Novas e impressionantes baixarias no Senado. No centro do picadeiro, mais uma vez, os senadores Lindbergh Farias (PT-RJ) e Gleisi Hoffmann (PT-PR), aquela que admite não ter moral para julgar uma presidente da República porque é uma investigada. Ora, se esta senhora considera não ter moral para exercer uma das atribuições dos senadores, por que teria para exercer as demais? Mas deixo isso de lado por enquanto para me fixar no principal.
A pedido do próprio José Eduardo Cardozo, advogado de Dilma, Luiz Gonzaga Belluzzo, uma testemunha de defesa, foi convertido em informante, condição em que a fala não produz prova e em que o depoente pode se dedicar a voos retóricos. Não precisa se fixar no que sabe e viu. Também pode inventar à vontade. Uma nota: ele nem poderia ser testemunha, é claro! Afinal, é sócio de uma revista, a Carta Capital, que serviu como porta-voz informal do governo petista, recebendo uma régia verba de publicidade para isso. Informante.
Até agora, o depoimento de Belluzzo é, para mim, o mais significativo. Afinal, ali estava o economista das ideias ditas heterodoxas, que destruíram as contas públicas brasileiras. Consegui entender tudo. O ex-secretário de Política Econômica (1985-1987) do governo Sarney, o ex-presidente do Conselho Curador da EBC e o ex-presidente do Palmeiras, ele explicou, de algum modo, por que, ainda que com a fala doce e caroável, produz tantos desastres. Sem contar que é o inspirador original da magistral ideia de se sequestrar a poupança dos brasileiros para domar a inflação “com um único tiro”, medida que Fernando Collor adotou em seu governo, com as consequências conhecidas.
Belluzzo explicou por que, a seu ver, a presidente Dilma não cometeu crime nenhum. Sabem o que é? Ele não considera que as, digamos, operações a descoberto dos bancos públicos para financiar ações do governo, sem os devidos repasses do Tesouro, sejam operações de crédito. Para ele, são meras questões fiscais. ATENÇÃO! É PRECISAMENTE ESSA VISÃO DE MUNDO QUE LEVOU O BRASIL À BANCARROTA QUANDO BELLUZZO ERA GOVERNO, NA GESTÃO SARNEY, E QUE LEVOU O PAÍS AO DESASTRE ECONÔMICO QUANDO ESTE SENHOR SE TORNOU GOVERNO DE NOVO!
Explico, meus caros. O Artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal diz o seguinte:
“Art. 36. É proibida a operação de crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação que a controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo.
Parágrafo único. O disposto no caput não proíbe instituição financeira controlada de adquirir, no mercado, títulos da dívida pública para atender investimento de seus clientes, ou títulos da dívida de emissão da União para aplicação de recursos próprios.”
E o que é uma “operação de crédito”? É justamente o que fez Dilma: deixar que o banco público arque com uma conta que é do governo, sem lhe repassar o dinheiro do Tesouro.
Mas Belluzzo, a testemunha de Dilma, deixou claro: discorda da lei. Para ele, é questão só fiscal. Se é, resolve-se tudo com o papelório burocrático e pronto. Na genial visão do economista, na prática, Tesouro, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES são uma coisa só: é tudo dinheiro do estado, e o governante, pois, usa isso tudo como quiser.
Olhem aqui, meus caros: foi essa concepção de estado que conduziu o Brasil à ruína duas vezes. Foi essa concepção de estado que foi posta de lado, felizmente, com o Plano Real. Foi essa concepção de estado que, ao ser retomada por Dilma, pôs tudo a perder: até mesmo as magras conquistas do PT na área social.
O economista aproveitou ainda para tentar passar uma pequena lição de moral e destacar a importância que a atuação do estado tem na economia, seja na forma de concessão de crédito, seja na concessão de subsídios. E citou a agricultura como um dos setores beneficiados, lembrando o trabalho da Embrapa. Minha pergunta: era isso o que estava em debate??? Ah, sim: em outra oportunidade, aproveitou para criticar a taxa de juros.
Só para lembrar: o governo reembolsou aos bancos públicos a fabulosa quantia de mais de R$ 56 bilhões. Se o fez, evidencia-se que usou um dinheiro que não era seu. Se usou, tratava-se uma operação de crédito. Fosse mera questão fiscal, fazia-se mero encontro de contas, e tudo estaria resolvido.
Mas sejamos todos gratos a Belluzzo: finalmente entendemos a essência da defesa da presidente afastada, Dilma Rousseff. Assim como Gleisi não reconhece a moral de um Senado que a aceita como membro, Dilma não reconhecia, a exemplo de Belluzzo, as leis vigentes no país que a aceitou como presidente.
Ainda bem que está indo pra casa.