Responder a pergunta ou responder à pergunta?
“A dúvida ocorreu em meu trabalho, quando escrevia: ‘…você ganha o cupom e responde a pergunta… “. Escrevi assim, sem crase no ‘a’, pois achei que nessa situação o verbo responder fosse transitivo direto: responder o quê? Fui corrigido, e o ‘a’, craseado. Mas, insistente que sou, consultei duas professoras de português: uma confirmou a […]
“A dúvida ocorreu em meu trabalho, quando escrevia: ‘…você ganha o cupom e responde a pergunta… “. Escrevi assim, sem crase no ‘a’, pois achei que nessa situação o verbo responder fosse transitivo direto: responder o quê? Fui corrigido, e o ‘a’, craseado. Mas, insistente que sou, consultei duas professoras de português: uma confirmou a minha idéia inicial, a outra disse que a crase era sim necessária. Aí, fiquei sem saber mais nada.” (Luis Godinho)
Para simplificar um caso que não é tão simples, como veremos daqui a alguns parágrafos, diga-se logo que quem desejar seguir o padrão culto da língua deve, sim, tratar “responder” como um verbo transitivo indireto na frase citada por Godinho: responde-se à pergunta (ou a quem faz a pergunta).
Claro que também se intui o transitivo direto na mesma frase, como Godinho percebeu: responder o quê? Isso ou aquilo, que sim ou que não, mas sempre à pergunta. A confusão vem do fato de “responder” ser neste caso um verbo transitivo direto e indireto: “Estou respondendo ao leitor (transitivo indireto) que a crase é necessária (transitivo direto)”.
(Note-se que responder pode ser intransitivo também, como na seguinte frase: “Chamei, mas ninguém respondeu”. Mas isto não vem ao caso no momento.)
Até aqui estamos falando do uso clássico, com o qual qualquer falante estará a salvo da sanha corretora de chefes e professores. Porém…
Dito isso, é preciso deixar registrada a instabilidade sintática que torna frequente o emprego de “responder” como transitivo direto em construções parecidas com a de Godinho. Ao contrário do que pode parecer, tal instabilidade não é sequer um fenômeno restrito à língua informal. O conservador “Dicionário de Verbos e Regimes” de Francisco Fernandes declara sua predileção pela regência clássica, mas informa que o respeitável gramático Carlos Góis (1881-1934) considerava opcional escrever “responder a carta” ou “responder à carta”.
A posição de Góis era uma dissidência no mundo da gramática tradicional, mas parece indicar que o verbo está caminhando para um lugar já ocupado há tempos por “atender”, que pode ser transitivo direto ou indireto segundo o gosto do freguês: “atender ao chamado” ou “atender o chamado” são formas igualmente aceitas. Quando se diz que “a pergunta foi respondida”, uma frase de uso corrente, a voz passiva deixa clara a interpretação do verbo como transitivo direto.
Acho que isso explica o cisma entre as duas professoras de português consultadas por Godinho.
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