela fechou o portão antes da Velha Guarda e a ala de compositores entrarem na avenida em 2005. Uma cena lastimável.
- O maior ídolo do futebol da Argentina, Diego Maradona, esteve no Rio em 1998 e depois em 2006. No último ano, o jogador vestiu o uniforme dos garis da Comlurb e posou para fotos equilibrando copos de cerveja em um camarote.
- Paulo Barros colocou, pela primeira vez, os ritmistas da Viradouro em cima de um carro alegórico em 2007. Antes disso, em 2004, fez uma alegoria viva, com 124 pessoas em uma torre de ferro de 15 metros, no icônico Carro do DNA.
- Neguinho da Beija-Flor se casou no primeiro recuo da bateria, momentos antes de sua escola desfilar em 2009. O padrinho foi o então presidente Lula.
- Em 2010, Madonna estava acompanhada de amigos e de seu namorado na época, Jesus Luz. Marcou presença no camarote do então governador Sérgio Cabral, e chegou a conhecer Dilma Rousseff.
- A comissão de frente da Tijuca fez um truque de mágica que a fez ser campeã. Em 2010, o casal de coreógrafos Priscila Motta e Rodrigo Negri, em parceria com Paulo Barros, transformaram a Comissão de Frente com trocas de roupa em apenas alguns segundos.
- Com o enredo A Simplicidade de um Rei, a Beija-Flor fez uma homenagem a Roberto Carlos em 2011, e levou mais um título a Nilópolis.
- Em 2013, a Vila Isabel foi campeã com enredo A Vila canta o Brasil, celeiro do mundo – Água no feijão que chegou mais um, em que trouxe a vida do campo.
- Uma águia de 30 metros de altura, se curvando diante do público, chamada de “redentora”, encantou a todos no desfile da Portela de 2015. Paraquedistas pousaram em plena avenida para anunciar o enredo sobre os 450 anos do Rio, do carnavalesco Alexandre Louzada.
- A Mangueira vence o carnaval de 2016 com homenagem a Maria Bethânia. A escola já conquistara três títulos inspirada por Dorival Caymmi (1986), Carlos Drummond de Andrade (1987) e Chico Buarque (1988). Além de desfilar com a história de Chiquinha Gonzaga, em 1985; Braguinha, 1984; e Nelson Cavaquinho (2011).
- Durante os Jogos Olímpicos de 2016 no Rio, a Sapucaí sediou a competição de tiro com arco e a chegada da maratona. Para tanto, a passarela passou pela mais radical reforma, com a demolição de camarotes e mais espaço de arquibancadas.
- Em 2017, a comissão de frente da Mocidade surpreendeu o público no desfile sobre o Marrocos: um Aladim voador, na verdade um aeromodelo impressionante.
- Um momento dramático naquele mesmo ano, no Grupo de Acesso: a porta-bandeira da Unidos de Padre Miguel Jéssica Ferreira caiu, torceu o joelho e precisou deixar a Sapucaí carregada.
- Um ano pesado. Também em 2017, Unidos da Tijuca e Paraíso do Tuiuti tiveram acidentes com carros alegóricos. Mais de 30 pessoas ficaram feridas nos dois dias. Na Tijuca, a parte de cima do segundo carro afundou; no Tuiuti, vinte pessoas foram atropeladas e prensadas contra uma grade.
- Num desfile emocionante, Tuiuti recontou a história da escravidão no Brasil em 2018, nos 130 anos da Lei Áurea. A comissão de frente trouxe integrantes interpretando escravizados açoitados por um capataz. E no último carro, um vampiro com uma faixa presidencial em alusão a Michel Temer.
- Seguindo o tom político de 2018, a Mangueira transformou o ex-prefeito do Rio, Marcelo Crivella, em boneco de Judas no alto de uma alegoria. O carro trazia o recado: ‘Prefeito, pecado é não brincar o carnaval!’, protesto contra o corte de verbas. O carnavalesco Leandro Vieira, em 2019, homenageou a vereadora Marielle Franco, assassinada um ano antes, em Histórias para ninar gente grande.
- As chuvas torrenciais de 2018, durante desfile do Grupo de Acesso, prejudicaram as escolas menores. Uma consequência da falta de drenagem nos rios da Avenida Presidente Vargas. Culpa do prefeito Crivella, que nunca pisou na Sapucaí.
- No carnaval de 2021, silêncio na Avenida. Sem desfiles devido a pandemia, o Sambódromo ganhou iluminação especial em homenagem às vítimas da Covid-19 e se tornou ponto de vacinação drive-thru.
- A Grande Rio foi a grande campeã de 2022 com um desfile homenageando Exu, divindade das religiões de matriz africana que faz ponte entre humanos e orixás.
- Em 2023, a Sapucaí recebeu novo sistema de iluminação, que ainda causa polêmica. O sistema possibilita que holofotes acompanhem batidas da bateria e mudem de cor durante o desfile.