A bandeira que Luiza Brunet quer levantar no carnaval
Eterna rainha de bateria volta a desfilar pela Portela e será musa do camarote Allegria, defendendo o combate à violência contra a mulher
Aos 60 anos, Luiza Brunet está de volta à Sapucaí – após sete anos longe dos desfiles das escolas de samba. Depois de décadas como rainha de bateria da Portela e da Imperatriz Leopoldinense, onde construiu uma identidade associada à elegância, Luiza desfilará em homenagem ao centenário da azul e branca de Madureira, junto a outras ex-rainhas (Sheron Menezzes e Adriane Galisteu, entre elas). Além disso, foi intitulada musa do camarote Allegria – onde intensificará uma campanha contra violência feminina, sua bandeira o ano todo. Em conversa com a coluna, ela fala dos preparativos desse retorno à Avenida que a consagrou.
Como você recebeu o convite para voltar à Sapucaí? É uma loucura! A Portela está fazendo 100 anos, é icônico poder voltar. A Portela foi a primeira escola que desfilei como madrinha da bateria durante 11 anos, onde fui muito feliz. É uma escola que o Brasil abraça, não é só o portelense ou o carioca.
Como vem vestida? Só falei: ‘Não vou desfilar de fantasia, de biquíni, eu vou de burca’ (risos). E a diretora falou: ‘Está certo, pode vir como quiser’. É maravilhoso poder escolher, estou em uma nova fase da vida, passei quase 30 anos na avenida, experimentei todas as fantasias, até grávida! Além disso, tenho 60 anos né… Até poderia, se quisesse ter malhado muito, colocar o corpo de fora, mas a vida é feita de momentos. E nesse momento, vou me sentir mais confortável na imagem de uma Luiza Brunet elegante, discreta. Não caberia agora botar a bunda de fora, perna de fora, sair sacolejando.
É legal ver as ex-rainhas reunidas. Mas já existiu rivalidade entre vocês? Não, comigo não. Nunca tive filosofia de competitividade, ter a fantasia mais bonita, nada disso. Inclusive nunca entendi o motivo de sair da Portela, mas enfim, a (Adriane) Galisteu entrou no meu lugar e fui falar com ela na Avenida. No ano seguinte fui convidada pela Imperatriz, saí depois e entrou a Cris Vianna. E está tudo certo.
E agora como musa de camarote: uma nova função ou se equipara? Nem consigo imaginar isso, normalmente não fico muito tempo em camarote, só dou uma olhada. Gosto de assistir de casa, é mais tranquilo. Só que esse ano será diferente, animado.
Yasmin (Brunet) estreia no carnaval como musa da Grande Rio. Deu dicas para ela? Claro, falo para ter empatia, algo que ela já tem. No carnaval é fundamental ter empatia entre as pessoas, não só desse lugar que ocupa de musa. Carnaval é só um dia e o mundo continua, a vida continua. É para se divertir e ter responsabilidade. Escola de samba é responsabilidade.
Já deu aula de samba para ela? Não, ela está fazendo aula particular. Imagino que pode ser difícil para ela ter uma mãe que participou tanto do carnaval e ainda ser reconhecida como uma figura do meio. Ela demorou, inclusive por causa disso, a aceitar. Eu falei: ‘Vai ter comparação, como se escolhe a mesma profissão que a mãe. Mas você é única, eu sou única’.
Você vem de uma luta pelas mulheres. Carnaval ainda é muito machista? Sim, com certeza. No carnaval a mulher fica objetificada. Existe muita violência no carnaval, é sabido, lógico, inclusive vou fazer no camarote uma campanha contra isso. É quando existe um assédio maior.
Como lidar com o assédio no carnaval? Qualquer coisa que incomoda a mulher, tem que pegar o telefone e ligar para o 180, sem a menor dúvida.
Já aconteceu algo assim com você? Já, sofri assédio a vida inteira! Em algumas situações, a gente nem sabia que era assédio moral e sexual, como hoje é caracterizado. Eu vivia isso, mas achava o cara nojento, tarado. Violência de qualquer gênero é muito desagradável. Então a gente tem que mudar o comportamento, fazer denúncia… É louco, porque o feminicídio acontece assim também. Olha a situação do Daniel (Alves). Ele vai ser sempre o cara que foi no banheiro e incomodou a mulher, vai ter um crime nas costas. Como meu ex, por exemplo.
E como está sua ação judicial contra ele? Foi importante para mim ter lutado pelos direitos, tem mulheres brasileiras que têm medo de enfrentar a Justiça. Ela demora, muitas vezes é reconhecido que a mulher tem direito, mas justamente por termos um judiciário machista, ela acaba tendo problemas, demora mais. Meu processo foi para o STJ, em Brasília, houve decisão que voltasse para São Paulo, para que fossem revistos 17 pontos que não foram levados em consideração. Anulou-se então a decisão anterior, voltou à estaca zero.