O presidente do BC, Roberto Campos Neto, testou os limites da independência: a ata do Comitê de Política Econômica advertiu o Congresso de que a aprovação de uma das várias Propostas de Emenda à Constituição (PECs) reduzindo os impostos sobre combustíveis e energia terá como consequência mais juros. “O Comitê nota que mesmo políticas fiscais que tenham efeitos baixistas sobre a inflação no curto prazo podem causar deterioração nos prêmios de risco, aumento das expectativas de inflação e, consequentemente, um efeito altista na inflação prospectiva”, destacou o BC. Em português: se a PEC for aprovada, a possibilidade de novos aumentos de juros é certa como a morte.
A resposta do Palácio do Planalto e do Congresso foi ignorar o alerta do BC e trabalhar pela conquista rápida de simpatia dos eleitores. A proposta de corte de impostos preferida pelo presidente foi produzida por técnicos da Casa Civil por ordem do ministro Ciro Nogueira, e vai custar estimados R$ 54 bilhões. Assinada pelo deputado Christino Áureo (PP-RJ), o texto permite que a União Estados e municípios reduzam impostos sobre a produção e venda de combustíveis sem contrapartida, driblando a Lei de Responsabilidade Fiscal. Como o clim ano Congresso é pela aprovação, o projeto vai permitir que Bolsonaro corte a cobrança de IPI, IOF, PIS?Pasep/Cofins sobre gasolina, diesel e etanol e pressionar os governadores a retirarem a cobrança de ICMS.
É muito barulho por um resultado duvidoso. De acordo com pesquisa da Petrobras quanto o preço médio do litro de gasolina estava em R$6,63, o zeramento dos impostos federai significaria uma redução de R$0,69. Só que o preço depende do mercado internacional, pressionado pelas tensões entre Rússia e Ucrânia. Mas Bolsonaro ganha o seu discurso, os deputados podem ir aos eleitores dizer que tentaram reduzir o preço da gasolina e o contribuinte paga o custo.
O descaso do Planalto e do Congresso pelas opiniões do BC traz algumas lições sobre até onde a autoridade monetária poderá interferir em um eventual futuro governo do PT. “O Copom reitera que o processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para o crescimento sustentável da economia. Esmorecimento no esforço de reformas estruturais e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia”, escreveu o colegiado do BC. Ninguém no Congresso leu. Se leu, não deu a mínima.
A decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira, do Senado, Rodrigo Pacheco, e da República, Jair Bolsonaro, de darem de ombros para os alertas do Banco Central não sai de graça. Se Bolsonaro perder as eleições e um eventual governo Lula também resolver ignorar o quie diz o BC, o exemplo foi dado agora.