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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)

Dias que valem por anos

Condução do pacote de Haddad no Congresso pode definir próximos 2 anos do governo Lula

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 dez 2024, 11h06 - Publicado em 9 dez 2024, 11h03

As próximas duas semanas serão decisivas para os próximos dois anos do presidente Lula da Silva. Um erro de cálculo pode empurrar o dólar para R$ 6,5 e o governo Lula para uma crise financeira que pode desandar toda a economia. Uma sucessão de vitórias pode segurar a onda de pessimismo do mercado financeiro e dar uma trégua de mais alguns meses ao governo.

Este é o roteiro de fatos que começa a contar a história da segunda metade do mandato Lula 3:

•⁠ Saem as primeiras pesquisas Genial/Quaest e Datafolha sobre o efeito do anúncio da isenção do imposto de renda até R$ 5 mil e das mudanças no cálculo do salário mínimo. Um aumento de popularidade de Lula dará ao presidente a certeza de que fez o certo ao juntar as duas propostas, apesar do custo no câmbio e nos juros;

•⁠ O Congresso começa a votar nesta terça-feira os projetos de redução do crescimento de gastos. Só quem acredita em boitatás acha que este Congresso vai apertar os parafusos do pacote. Ao contrário, deputados e senadores devem diminuir a economia proposta pelo ministro Haddad com (1) manutenção do governo do Distrito Federal; (2) controle dos salários acima do teto do funcionalismo, atingindo principalmente os juízes; (3) a possibilidade de concessão de incentivos fiscais para empresas quando houver déficit nas contas do governo. Empresas beneficiadas pelos incentivos articulam a derrubada da ideia; e (4) os critérios mais rígidos para calcular a renda das famílias candidatas ao BPC e incluir novos beneficiários através de liminares judiciais sem terem passado por exames. Estima-se que as duas exigências poderiam cortar até 1 milhão dos 5,5 milhões de cadastrados no BPC. No fim de semana, em estado de negacionismo econômico, o PT decidiu que é contra essa medida.

•⁠ Paralelamente, o Congresso vota o Orçamento de 2025. A preços de hoje, é provável que o Congresso derrube as propostas de aumento das alíquotas de CSLL e JCP, gerando um buraco de R$ 20 bilhões para compensar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento das empresas. Se isso acontecer, o Ministério da Fazenda terá de encontrar alguma outra fonte de recursos, provavelmente uma nova taxa.

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•⁠ ⁠A Câmara dos Deputados pode aprovar ainda em dezembro o bizarro projeto de renegociação de dívida dos Estados, que dá vantagens a maus pagadores como os governos de Minas, Rio de Janeiro e Goiás. A União pode perder mais de R$ 40 bilhões por ano com o projeto;

•⁠ ⁠A extensão das derrotas do governo vai depender de o presidente Lula convencer o ministro Flávio Dino, do STF, a recuar da sua missão de não liberar a roubalheira nas emendas parlamentares. Por unanimidade, o STF bancou a decisão moralizadora de Dino. Por quase unanimidade, o Congresso quer manter o clima de tavolagem com dinheiro público;

•⁠ A troca de guarda entre Roberto Campos Neto e Gabriel Galípolo na reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) na terça e quarta-feira ocorre sob um cerco. O Banco Central deve aumentar a dose de juros e anunciar um ciclo longo de alta na Selic para tentar reancorar as expectativas do mercado financeiro e recolocar o câmbio abaixo dos R$ 6. Com a política fiscal do governo desacreditada, só restou a âncora monetária.

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Corre no mercado financeiro um debate bizantino se o Copom vai subir os juros em 0,75 ponto porcentual ou 1 ponto. A questão é se é melhor dar um choque de credibilidade agora ou indicar uma política gradual de médio prazo.⁠ Por qualquer caminho, o Brasil vai chegar em junho com uma Selic entre 13% e 14%, com efeitos diretos no crescimento econômico, investimentos das empresas.

O câmbio procura um novo patamar. Quando o presidente Lula encomendou à equipe econômica um ajuste no crescimento das despesas, o dólar estava abaixo de R$5,5. No fim de outubro, quando Lula organizou a primeira reunião ministerial sobre o tema, a cotação já estava pouco acima de R$ 5,7. Depois do anúncio do pacote, subiu para mais de R$ 6 e ainda não desceu.

É natural que a cotação caia na última semana de dezembro em função de milhares de contratos que se encerram sempre no fim do ano. Mas depois a moeda vai variar num novo patamar. Quando lançou o pacote, o pior cenário da equipe econômica supunha que esse patamar seria de R$5,9. Agora, esse esquema parece otimista.

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Do pacote fiscal, o governo ainda precisa enviar os projetos de revisão da aposentadoria dos militares, da ampliação da isenção do Imposto de Renda para R$ 5.000 e da taxação da renda a partir de R$ 50 mil. Há a possibilidade de uma cobrança de 7,5% na distribuição de dividendos. Fiscalistas nas contas públicas, muitos dos operadores estão preocupados se terão de pagar mais imposto a partir de 2026.

É difícil achar alguém no governo Lula fora da equipe econômica que compreenda o tamanho dos riscos. Os últimos dias foram de negação. “O País está crescendo para a economia real, não para os especuladores. Porque o que eles estão fazendo é antecipar as eleições de 2026, trazendo para o presente uma tentativa de desestabilizar o governo”, discursou Rui Costa, num seminário do PT. Comentando a enquete da Genial/Quaest com operadores do mercado financeiro mostrando que 90% desaprovam Lula, Simone Tebet disse: “isso não é imparcialidade. É jogar contra o país. E quem joga contra o país quer ajudar a afundar o país”. O Diretório Nacional do PT aprovou um documento que contém uma ameaça ao ministro Haddad: “Não será possível uma solução que agrade ao mercado e a nossa base”.

Pragmático, o Congresso sentiu o sangue na água e exigiu que o governo Lula destrave R$ 7,8 bilhões em emendas suspensas pelo STF. Na quarta-feira, dia 4, a Câmara dos Deputados aprovou a urgência dos dois projetos do pacote fiscal por margem mínima. A urgência para o primeiro projeto foi aprovada com 260 votos a favor, apenas 3 acima do mínimo necessário. Para o segundo — que não exigia mínimo de votos, a não ser a maioria simples — o governo conseguiu 267 votos. Além desses dois projetos, o governo Lula enviou ao Congresso uma PEC, que precisa de 308 votos para ser aprovada. A mensagem dos congressistas é simples: sem o dinheiro das emendas, nada vai andar. A questão é para onde vai essa andança.

Se o pacote Haddad for desidratado demais, o dólar explode e o país corre o risco de entrar numa espiral financeira ruim que vai jogar a economia de 2025 no buraco. O governo Lula e o Congresso não podem errar.

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