Como o torpedo saiu do oceano para explodir no celular
A palavra torpedo tem grande atualidade como sinônimo informal de mensagem de texto, em geral no formato SMS (Short Message Service). Tem também uma história antiga e fascinante que é um tributo ao poder da metáfora como criadora de sentidos inteiramente novos a partir de velhas ideias. Vamos pela ordem. Em sua primeira encarnação, torpedo […]

A palavra torpedo tem grande atualidade como sinônimo informal de mensagem de texto, em geral no formato SMS (Short Message Service). Tem também uma história antiga e fascinante que é um tributo ao poder da metáfora como criadora de sentidos inteiramente novos a partir de velhas ideias.
Vamos pela ordem. Em sua primeira encarnação, torpedo era uma palavra do latim clássico que queria dizer “torpor, entorpecimento” – vocábulos que, como se vê, conservam bem à mostra seu radical. Foi no próprio latim que se deu a primeira expansão no sentido da palavra: por causa da sensação de dormência provocada em quem era atingido por sua descarga, torpedo passou a nomear genericamente as raias-elétricas (como a da foto), ainda hoje chamadas cientificamente de torpedinídeos. Até aí a lógica da expansão era a da metonímia, a de se tomar uma parte – o efeito provocado por seu ataque – para nomear o todo, isto é, o dito animal. Mas daquele ponto em diante todas as demais evoluções semânticas de torpedo seriam metafóricas.
A segunda expansão teve que esperar muitas centenas de anos. Foi no início do século 18 que o inventor americano Robert Fulton imaginou uma nova e traiçoeira arma de guerra naval: explosivos armazenados numa estrutura flutuante, detonados pelo contato com o casco das embarcações inimigas. Por ver na geringonça semelhança visual e talvez até funcional com uma raia elétrica – que desde o século 16, por influência do latim, era chamada em inglês de torpedo – foi este o nome com que Fulton batizou a novidade. Pegou.
Pegou tanto que o aprimoramento feito pelo engenheiro britânico Robert Whitehead, criador do torpedo moderno, foi chamado inicialmente de self-propelled torpedo – em português, “torpedo automóvel”, nome hoje em desuso – para se diferenciar de seu tosco precursor. Hoje, os sofisticados torpedos de última geração já não precisam de adjetivos: cilíndricos, ainda lembram os de Whitehead, mas nada têm a ver com os de Fulton, que se enquadram melhor na categoria das minas.
Ou melhor, têm algo a ver com eles, sim: os torpedos mudaram de formato, mas mantiveram o nome. A expansão metafórica seguinte, ocorrida no português brasileiro informal em algum momento do século 20, deu à palavra o sentido de “bilhete enviado a uma pessoa determinada, em recinto público”, segundo o Aurélio – e o Houaiss acrescenta oportunamente: “geralmente com intenções amorosas”. É evidente o humor da analogia, possivelmente relacionado ao jogo conhecido como batalha naval: o torpedo seguia silencioso, abaixo da superfície das conversas, e ia explodir lá na frente – ou não, caso em que o torpedeador talvez murmurasse entre dentes: “Água!”. O desenvolvimento que deu no sentido atual de mensagem eletrônica de texto brotou diretamente daí.
Essa é uma matéria exclusiva para assinantes. Se já é assinante, entre aqui. Assine para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.
Essa é uma matéria fechada para assinantes e não identificamos permissão de acesso na sua conta. Para tentar entrar com outro usuário, clique aqui ou adquira uma assinatura na oferta abaixo
Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique. Assine VEJA.
Impressa + Digital
Plano completo da VEJA! Acesso ilimitado aos conteúdos exclusivos em todos formatos: revista impressa, site com notícias 24h e revista digital no app, para celular e tablet.
Colunistas que refletem o jornalismo sério e de qualidade do time VEJA.
Receba semanalmente VEJA impressa mais Acesso imediato às edições digitais no App.
Digital
Plano ilimitado para você que gosta de acompanhar diariamente os conteúdos exclusivos de VEJA no site, com notícias 24h e ter acesso a edição digital no app, para celular e tablet.
Colunistas que refletem o jornalismo sério e de qualidade do time VEJA.
Edições da Veja liberadas no App de maneira imediata.