O que levou Bolsonaro a demitir Pazuello
Com medo de Lula, presidente vai substituir general por outro ministro que diga 'sim, senhor'
O general de divisão do Exército Eduardo Pazuello será demitido sem honras do cargo de ministro da Saúde entre o horário que esta coluna está sendo escrita (14h da segunda-feira, 15/03) até o final da semana. Quando assumiu o ministério interinamente em 15 de maio, Pazuello enfrentava um drama de 14.8117 mortos e 218.223 casos registrados de Covid-19. Irá deixar o cargo com 278.229 óbitos e 11.483.370 casos, os dois piores indicadores do mundo, atrás apenas dos EUA. Na última semana, em nenhum lugar do mundo houve tanto registro de mortes por Covid-19 quanto no Brasil.
A vacinação está atrasada e, sob Pazuello, o Ministério da Saúde deixou de assinar encomendas com os laboratórios Pfizer, Johnson&Johnson e Sinovac, além de ter minimizado os pedidos à Covax, da Organização Mundial de Saúde. Sob Pazuello, o Ministério da Saúde apresentou 10 (repito, 10!) planos diferentes para distribuição de vacinas nos Estados e descumpriu todos.
A falta de coordenação obrigou os governos estaduais a tentarem comprar eles mesmos as vacinas, apenas para que só então o Ministério interviesse para impedir a encomenda. Por falha na logística do Ministério, os hospitais de Manaus ficaram sem oxigênio e dezenas de pacientes morreram sufocadas.
Pazuello foi cúmplice do negacionismo do presidente Jair Bolsonaro, que incentivou e ainda incentiva o boicote ao distanciamento social, defendeu charlatanices como cloroquina e outras drogas para um nefasto tratamento precoce, mentiu sobre os efeitos colaterais de máscaras e vacinas, desrespeitou as vítimas da Covid e seus familiares, assediou governadores com a Polícia Federal para impedir lockdowns e transformou a Covid numa disputa política mesquinha, sem se preocupar com os 2 mil mortos por dia que marcarão a história do país.
Por tudo isso, Pazuello se vai do Ministério não apenas como o pior de todos os ministros, mas como um oficial que manchou a imagem de sua corporação. O Exército pagará um preço alto por ter permitido que um general assumisse um cargo para o qual não tinha nenhuma qualificação.
Porém, Pazuello não está sendo demitido por nenhum desses motivos. Ele está caindo porque, pela primeira vez em dois anos, Bolsonaro está temendo perder as eleições de 2022. O retorno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à arena eleitoral tirou o chão do bolsonarismo. Por um grave erro de cálculo, o presidente supunha que podia fazer o que quisesse porque a rejeição a Lula e ao PT seria sempre maior que a desaprovação a seus atos. Não entendeu o luto das mortes por Covid e a raiva com a desorganização na vacinação, um dos poucos orgulhos nacionais que vinham desde o Regime Militar.
Ao descobrir que o antibolsonarismo é tão forte quanto o antipetismo, Bolsonaro piscou. Políticos e empresários que ele tomava como aliados eternos, deram sinais que poderiam pular para o navio lulista caso Bolsonaro não mudasse a gestão no combate à Covid. Este foi o erro, aliás, que tirou a reeleição do ídolo de Bolsonaro, Donald Trump.
É ilusão, no entanto, imaginar que Bolsonaro irá colocar no Ministério da Saúde alguém que vá tomar suas decisões com base de ciência. No domingo, ele se reuniu com a médica Ludhmila Hajjar, indicada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira. Na conversa, Bolsonaro descobriu que a médica defende vacinação em massa, descarta a cloroquina e defende interdições em cidades. Ou seja, está do lado da ciência e não pode ser ministra de Bolsonaro.
Ao descartar Hajjar, Bolsonaro indica que não quer deixar a ciência evitar o morticínio, apenas dar uma resposta política à ameaça da candidatura Lula. É uma jogada de marketing, para comprar tempo até os carregamentos de vacinas chegarem em maio. O presidente quer um ministro que diga “sim, senhor” às suas vontades e ajude a asfixiar os governadores rebeldes. Bolsonaro vai demitir Pazuello, mas quer outro Pazuello para o seu lugar.