O ERRO DE CRISTINA
A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, meteu os beiços pelas mãos — ela tem aquela formidável boca de peixe que, suponho, algumas mulheres devem achar sensual… Que perverso pode se excitar com aquilo??? — e resolveu demitir o presidente do Banco Central, Martín Redrado. Ocorre que a lei do país não lhe faculta tal licença […]
A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, meteu os beiços pelas mãos — ela tem aquela formidável boca de peixe que, suponho, algumas mulheres devem achar sensual… Que perverso pode se excitar com aquilo??? — e resolveu demitir o presidente do Banco Central, Martín Redrado. Ocorre que a lei do país não lhe faculta tal licença sem a concordância do Congresso. Como já é sabido, ela determinou que US$ 6,5 bilhões das reservas fossem usados para saldar dívidas públicas. O BC é independente, e Redrado disse “não”. Contra a lei, ela o demitiu. A juíza María José Sarmiento determinou a restituição do homem ao cargo. O governo apelou, mas Sarmiento já avisou que não há prazo para decidir.
E a crise se instalou. Cristina está em guerra com a oposição, com a imprensa e com o vice-presidente do país, Julio Corbos. Pobre Argentina! Parece condenada a não se redimir da pequenez de seus líderes políticos. Nestor Kirchner, antecessor de Cristina e seu marido, poderia ter saído da presidência quase como um herói. Afinal, chegou ao poder num momento de institucionalidade zero do país. E a economia, dentro do possível, acabou se recuperando.
Ocorre que os Kirchners são filhos da mais antiga praga argentina, o peronismo. De Juan Domingo Perón, propriamente, sobrou pouco como conteúdo político, administrativo ou programático. Restou a cultura da política personalista do líder que se considera acima das instituições.
Nestor Kirchner, a despeito de certo ar amalucado, parecia empenhado em reconstruir o arcabouço legal. Quando começou a articular a sucessão para cair no colo da própria mulher, estava claro que só era mais um representante daquela maldição. No poder, Cristina resolveu eleger a imprensa como sua principal inimiga. E, agora, bate-se contra as próprias leis do país e, na prática, contra uma prerrogativa do Congresso. É o caminho certo para o desastre.
Lula só se deu bem, no Brasil, porque soube, na economia, preservar a herança bendita que recebeu de seu antecessor. A fuça da crise só se mostrou, no terreno da política, nos momentos em que ele próprio e seus aloprados resolveram atropelar as instituições. Dona Cristina se elegeu segundo as leis e depois começou a achar que são elas que atrapalham o seu governo. Isso nunca dá certo, e o povo sempre paga a conta.