A constante renovação da música brasileira é acompanha de perto há 50 anos por VEJA. A reportagem desta semana que mostra as novas caras do frevo, popular gênero musical de Pernambuco que completa 111 anos em 2018, é a continuação de uma observação constante da revista sobre os estilos musicais mais populares do país.
Se a edição 2 568, que chega nesta sexta-feira às bancas, destaca músicos como César Michiles, líder de uma orquestra que colocou a flauta no frevo e vem ajudando a a subverter a lógica do estilo, outros “revolucionários” ganharam espaço em nossos textos. Um deles foi Nélson Ferreira, que em 7 de março de 1973, 50 anos após gravar seu primeiro frevo, deu entrevista a VEJA na qual explicou um pouco da história do gênero que ajudou a difundir com suas inúmeras composições.
“Até instalarem uma fábrica de discos no Recife, os compositores iam para o Rio e São Paulo e gravavam lá. Tiravam-se umas 5 000 cópias dos discos, que eram todos mandados para o Recife, no sul ninguém tomava conhecimento. Em 1957, porém, a minha Evocação nº 1 estourou em todo o país, para grande surpresa minha: é raro tocar um frevo de bloco todo diferente a gerações passadas. Então, com o sucesso, fui ao Rio uns quinze dias antes do Carnaval e fiquei vendo a guerra entre os compositores, querendo promover suas músicas, pagando para tocar, pagando para não tocar, pagando para quebrar o disco do outro, um inferno. Dentro desse ambiente, o frevo não podia entrar.”
Linhas depois, ele comemorava uma luz no fim do túnel para o ritmo pernambucano. “Para promoção do frevo temos agora uma oportunidade magnífica, porque compositores do Sul, como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque e Edu Lobo, estão compondo no gênero. Ainda que fujam um pouco das características do frevo, não deixa de ser frevo.”
Leia a entrevista do compositor Nélson Ferreira, de 1973, na íntegra.
Em 4 de março de 1987, outro estilo musical seria capa da revista. Com o título “A Bahia brinca ao som do rei do deboche”, a publicação apresentava Luiz Caldas como o principal divulgador do axé, que começava a explodir em todo o país.
Dizia a reportagem: “A legião de foliões que tradicionalmente ocupa as ruas de Salvador durante o Carnaval descobriu, no ano passado, que havia algo no ar além dos frevos, sambas e afoxés de carreira. Havia a voz e a guitarra de um jovem cantor com cara de menudo, cabelos de Michael Jackson e pose de Paulo Ricardo, o líder da banda de rock RPM. Com um disco de estreia debaixo do braço, esse jovem cantor entrou na festa com fantasia de carneiro e saiu dela vestido de leão. Munido de uma música de ritmo original, Fricote, e de uma dança contagiante, o “deboche”, Luiz Caldas — este o nome do cantor — roubou o Carnaval, tornou-se um ídolo regional e ecoou nas rádios do país. O Carnaval da Bahia, aparentemente, ganhara um novo herói.”
O “herói” aproveitou a reportagem para explicar o motivo de seu sucesso. “A Bahia é o território livre da música, ninguém tem preconceito contra qualquer gênero”, disse Luiz Caldas. “Por isso, qualquer inovação vinga e acaba por se transformar em mania quando chega o Carnaval”.
Em 2013, foi a vez de o sertanejo ser reconhecido como o gênero da moda no país. Com o título de capa “Na estrada com os sertanejos”, repórteres acompanharam os maiores ídolos do estilo dentro e fora dos palcos.
Leia alguns trechos:
“Na manhã do dia 21 de outubro, o turbo-hélice King Air B200, vindo de Itápolis, no interior de São Paulo, chega ao hangar de uma empresa de táxi aéreo do Aeroporto de Congonhas. A bordo estão os sertanejos Bruno & Marrone, sua assessora, seus secretários e a reportagem de VEJA. Não foi uma viagem tranquila: a caminho de São Paulo, a aeronave enfrentou uma turbulência e chacoalhou mais que carrinho bate-bate em parque de diversões. O secretário de Marrone, Jardel Alves Borges (que em 2011 passou três meses no hospital após um desastre de helicóptero), foi quem mais sofreu com os solavancos. A certa altura, pediu que lhe segurassem as mãos, que estavam geladas. Marrone permaneceu em silêncio e em momento algum tirou os fones de ouvido que havia colocado em Itápolis. Quando o avião pousou, ele fez o primeiro – e o mais improvável – comentário do dia. Aproximou-se do fotógrafo de VEJA, Luiz Maximiano, e deu dicas de qual avião comprar: “Este aqui me foi vendido pelo (apresentador) Ratinho. Ele me deu um desconto que nem meu pai daria”. Depois, convidou a equipe da revista para jogar bola e comer churrasco em sua fazenda, no noroeste de Goiás. Essa informalidade, tão rara em artistas de outros gêneros musicais, é comum no mercado sertanejo. Nele há uma matutice, uma coloquialidade que contrasta com as cifras milionárias e as performances espetaculosas. E a turma da bota e do chapelão sempre preferiu a praticidade ao luxo. Um avião turbo-hélice é mais barato e menos glamouroso que um jato, veículo predileto das divas da axé music. Por outro lado, pousa em qualquer tipo de pista – algo imprescindível para quem, não importa o tamanho do sucesso, nunca pode abandonar o público dos rincões do país. São essas particularidades (além, é claro, da música) que fazem do sertanejo o gênero mais popular do Brasil. VEJA acompanhou quatro expoentes do filão (Zezé Di Camargo & Luciano, Bruno & Marrone, Michel Teló e Fernando & Sorocaba), além de duas promessas (o cantor Israel Lucero e a cantora Laís), em viagens pelo território nacional. E pôde constatar como e por que o estilo dominou o país.
(…)
Quem ganha muito tem de cuidar para que o dinheiro não evapore – e essa lição os astros sertanejos, não raro vindos de lares humildes, trazem do berço. Caracteristicamente, eles costumam ser tanto astutos quanto conservadores em seus investimentos. Michel Teló e Bruno & Marrone investem em imóveis, Sorocaba agencia artistas e tem um estúdio de gravação em parceria com Fernando. Zezé Di Camargo cria gado (é um dos maiores produtores da raça nelore) e é sócio do irmão no ramo de construção. E Leonardo, o ex-parceiro de Leandro, faz de tudo isso um pouco: cria gado, investe na construção civil e empresaria outros sertanejos.
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O sertanejo já foi considerado um gênero menor. “As pessoas tinham vergonha de confessar que gostavam”, diz Michel Teló. Hoje não é mais assim, nem de longe. Segundo uma pesquisa da Target Group Index, 47% dos brasileiros que escutam rádio o fazem para ouvir música sertaneja. E a maioria desses ouvintes está dividida entre as classes A e B (36%) e C (52%). Não espanta que o gênero domine as preferências do público em São Paulo e seu interior (60% e 61%), ou mesmo em Brasília (56%). Mas é assombroso que responda por 45% delas em Salvador. O sertanejo já é o terceiro gênero mais popular na capital baiana. De acordo com pesquisa da Futura Pesquisa e Consultoria, em 2011 perdia só para a MPB (este, um rótulo que congrega de tudo, de Roberto Carlos a axé) e para o pagode. A música sertaneja é também campeã de execução. Segundo a Crowley Broadcast Analysis, empresa que afere a audiência das rádios, das vinte canções mais executadas no país em 2012, onze são sertanejas.”
Leia a matéria na íntegra da edição 2 306 clicando aqui.