Relâmpago: Revista em casa por 8,98/semana
Imagem Blog

Tela Plana

Por Kelly Miyashiro Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Críticas e análises sobre o universo da televisão e das plataformas de streaming

Bruno Barreto lança série sobre a escravidão atual: ‘Cruel e invisível’

A VEJA, diretor de 'Escravidão no Século XXI', da HBO, fala sobre a produção que investiga o trabalho exploratório no Brasil

Por Tamara Nassif 3 Maio 2021, 10h41

No próximo 13 de maio, é celebrado o 133º aniversário da Lei Áurea, decreto outorgado pela Princesa Isabel que aboliu, de vez, a escravatura em todo território nacional – ou ao menos era isso que deveria ter acontecido. Nova aposta da HBO, a série documental Escravidão no Século XXI chega ao canal nesta terça-feira, 4, às 21h, e examina a situação do trabalho análogo à escravidão no Brasil contemporâneo com participações de autoridades, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em cada um dos cinco episódios, a produção se debruça sobre as condições que caracterizam o regime de exploração, quer seja pela forma com que ele se perpetua no país, quer seja pelas diversas facetas que pode assumir.

A VEJA, o diretor Bruno Barreto (Dona Flor e Seus Dois Maridos e O Que É Isso, Companheiro?) conta sobre o processo de produção e o tipo de conscientização que a série documental busca gerar. Confira a entrevista abaixo:

Por que a decisão de fazer uma série documental sobre a escravidão contemporânea? Eu li um livro do Ricardo Rezende há exatamente cinco anos, o Pisando Fora da Própria Sombra: A Escravidão por Dívida no Brasil Contemporâneo (Editora Civilização Brasileira). É como se fosse o caso zero do trabalho escravo no século XXI, em que o explorado, o Zé Pereira, foge da fazenda em que era escravizado com outros dois companheiros. Quando os capatazes vão atrás deles, os outros dois morrem e ele se finge de morto. Os corpos são então jogados na fazenda Brasil Verde, condenada na ONU em 2017, e o Zé se salva. É uma história incrível que renderia uma trama com muitas viradas, mas decidimos fazer uma série documental, porque a escravidão contemporânea é um fenômeno mundial. Tem no Brasil e tem em outros segmentos, por exemplo o sexo e a escravidão, com cafetões no Rio de Janeiro, e a globalização, com bolivianas na indústria da moda em São Paulo. Então dividimos em episódios. A história do Zé Pereira é a do segundo.

Já conheciam essa realidade? Se surpreenderam com alguma coisa que viram? Conhecia pelo livro, mas é completamente diferente viajar do norte do Piauí ao sul do Rio Grande do Sul. Nós visitamos os quatro cantos do Brasil, e o que me interessa nessas histórias é a condição humana. Não queria fazer uma série didática sobre a escravidão contemporânea, mas que a causa chegasse no telespectador através da emoção. Me interessa o lado dramatúrgico da realidade.

Desde o ano passado, o movimento do Black Live Matter acendeu a pauta racial em produções cinematográficas. Como a série documental se encaixa nesse cenário? Não entramos nesse assunto, porque escravidão contemporânea não acontece só com negros. Nós fizemos o contraponto entre a do século XIX e a atual em um episódio, quando visitamos um quilombo no sul do Piauí, e em muitos sentidos a atual é até mais cruel que a tradicional. Lá, os escravizados eram comercializados, então, bem ou mal, deveriam ser tratados com certo cuidado pelos senhores de engenho. Hoje não. Hoje os escravizados são completamente descartáveis, e o pior: mesmo quando são libertados, reincidem por não existir outra alternativa. Eles preferem a exploração à miséria, porque pelo menos têm onde dormir e o que comer. A escravidão atual é muito mais cruel e muito mais invisível.

Continua após a publicidade

Ir para Escravidão no Século XXI depois de Dona Flor e Seus Dois Maridos e O Que É Isso, Companheiro? é uma mudança grande. Que tipo de cuidado teve de tomar nessa produção?
Minha maior preocupação foi emocionar sem manipular. É uma linha muito tênue, e é muito mais fácil construir uma ficção, porque o documentário esconde o fato de ser um recorte da realidade. Eu penso que produções documentais são travestis, ou seja, pretendem ser a realidade, mas nunca são, porque o próprio processo de gravação e edição molda a informação. Eu acho até que a ficção é muito mais honesta que o documentário. Mas eu procuro sempre fulanizar, até porque todas as histórias que eu ouvi parecem coisa de ficção. O que me interessa é o ser humano.

A escravidão contemporânea é uma tragédia anunciada há bastante tempo e não é incomum vermos denúncias desse tipo de exploração. Que tipo de conscientização a série quer gerar? Nossa série quer confrontar a sociedade, que sabe que o trabalho escravo existe, mas não age para que acabe. Como diz o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na série, a escravidão é uma consequência, o problema é a desigualdade social. Por mais que se reprima o trabalho escravo, o explorado reincide por não ter outra opção. E não é à toa que exista no mundo inteiro. O Brasil é uma referência no combate ao trabalho escravo, foi pioneiro, mas acontece na China, nos Estados Unidos. É essa a conscientização: o trabalho escravo só existe porque a miséria existe.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 9,90/mês*
OFERTA RELÂMPAGO

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada edição sai por menos de R$ 9)
A partir de 35,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a R$ 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.