Em 2021, o gestor de projetos Ronald Gladden, 30 anos, foi atraído por um anúncio on-line que buscava alguém disposto a integrar o júri de um caso da Justiça americana e participar de um documentário. Curioso, ele se interessou pela experiência e pelo contato com as câmeras. Não esperava, porém, embarcar numa farsa surpreendente composta de cenários, câmeras escondidas e atores contratados — de faces desconhecidas ao astro James Marsden, de X-Men. Indicada a quatro Emmys, a série Na Mira do Júri, ou Jury Duty, disponível no Brasil pelo Amazon Prime Video, foi criada por roteiristas de sucessos como The Office e Que Horas Eu Te Pego?, e compartilha com essas comédias o mesmo misto de cinismo e leveza, evitando a sátira pessimista na busca pela comprovação de sua tese — a de que, a despeito da burocracia excruciante dos tribunais e do egoísmo contemporâneo, sim, existem heróis por aí.
A History of Crime and the American Criminal Justice System
Como numa pegadinha, Gladden é o único participante desavisado na disputa falsa entre uma empresária e um funcionário presumidamente embriagado. Todos estão ali fingindo com realismo notável — até Marsden, que interpreta uma versão exagerada e arrogante de si. Dada a presença da celebridade, o júri tem seus celulares confiscados e é isolado num hotel, medida judicial reservada a casos de alta notoriedade. Assim, passam a viver sob condições ideais para que Gladden não se dê conta de que está participando de um documentário fake.
A série não revela até o último episódio os bastidores do processo de gravação tão peculiar. Mas seu objeto de estudo fica cristalino desde o primeiro instante: o programa expõe as miudezas da Justiça americana, um modelo bem-sucedido, mas que muitas vezes se enrosca em causas mesquinhas decididas por júris selecionados de forma compulsória e compostos de gente desinteressada. Sem facilitar a experiência para Gladden, os produtores lhe reservam toda sorte de imprevisto para testar seu caráter e sua fé no sistema judicial, dos surtos egocêntricos de Marsden a depoimentos constrangedores no tribunal, onde se revezam influenciadoras superficiais e advogados incompetentes.
Mesmo assim, o crédulo Gladden não deixa de estender a mão aos colegas, incentivando o grupo a uma decisão ética e séria. O roteiro e os improvisos amplificam a comédia e asseguram que a narrativa corra como esperado. Mas é o caráter do protagonista acidental que faz a produção comover. Seu carisma é tão impressionante que Gladden já arranjou um agente e estrelou um comercial com Ryan Reynolds. Merecidamente: ao menos para esse bom jurado, a Justiça foi feita.
Publicado em VEJA de 22 de setembro de 2023, edição nº 2860
*A Editora Abril tem uma parceria com a Amazon, em que recebe uma porcentagem das vendas feitas por meio de seus sites. Isso não altera, de forma alguma, a avaliação realizada pela VEJA sobre os produtos ou serviços em questão, os quais os preços e estoque referem-se ao momento da publicação deste conteúdo.