O governo Lula tem 37 ministros, mas falta um: o do Vai dar Merda, a famosa sugestão de Chico Buarque de haver um assessor que dissesse ao presidente quando não fazer alguma coisa.
Lula é um comunicador nato, mas como fala muito, também erra muito. Ao atacar o presidente do BC na TV, Lula jogou com as armas de campanha política um debate da economia. Jair Bolsonaro fazia a mesma coisa, mas como ele mesmo se orgulhava da sua ignorância econômica, parte do que dizia era ignorado até que Paulo Guedes confirmasse. Com Lula, um presidente centralizador e autoconfiante, isso não existe. Tudo que ele fala, é levado ao pé da letra.
Lula ouve pouca gente e decide cada vez mais sozinho. O núcleo duro do governo tem os ministros Rui Costa, 60 anos, Fernando Haddad, com a mesma idade e Alexandre Padilha, 51, a deputada Gleisi Hoffmann, 57, e Jaques Wagner, de 71, e Janja Lula da Silva, com 57. Haddad e Padilha têm se esmerado em tentar atenuar as repercussões das falas de Lula, enquanto Hoffmann tem usado as declarações para engajar a militância petista.
Deste núcleo duro, apenas Wagner é da mesma geração de fundadores do PT que Lula. Os demais, como o próprio Lula disse uma vez, entraram no PT quando ele já havia perdido duas eleições presidenciais. Wagner intencionalmente quer distância do dia a dia do governo. Nos primeiros governos, pelo contrário, Lula estava acompanhado de outros fundadores do PT (José Dirceu, Luiz Gushiken, Luiz Dulci, Gil Carvalho, Olívio Dutra, etc.), que o conheciam muito antes de ele virar um mito.
Nos primeiros governos, Lula deixava a briga para os auxiliares. Dirceu criou a expressão “herança maldita” para se referir aos governos FHC, o vice José Alencar reclamava dos juros altos, o chanceler Celso Amorim batia de frente com a Casa Branca e Dilma Rousseff reclamava do ajuste fiscal. Isso permitiu a Lula permanecer acima das divergências e atuar como um árbitro. Esse esquema que deu certo nos primeiros governos foi abandonado. Agora Lula volta para recuperar a bola na defesa, faz o lançamento e chuta para o gol.
A falta de alguém que diga ‘não faça isso, vai dar merda’ é o maior defeito deste primeiro mês de governo.