Clayton Nascimento ainda a se habitua à fama repentina. Ao chegar para gravar Fuzuê, logo nas primeiras cenas, se depara nos corredores dos Estúdios Globo, com Renata Sorrah. Ela vem a seu encontro e lhe dá um abraço de boas-vindas. Paulistano de 34 anos, o ator virou um fenômeno nos palcos com a peça Macacos, na qual atua, dirige e escreve – e que se tornou um dos espetáculos mais elogiados da atual temporada teatral no país. O sucesso é tanto que os ingressos se esgotam em minutos assim que é anunciada nova temporada. Vencedor do Prêmio Shell de Teatro e do troféu da Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA) — ambos na categoria melhor ator, Clayton estreia em novelas com o eco dos aplausos que vieram dos palcos. Em Fuzuê, vive Caíto, que faz imitações (ou homenagens) a ícones da teledramaturgia nacional. Em conversa com a coluna, ele adianta alguns desses momentos de expectativa por boas risadas.
É sua primeira novela na Globo. Por que demorou tanto? Não sei, só sei que o coração anda mexido desde quando soube que fui aprovado. Foi na mesma semana que ganhei o Prêmio Shell (por melhor peça, em Macacos). Estou vindo de emoções muito grandes. Assim que entrei pra gravar nos estúdios Globo, encontrei Renata Sorrah, na última semana de Vai na Fé. Ela assistiu ao espetáculo Macacos e disse: ‘É o seu primeiro dia? Deixa eu te dar um abraço. Merda garoto, merda!’. Comecei com um grande axé. O meu personagem é um brinde para a criança Clayton, que cresceu vendo novela e agora tenho oportunidade de fazer um papel que homenageia personagens de novela.
Quais são suas referências para este papel? Amo quando estou lendo um roteiro e digo: ‘Conheço essa fala, deixa eu pesquisar de onde é’. E vejo a cena, a novela e começo a estudar a respiração das atrizes, o tempo que elas interpretaram. Porque tenho para mim que o Caíto vai homenagear muitos atores, atrizes e personagens, é interessante eu estudar exatamente como aquela atriz interpretou. Vou homenagear Ruth e Raquel, de Mulheres de Areia, feitas por Glória Pires. No começo fiquei um pouco nervoso.
E tem medo da comparação? Honestamente, não.
Está pronto para virar meme? Não sei muito sobre isso. Verdade (risos)!
Mas existe essa possibilidade, né? Com o humor das cenas. Sim, Caíto é um pouco trambiqueiro, com muito jargão. Ele vai costurando situações para poder fazer a vida dele. É especial ter sido um garoto que veio da periferia e que viu muita novela, e chegar na vida adulta fazendo um personagem que quer homenagear as novelas. Para além de tudo, é divertido.
Macacos te trouxe até aqui? Acho que Macacos me solidifica como ator. Mas a verdade é que chego aqui antes de Macacos explodir no Rio, por exemplo. Então chego pela minha caminhada e pelos meus estudos de Clayton Nascimento.
Você virou um fenômeno teatral? Tem noção disso? Isso foi uma surpresa tão bonita, porque pela primeira vez o Shell foi entregue no Rio. De repente eu estava aqui, na semana seguinte fui aprovado para novela e na outra Macacos estreou e buuuum… Esgotamos!
Em seu discurso, ao ganhar o prêmio, você exaltou sua jornada de lutas, mas também frisou a importância da diversidade. É uma luta ainda a vencer? Me emociona isso. Porque na história do teatro brasileiro foram raros os atores negros que fizeram monólogos, e que foram acolhidos pelo público, tiveram bilheteria esgotada e foram premiados. Então quero viver o hoje, a gratidão de ter feito uma temporada tão bonita, tão cheia, de estrear uma novela.
Já existe oura peça sendo elaborada? Ainda não estou pensando na próxima obra, mas tenho que pensar na leveza e na ousadia que o meu “eu” jovem criou Macacos. Porque foi sem grandes compromissos que ele fez essa obra que você diz ser um fenômeno. E é desse jeito, com leveza e alegria, que quero criar as minhas próximas.
Tem um movimento atual de cobrar pela diversidade na TV. Sente falta de mais negros nas novelas? Olha, é um movimento histórico, sempre em algum momento na história há um novo tipo de chamado. Agora a gente está num levante negro, sobre a importância da vida negra, para que os negros estejam no mercado de trabalho. A gente está em busca de representatividades. Adoro olhar pra TV e ver uma pessoa parecida comigo interpretando. Neste mesmo momento, as mulheres também falam sobre a importância de ganhar o mesmo salário que os homens.
Qual é o sentimento que fica? Fico feliz de me sentir uma pessoa jovem, neste momento da chamada histórica, da importância dos corpos pretos estarem em lugares que não são o do jardineiro, o encanador, a babá. São intérpretes que têm nome, sobrenome, personagens que sonham. Eu sou um deles.