É preciso ter vergonha na cara
Posso imaginar a perplexidade dos leitores de Luis Nassif e de Paulo Henrique Amorim. São poucos, mas existem. Se não estiverem se sentindo uns otários, então provam que são uns otários. Até anteontem, os dois comandavam uma guerra santa contra este blog e contra a VEJA por causa da compra da Brasil Telecom pela Oi […]
Pois bem, Amorim e Nassif — este mais do que aquele — não tiveram dúvida: o blog e a VEJA estariam a serviço de Daniel Dantas. Vocês se lembram certamente das acusações. Eis que, de súbito, ambos mudam de opinião. Num dia, pensam uma coisa; no outro, o contrário. O que terá acontecido? Posso imaginar… O pequeno número de rancorosos que eles mobilizam mandava seus comentários: “É isso mesmo!” “Parabéns!” “Esse Reinaldo etc e tal…” Agora, Nassif endossou todas as restrições de Janio de Freitas à operação — QUE SÃO RIGOROSAMENTE AS MINHAS —, e os coitados estão perdidos. Nassif, que vive inventando teorias conspiratórias, realmente se superou. A tese é a seguinte:
– As restrições de Reinaldo Azevedo são pura manipulação de Daniel Dantas;
– As restrições de Janio (com as quais ele diz concordar), embora sejam as mesmas de Reinaldo, são a expressão da decência.
Santo Deus! Essa gente não está preparada para conviver com a honestidade intelectual. Em questão de horas, muda de um pólo para o outro na escala da opinião sem nem mesmo enrubescer. Trata-se de gente incapaz de pensar com autonomia, de ser dona de seu nariz, de sua análise, de seu ponto de vista. Deve ser uma vida bem triste, ainda que rentável. É claro que acho que as pessoas podem mudar de idéia sobre isso e aquilo. Já mudei, sim. Mas não durmo corintiano e acordo palmeirense. Quando você é autônomo, as mudanças vão acontecendo ao longo do tempo, no decorrer de sua vida. Como ficam os leitores dos dois valentes? Imaginem se começo agora a fazer uma ginástica verbal para dar apoio à operação… Vocês acham que eu teria coragem de fazê-lo? Será que tenho cara pra isso? Não. Mudaria de profissão. Mas eles fazem. É a forma que têm de respeitar seus leitores. Estes, por sua vez, devem se sentir bem representados…
Caso Obama
Anteontem, chegou-me um comentário que merece ser mencionado. Não fossem os palavrões, eu o teria publicado na íntegra. No trecho que pode ser compartilhado, um cretino que se identifica como “Anti-Reinaldo” escreve: “Aí, idiota, a Veja elogiou Obama. Quanto tempo vai demorar pra você dizer que o cara é legal? Que foi? Esqueceu de perguntar antes ao patrão o que você deveria escrever?”
Vocês devem ter lido: a VEJA desta semana traz uma excelente reportagem sobre o político democrata, absolutamente objetiva nos fatos que alinhava e, com efeito, simpática ao senador de Illinois. Uma revista semanal tem o dever de ser também analítica. A análise expressa naquele texto não é a minha, como sabem. Não estou convencido de que Barack Obama seja uma espécie de símbolo da era da globalização e que encarne, a um só tempo, os valores da América profunda e de um novo tempo. Ao contrário até: acho que ele é expressão de um movimento regressivo da política dos EUA. Sim, trata-se de uma divergência.
De fato, não liguei antes para perguntar o que escrever. E não o fiz no caso de Obama como não o faço em caso nenhum. Não é a primeira vez que expresso uma opinião distinta do que se publica na revista. Duvido que a VEJA concorde com tudo o que escrevo no blog ou nos artigos mensais de duas páginas. Até porque a idéia de que exista “a” opinião da VEJA, como se fosse a sentença decidida numa madraçal, é uma estupidez, um delírio idiota dos esquerdopatas e vigaristas. A revista é a maior do Brasil — mais do que a soma das concorrentes — e a quarta no mundo não porque tenha esse tipo de rigidez. Embora seja, sim, felizmente, sempre muito clara.
Deve ser realmente muito duro a essa gente que vive de “prestar serviço”, de fazer e receber pequenos e grandes favores, perceber que aqueles a quem detestam têm autonomia. Li a reportagem de VEJA sobre Obama, escrita por gente que respeito, e certamente usarei o que lá está como subsídio para as minhas reflexões e ponderações. Mas penso o que penso; sou quem sou; tenho os valores que tenho. E por isso estou aqui. Os que me convidaram o fizeram porque estão interessados em manter a diversidade. Não me chamaram para mudar o meu pensamento. No dia em que um dos parceiros achar que é hora de mudar, muda-se. Assim é a vida.
Se vocês querem saber, acho a VEJA plural demais, não de menos. Sou transparente; sempre digo tudo: quando Luiz Carlos Mendonça de Barros saiu da revista e do site Primeira Leitura, alguns leitores observaram, como censura: “Sem o Mendonça, vocês foram mais pra direita”. E era a pura verdade. Mendonça é mais “tolerante” do que eu com os esquerdistas e “mudernos”. Respondi: “Sim, leitor, você está certo”. Primeira Leitura fechou por falta de anunciantes. Melhor perder a revista do que perder a vergonha na cara. Se tivesse mudado de opinião como Nassif e Amorim mudaram, do dia para a noite, talvez tivesse sobrevivido.
VEJA não trata seus leitores como idiotas. E, por isso, eles são milhões. Eu não trato os meus leitores como imbecis, e, por isso, em sua área, este blog se tornou a principal referência. Quem tem princípio não tem medo nem precisa pedir licença para dizer o que pensa. Pode andar com a cabeça erguida. Aquele leitor a que me referi escreveu num outro trecho: “Acho que a VEJA vai dar um pé na sua bunda”. Impossível, mané. Isso não vai acontecer porque eu não permito. No máximo, ela pode me demitir. Pé no traseiro, com desonra, recebem os venais, os vendidos, os lobistas, os atravessadores, os porta-vozes de clientes.
Eu sou porta-estandarte da minha visão de mundo. E só. E por isso estou aqui. Talvez seja mesmo hora de parar de me referir a certos pterodáctilos do jornalismo. Este episódio serviu, creio, para evidenciar (como se ainda fosse necessário…) quem é quem. Leiam o que escrevi sobre este assunto Oi-Brasil Telecom e o que escrevo agora.
“A vergonha é a herança maior que meu pai me deixou”.
Essa gente está acabada.