Trajando um vestido rosa choque e uma máscara cravejada de brilhantes, Paris Hilton arrasta as pontas de seu enorme laço nas costas pelos corredores de um supermercado americano. Um pop oitentista embala o desfile da socialite, que tem seus longos cabelos loiros esvoaçando ao “vento” de um espaço fechado. No segundo seguinte, a câmera se afasta, a música para e todo o cenário é revelado: uma equipe de filmagem cerca Paris, com um microfone pairando acima de seu penteado e uma técnica a abana com um tablado preto. Ela, então, aborda um funcionário para perguntar como uma cebolinha se parece e para quê serve, pronuncia errado a palavra “brioche” e continua a arrastar a cauda do vestido pelos corredores sujos. Os primeiros minutos de Cozinhando com Paris, novo reality da Netflix, prometem algumas boas risadas do espectador – afinal, ver super-ricos fora da zona de conforto é, quase sempre, um bom passatempo. Não aqui: a expectativa cai por terra assim que a socialite começa a “cozinhar” (se é que derreter marshmallows e enchê-los de glitter azul comestível se enquadra como tal).
A premissa do novo programa da herdeira dos hotéis Hilton tenta seguir uma receita que já se provou bem sucedida, com celebridades pilotando a cozinha, a exemplo de Selena + Chef, reality da HBO Max que acompanha a cantora Selena Gomez ao lado de chefs renomados, ou até o nacional Tempero de Família, com o modelo Rodrigo Hilbert, atormentando os machões daqui por elevar os padrões a um patamar alto demais. A diferença é que Paris Hilton, como já se conhece há tempos, mantém uma postura distante que não conquista nem pelo charme da opulência – muito pelo contrário, o desinteresse dela, vindo de uma expressão lânguida e voz arrastada, aborrece o espectador. Os 25 minutos de programa só não são totalmente excruciantes porque a socialite convida celebridades tão cintilantes quanto ela para ajudar na cozinha (ou salvá-la do fracasso completo). Ao lado de Paris Hilton, até a rainha das dondocas Kim Kardashian parece uma pessoa acessível, enquanto conta como gosta de preparar pizzas e cafés da manhã preguiçosos com os filhos pequenos.
Acontece que, ao apostar no novo “filão” do entretenimento, que mergulha na vida dos super-ricos com ares de comicidade, o reality-show nos faz rir de nervoso. Em certo ponto, Paris não sabe (ou finge não saber) o que é um pegador de cozinha ou como operar um simples liquidificador. Ela redecorou todos os cômodos de sua mansão em Los Angeles na pandemia, deu aventais da grife Chanel para os cachorros, tem espátulas com diamantes e decoração extravagante e individualizada para cada convidado. A ostentação, aqui, pura e simples, não gera inveja alguma, mas dúzias e dúzias de pontos de interrogação.
A graça (se é que há alguma) é rir do absurdo. Neste ponto, a TV americana costuma ir bem, caso da série de sucesso Gossip Girl, que ficcionaliza a já surreal vida dos ricaços de Nova York, e do documentário Fyre Festival, também da Netflix, que mostra como um festival de música anunciado como “alto padrão” era, na verdade, um completo desastre. O próprio Keeping Up With The Kardashians, reality-show de vinte temporadas sobre os problemas de primeiro mundo da família Kardashian, é prato cheio para um entretenimento do tipo guilty-pleasure: poucas coisas são tão risíveis quanto a cena em que Kim perde um brinco de 75.000 dólares no oceano e surta, ao que a irmã Kourtney sai de uma cabana chique para dizer, impassível, “Kim, tem pessoas morrendo”.
No frigir dos ovos, Cozinhando com Paris é um reality-show sem tempero, em que a apresentadora tenta repetir a surrada fórmula exibicionista enquanto ela mesma reproduz um personagem já, também, deveras batido: o da loira superficial, rica e bonita, que só se importa consigo mesma e com festas de arromba madrugada a dentro. A socialite já provou ter muitas outras camadas – o documentário This is Paris que o diga – mas, aqui, ela soa tão enjoativa quanto um marshmallow com corante e glitter azuis.