A sessão de julgamento do Cade desta quarta-feira foi marcada por um bate-boca e acusações entre os conselheiros. Os trabalhos chegaram a ser interrompidos por cerca de dez minutos para que os nervos fossem acalmados.
O Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica julgava embargos de declaração contra a decisão proferida, em fevereiro, sobre a venda da Oi Móvel para Tim, Claro e Telefônica Brasil (dona da Vivo).
Relatora do caso, a conselheira Lenisa Prado determinou a incorporação de imposições unilaterais no Acordo em Controle de Concentrações (ACC), atendendo parcialmente o pedido da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas e da Algar Telecom. Já o conselheiro Luiz Hoffmann se limitou a informar que acompanhava a relatora.
Na sequência, o conselheiro Luis Henrique Braido fez um voto em tom de desabafo e criticou três dos colegas que ratificaram o ACC no mês passado, que segundo ele “tinha um intuito claro de humilhar o Cade”.
“A meu ver, as inexatidões contidas no ACC são propositais. E três membros desse Conselho concordaram com elas. Então não vejo o que possa ser feito a esse respeito. Peguemos, por exemplo, o compromisso de ofertar até — até — 50% das Estações de Rádio Base. Isso foi algo que passou despercebido? Não. Tinha um intuito claro de humilhar o Cade. As empresas estão dizendo ao mercado: passamos por cima do Cade e fizemos a maioria dos seus membros defender, registrar e assinar um compromisso duplamente vazio”, declarou.
Braido também classificou a medida como uma “brincadeira” e disse entender que isso ocorreu “de má-fé”. “Não foi sem querer”, comentou o conselheiro, que ainda fez outras críticas ao voto condutor de Lenisa.
Após uma intervenção da relatora, que esclareceu um ponto do seu voto, ele disse que a medida ficou então “triplamente vazia”. Braido comemorou ainda, de forma irônica, que todo o processo tenha sido registrado, para que o trabalho dos técnicos do Cade não tenha sido em vão.
O conselheiro Sérgio Costa Ravagnani fez coro às considerações de Braido e defendeu a anulação de parte da decisão do próprio tribunal.
“Eu lamento muito ter que dizer isso, mas me assusta a primariedade dos erros jurídicos cometidos na decisão embargada”, declarou Ravagnani.
“O que foi feito na decisão embargada foi o famoso ‘dou com uma mãe e tiro com a outra’. Este comportamento não reflete uma atuação segundo padrões éticos e de boa-fé”, acrescentou, sendo interrompido por Lenisa, que questionou se ele estava questionando a sua ética.
“Conselheiro Sérgio, nós temos aqui uma discussão muito séria, o senhor está fazendo uma acusação muito séria, sem nenhum fundamento. O senhor diz que eu dei com uma mão e retirei com a outra”, rebateu Lenisa. O conselheiro então afirmou que não a citou diretamente.
A relatora disse querer que seja feita qualquer tipo de investigação sobre a acusação contra ela, porque seu voto é expresso e tem fundamento jurídico.
“O senhor questiona além da minha ética, a minha capacidade técnico-jurídica. Isso eu nunca fiz e não vou fazer com nenhum dos meus pares. Registro aqui a minha insurgência”, declarou Lenisa.
O presidente do Cade, Alexandre Cordeiro, interveio e pediu que a discussão se ativesse às questões técnicas, e que qualquer acusação fosse feita pelas vias formais, lembrando que o Conselho tem uma Corregedoria. Ele também solicitou que ele não fizesse “ilações que não levam a efetivamente nada, a não ser a essa confusão no julgamento”.
Antes de votar com a relatora, Cordeiro disse que, em sete anos de Cade, esta foi a primeira vez que presenciou “um absurdo desses que foi feito nessa sessão”. “O que o conselheiro Braido e o conselheiro Sergio falaram eu repudio veementemente essas manifestações […] O que vocês falaram está gravado”, afirmou.
Ele disse que os colegas agiram de maneira deselegante contra a maioria do tribunal que aceitou a aprovação do caso. Nesse momento, Lenisa desligou a câmera e reapareceu pouco depois limpando os olhos com um lenço, dando a entender que havia chorado.
“O que me parece, vocês me desculpem, é que é uma forma de espernear […] Eu fico muito triste de isso acontecer no Conselho, porque se vocês têm alguma coisa para falar da probidade, da moral e da ética de algum membro desse Conselho, que o façam pelas vias adequadas. Agora, numa sessão, fazer esse tipo de acusação, vocês podem inclusive responder judicialmente pelos danos que vocês podem ter causado”, acrescentou Cordeiro, que se solidarizou a Lenisa e Hoffmann.