Como o Radar revelou ontem em primeira mão, lideranças ambientais — incluindo senadores, deputados e membros da sociedade civil — encaminharam uma carta aos Estados Unidos nesta quinta-feira pedindo para que o presidente Joe Biden não assine qualquer acordo relativo à Amazônia com o Brasil.
Segundo os signatários, o governo de Jair Bolsonaro não representa os verdadeiros interesses da população brasileira em termos de meio ambiente. “Alertamos que um acordo firmado neste cenário representará um mecanismo de validação e financiamento da agenda de destruição ambiental promovida pelo Governo, e que avança abruptamente no Congresso Nacional”, afirmam.
Leia a seguir a íntegra do documento:
“Carta dos Parlamentares e da Sociedade Civil do Brasil aos Estados Unidos da América, em defesa da Amazônia
Os parlamentares e as organizações da sociedade civil brasileira que compõem o Fórum Nacional Permanente em Defesa da Amazônia, e as demais que assinam o ‘Manifesto ao Povo Brasileiro e à Comunidade Internacional’ anexo, apoiam e estimulam a cooperação internacional para a defesa do meio ambiente no Brasil. O papel estratégico do Brasil e da Floresta Amazônica no combate à crise climática planetária fundamenta a importância do engajamento internacional, nos limites da soberania nacional, por meio de financiamento para medidas de proteção da floresta, suas populações tradicionais e povos originários. Neste sentido, reconhecemos e saudamos os projetos de cooperação com os Estados Unidos celebrados nas últimas três décadas que fortaleceram regulamentações e programas pró-clima no Brasil.
Entretanto, próximo à realização da Cúpula do Clima, a portas fechadas, sem transparência, participação e consulta àqueles que serão diretamente afetados, ocorrem negociações de um possível acordo de cooperação entre os Estados Unidos e o governo Bolsonaro com a justificativa de apoio à Amazônia. Estes termos de tratativa geram preocupação àqueles comprometidos com a pauta climática, com a democracia e com os direitos humanos. É inaceitável a conduta adotada pelo Brasil neste processo sem inteirar a sociedade sobre a construção de um possível acordo, ao mesmo tempo é alarmante que o governo dos Estados Unidos atribua confiança a um governo que empenha o negacionismo climático e tem a Amazônia e aqueles que lutam por sua conservação como inimigos. O alerta sobre o risco que o acordo pode representar para o meio ambiente e sociedade na atual conjuntura de ataques também foi apresentado em diversas cartas recentes ao governo do presidente Joe Biden, como a carta da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), na do Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS; na carta da Sociedade Civil brasileira, assinada por cerca de 200 organizações.
Ao passo que negocia o acordo, Bolsonaro e seus aliados articulam a aprovação de leis que estimulam desmatamento, conflitos e violência na Amazônia, como a ‘grilagem’ de terras; o enfraquecimento do licenciamento ambiental, a abertura das terras indígenas para a agricultura empresarial e a atividade mineral, entre outras medidas de desregulamentação do uso da terra e recursos naturais. Alertamos que um acordo firmado neste cenário representará um mecanismo de validação e financiamento da agenda de destruição ambiental promovida pelo Governo, e que avança abruptamente no Congresso Nacional. Da mesma maneira, representaria um aval à política de retrocessos de Bolsonaro, justamente no pior momento da pandemia no país, quando o Brasil atinge mais de 350 mil mortos pelo coronavírus e retornamos ao Mapa da Fome.
Entendemos que um Acordo com um governo abertamente antiambiental e antidemocrático, com tamanho pacote de retrocessos socioambientais tramitando no parlamento brasileiro, que se dê sem a consulta, a transparência, o diálogo com a sociedade civil, com governos da região amazônica, e com as populações locais é ilegítimo, insustentável, e seus resultados positivos, improváveis. A cooperação internacional para a Amazônia é bem-vinda, porém deve ocorrer com o comprometimento de ambas as partes com a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável e justo para as populações e, assim, atender ao interesse coletivo em prol da Amazônia, da democracia e dos direitos humanos do Brasil.”