O presidente Jair Bolsonaro indicou o delegado da Polícia Federal Alexandre Ramagem Rodrigues para a direção-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Ele ainda será sabatinado em comissão do Senado. Ramagem respondeu a um curioso processo no Rio de Janeiro, por “enriquecimento sem causa”, como está escrito na página do Tribunal de Justiça.
Na verdade, se tratou de uma cobrança da PUC do Rio por algumas prestações que deixou de pagar no curso de Direito. Ele se formou em 2002, mas o processo se arrastou de 2005 a 2011.
VEJA pediu o desarquivamento do processo. A ação mostra que Ramagem foi condenado duas vezes por não pagar dívidas e ainda por apresentar informações não confirmadas à Justiça. Ele não pagou cinco mensalidades do curso.
Um eventual problema financeiro não poderia impedir mesmo alguém de se formar, apesar de a dívida somar menos de 3 mil reais.
Ramagem era morador da Barra e contatou dois advogados em Copacabana para contestar a dívida, cobrada inicialmente pela faculdade na Justiça em 2005. Ramagem, no período em que tentava protelar a sentença, entre 2006 e 2008, inseriu informação não confirmada no processo.
O delegado, por seus advogados, justificou no tribunal que a dívida já havia prescrito e que durante sua graduação “foi beneficiado pelo programa federal de bolsa auxílio a universitário, denominado FIES – Financiamento Estudantil, onde, mensalmente, fazia os depósitos do percentual referente à sua bolsa”.
O delegado alegou ainda que “repassou tal valor proporcional à Caixa Econômica Federal, que, por usa vez, haveria de repassar o valor integral ora pretensamente cobrado à instituição autora”.
As Faculdades Católicas, mantenedora da PUC, contestaram essa versão do Fies. Aí, veio a primeira sentença. A juíza Mírian Castro Neves de Souza Lima, da 5ª Vara Criminal do Rio, condenou Ramagem em outubro de 2006 ao pagamento da dívida de 2.357 reais, correspondente às parcelas dos meses de outubro a dezembro de 2002.
Em outubro de 2007, a juíza Maria Cristina de Brito Lima, do TJ do Rio, também condenou Ramagem a pagar as mensalidades, desprezando os recursos:
“O réu não comprovou que os valores cobrados são indevidos, está incorretos ou, como afirma, que efetuara o pagamento a outra entidade. Não provou ser beneficiário do Fies. ”, escreveu a juíza Maria Cristina.
Os advogados da PUC localizaram Ramagem trabalhando na Superintendência da Polícia Federal, em Roraima, como delegado. A Justiça enviou uma carta precatória. As Faculdades Católicas pediram a cobrança da dívida corrigida, agora no valor de 6.062 reais.
Em julho de 2008, o juiz Antonio Abi-ramia Duarte, do TJ de Roraima, determinou a penhora on line do valor devido por Ramagem.
O delegado justificou perante o juiz que a sentença era “completamente equivocada”, por não declarar a prescrição da cobrança. Ramagem ganhava nessa época 21.401 reais de salário mensal na Polícia Federal.
A Justiça bloqueou os valores nas contas do delegado no Banco do Brasil e no Itaú. Ramagem pôs fim à demanda. Após o dinheiro ser transferido para as Faculdades Católicas, o processo foi arquivado em setembro de 2011.
Ramagem está lotado hoje na Secretaria de Governo da Presidência da República, do general Santos Cruz, enquanto não é sabatinado no Senado para a Abin, Procurado pelo Radar nesta terça, o delegado afirmou que só tomou conhecimento da ação quando recebeu a carta precatória e, de imediato, tratou de quitar a dívida.
“A ação tratou de débito de mensalidade com a PUC/RJ que eu não tinha conhecimento. Como me encontrava, à época, residindo em Roraima, a precatória para minha ciência parece que não tramitou com muita celeridade.
Houve trâmite de execução do pagamento sem meu conhecimento. No momento em que tive conhecimento da demanda, solicitei expedição de mandado de pagamento e quitei o débito. A ação encerrou-se com a quitação”.
A PUC diz nos autos que, antes de acionar a Justiça, tentou solução não litigiosa. Por seu lado, o delegado informou na ação, via advogados, que nunca foi procurado para pagar essa dívida e que não se furtaria a quitá-la.
Sua defesa argumentou à época que a penhora de salário é ilegal e que, “em vista de tantas incongruências demonstradas pelo litígio”, iria desistir de litigar.