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Sobre Palavras

Por Sérgio Rodrigues Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.

Bacana, uma palavra que dança tango

É impressionante – quase escrevi que é bacana – a resistência demonstrada pela palavra bacana à passagem do tempo. Seu sinônimo supimpa virou peça de museu, e quando aparece hoje num texto ou numa fala vem sempre acompanhado de um grifo invisível que atesta a ironia do uso. Não há surpresa nisso: gírias costumam ter […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 07h20 - Publicado em 27 nov 2012, 16h08

É impressionante – quase escrevi que é bacana – a resistência demonstrada pela palavra bacana à passagem do tempo. Seu sinônimo supimpa virou peça de museu, e quando aparece hoje num texto ou numa fala vem sempre acompanhado de um grifo invisível que atesta a ironia do uso. Não há surpresa nisso: gírias costumam ter vida curta mesmo.

Incomum é a trajetória de bacana, um daqueles vocábulos que, por abarcar um grande número de sentidos positivos, são chamados pelos lexicógrafos de palavras-ônibus. Com registro num dicionário de português desde 1958 (o pioneiro foi o Morais, em sua derradeira edição), bacana vem desde então se mantendo mais ou menos atual, submergindo aqui para reaparecer lá na frente, e viu sinônimos mais novos como joia e massa envelhecerem mais depressa. Faz tempo que tem ar respeitável, incapaz de chocar o mais conservador dos falantes, sem no entanto perder o jeitão informal. É bacana ou não é?

Bem, talvez a frase sobre o mais conservador dos falantes contenha algum exagero. Há quem implique com a palavra por julgá-la uma parente óbvia de bacanal (“orgia”). Essa relação já foi defendida por alguns estudiosos, mas o mais provável é que, caso exista, esteja enterrada bem fundo na história obscura de um dialeto genovês. Enquanto bacanal veio do latim bacchanal, “festim em honra de Baco, deus do vinho”, bacana é sem dúvida proveniente do lunfardo, patoá criado pelos malandros de Buenos Aires a partir de expressões dialetais trazidas por imigrantes italianos. (O Houaiss classifica o lunfardo como “linguagem de delinquentes”. Seu largo emprego em letras de tango deu-lhe um alcance cultural maior do que sugere tal definição.)

Na verdade, o que importamos foi a forma feminina da palavra bacán, cuja fonte primeira é o termo do dialeto genovês baccan, que nada tinha a ver com orgia. Seu sentido era o de senhor da terra, “chefe do lugar”, como informa o Novísimo Diccionario Lunfardo de José Gobello e Marcelo H. Oliveri.

Na Argentina, o sentido da palavra manteve relação com a ideia de poder e propriedade, mas ficou mais malicioso: bacán era o homem que sustentava uma amante, sobre a qual tinha direitos exclusivos. Já se vê que ser um bacán não saía barato. Por extensão de sentido, surgiram então no próprio lunfardo duas outras acepções: “indivíduo que é ou aparenta ser rico” e “caro, luxuoso”.

Foram esses os sentidos que trouxemos para o português e que circulam até hoje, com a segunda acepção tendo se expandido para abarcar aquilo que, mesmo não sendo caro, representa luxo e valor no sentido metafórico. A perfeita correspondência semântica com o lunfardo é suficiente, a meu ver, para eliminar qualquer dúvida sobre a origem de bacana.

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