Não é atribuição do Congresso fiscalizar governadores e prefeitos, não é possível tratar 27 governadores e 5.570 prefeitos como se fossem uma coisa só, falta “fato determinado” a ser investigado: a “CPI dos governadores” é uma conversa fiada cujo único propósito é desviar a atenção da CPI que interessa. A do governo federal.
Bolsonaro — ingênuo o suficiente para ordenar um crime contra a República pessoalmente, por telefone, e ainda autorizar a divulgação da gravação — parece acreditar que o estratagema possa dar certo.
É improvável que dê.
Todo mundo sabe qual é a CPI que interessa, e é nela que todo mundo vai prestar atenção. Se funcionar como deve, a CPI produzirá um relatório devastador, que gerará vários novos pedidos de impeachment e criará enormes constrangimentos para Arthur Lira e a Câmara.
Como o presidente da Câmara poderá se recusar a votar o impeachment se o Senado declarar que ele cometeu crime de responsabilidade? Onde os deputados encontrarão coragem para votar contra?
Ainda que a tropa de choque bolsonarista consiga suavizar o relatório, o desgaste será brutal. Mandetta e Teich explicarão em detalhes por que saíram; Pazuello contará por que não comprou vacinas, seringas e agulhas e impingiu cloroquina; o diretor do hospital de Manaus narrará seus apelos por oxigênio que ficaram sem resposta etc. etc. etc. É isso que vamos ver na TV. Todo dia. Durante meses.
“CPI a gente sabe como começa, mas nunca sabe como acaba”, disse certa vez Jorge Bornhausen. Ninguém sabe se a CPI terá combustível para derrubar Bolsonaro — o Brasil é um país maluco, que ainda prestigia e mantém na presidência um presidente desequilibrado —, mas o custo em popularidade que ele sofrerá não será baixo.