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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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A herança de um país em frangalhos

Com Bolsonaro explodindo o teto de gastos para financiar seus programas eleitorais, 2023 será um ano mais difícil

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 28 set 2021, 17h40
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  • Só existe uma coisa pior para os candidatos a presidente do que perder a eleição do ano que vem. Ganhar a eleição do ano que vem. Mantidas as atuais condições de temperatura e pressão, depois de uma eleição sangrenta, quem assumir em janeiro de 2023 herdará um país quebrado economicamente e rachado politicamente.

    “Seja lá quem ganhe em 2022 vai pegar o Brasil em frangalhos. Não tem salvador da pátria”, disse um dos maiores acionistas do Itaú-Unibanco, Alfredo Setúbal, aos repórteres Rennan Setti e Mariana Barbosa, do jornal O Globo. “Sem reformas, com o setor privado mais cauteloso em ano eleitoral, já tem gente falando em 0,5% de crescimento em 2022. Isso é zero. Se não fizermos nada, vai continuar essa porcaria que vimos nos últimos 40 anos, com crescimento potencial de 1,5%, 2%. A gente vai crescer muito menos que o mundo e ficar para trás…”

    Se o crescimento do ano que vem depende de reformas, esqueça. Não serão aprovadas reformas porque Bolsonaro desperdiçou o seu capital político em conflitos com deus-e-o-mundo. Ao contrário, Bolsonaro é quem vai colocar fogo no circo para tentar se reeleger a qualquer custo _ mesmo que seja quebrar o país.

    Perdendo em todos os cenários para Luiz Inácio Lula da Silva, Bolsonaro vai estourar o teto de gastos para conseguir colocar de pé o substituto do Bolsa Família, o programa de microcrédito da Caixa Econômica Federal de empréstimos de até R$1 mil, o subsídio para construção de apartamentos para policiais militares e a redução de impostos no diesel para beneficiar caminhoneiros.

    Para bancar o clientelismo federal, o governo precisa antes resolver um obstáculo chamado parcelamento das dívidas judiciais. Por inoperância do Ministério da Fazenda, a União foi condenada a pagar R$ 89 bilhões em precatórios no ano que vem, cortando a folga fiscal para mais gastos públicos, incluindo as emendas parlamentares. Por isso, desta vez, o ministro Paulo Guedes tem o apoio do Congresso para uma manobra que limite o pagamento dos precatórios em R$ 40 bilhões, empurrando o que sobrar para 2023. Com a folga, haveria espaço do orçamento para o governo Bolsonaro jogar a máquina para a sua reeleição. Vamos por partes.

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    A prioridade do governo é lançar ainda neste ano o Auxílio Brasil, o nome bolsonarista do antigo Bolsa Família. O valor da mensalidade atual varia de R$ 190 a R$ 250 por família. Com a troca de nome, o benefício deve ser reajustado para uma faixa entre R$ 250 e R$ 320, dependendo das projeções. O número de beneficiários deve subir dos atuais 14,6 milhões para 18,6 milhões de famílias (o que, segundo o Ministério do Desenvolvimento Social, daria entre 35 e 38 milhões de pessoas).

    A questão é que os dividendos eleitorais do Bolsa Família bolsonaristas são duvidosos. Um ano atrás, em outubro de 2020, o governo Bolsonaro chegou ter a mais de 50% de aprovação pagando R$ 600 reais de Auxílio Emergencial a 67 milhões de pessoas (incluindo quem recebia Bolsa Família).

    Em janeiro, o governo estupidamente encerrou o programa, e a popularidade de Bolsonaro começou a cair. Em abril, o Auxílio Emergencial foi retomado com parcelas de R0 para 40 milhões de beneficiários _ 20 milhões de pessoas a menos que em 2020. Por vários motivos (aumento no número de mortes por Covid, inflação, volta de Lula na disputa), o efeito deste segundo Auxílio Emergencial na popularidade do presidente foi marginal.

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    É contraintuitivo supor que manter o valor de R$ 300 nas parcelas e reduzir o número de beneficiários irá provocar algum salto nas intenções de Bolsonaro. Portanto, é ingenuidade supor que o novo Auxílio Brasil será a bala de prata para Bolsonaro vencer Lula. Vai precisar gastar mais que isso.

    Por isso, os ministros políticos querem jogar o valor do benefício para cima. Na presidência da Câmara, se fala em R$ 400 de parcelas. Na Casa Civil, em R$ 600. Perguntados sobre o qual seria a reação de Paulo Guedes a um valor tão acima do planejado pela economia, as respostas foram um “tanto faz”.

    Tão relevante quanto o novo Bolsa Família é a garantia dos R$ 30 bilhões de emendas parlamentares, a garantia de reeleição de centenas de deputados. O chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, quer usar as emendas para fidelizar os deputados a fazerem campanha por Bolsonaro. Ele sabe do que está falando. Em 2018, o Centrão em peso anunciou apoio ao candidato Geraldo Alckmin, do PSDB. Com Alckmin estacionado nas pesquisas, ele foi abandonado e, em muitos casos, trocado por Bolsonaro. Agora com a máquina na mão, o presidente precisa garantir que os deputados trabalhem para ele mesmo com o favoritismo de Lula. Uns poucos candidatos farão isso por ideologia, outros por disputas por regionais, mas a maioria só trabalha se tiver dinheiro.

    É fato que todo governo em tempos de reeleição abre as torneiras das despesas, distribui bondades para suas bases eleitorais e tentam convencer seus eleitores que o céu é o limite. FHC, em 1998, e Dilma Rousseff, em 2014, adiaram decisões amargas para depois de suas reeleições, com custos políticos enormes. Maurício Macri, na Argentina de 2019, abandonou o figurino liberal para fazer congelamento de preços e mesmo assim perdeu. Bolsonaro vai fazer de tudo um pouco. Azar de quem vier depois.

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