Em um dos raros momentos do filme Back To Black, cinebiografia de Amy Winehouse (interpretada por Marisa Abela), que mostra a cantora sob efeito da heroína e álcool, seu pai, Mitchell (Eddie Marsan) encontra no armário um cachimbo de vidro. Sua reação, talvez a mais incisiva do filme contra o vício que matou a filha em 2011, aos 27 anos, é esconder o objeto em seu bolso enquanto a filha padece na sala. Em outro momento, o marido da cantora, Blake (Jack O’Connell), aparece apresentando cocaína para Amy. Além disso, para suportar a insuportável perseguição dos paparazzi, Amy se afunda ainda mais no álcool. Mais do que encontrar um responsável pela morte da cantora, a cinebiografia de Amy, em cartaz nos cinemas, tenta humanizar a artista, focando a história no seu relacionamento com Blake.
Tão implacável quanto a perseguição dos paparazzi, as críticas estrangeiras ao filme foram atrozes, mas o resultado não é tão ruim quanto se esperava. Como entretenimento, Back To Black envolve os espectadores. Sam Taylor-Johnson entrega uma direção competente, a cenografia é ótima e a montagem idem. A trilha sonora e até a interpretação de Marisa Abela sustenta a tremenda responsabilidade de levar para as telas o vozeirão, vencedor de cinco prêmios Grammy.
Mas um filme não se sustenta apenas dessas qualidades. Apesar dos 27 anos de vida de Amy, seu legado e sua personalidade foram muito mais complexos daquilo que foi apresentado em tela. Com um roteiro chapa-branca, o filme mostra o pai da cantora como um cara que se preocupava com ela e o esteio que a sustentava, em vez de um homem que fazia vista-grossa para o vício em drogas e mais interessado nos ganhos financeiros que ela poderia gerar.
Outros pontos que incomodam é a pouca participação da mãe da cantora, que aparece em apenas duas cenas e falando apenas palavras como “eu te amo”. No lugar da mãe, está mais presente sua avó, Cynthia Winehouse, a Nan (Lesley Manville), uma conceituada cantora de jazz que teria sido a responsável por fazer pela primeira vez o mega coque beehive nos cabelos da neta, que se tornou sua marca registrada.
Num esforço para não manchar a reputação da artista além do limite, as deploráveis cenas que ela protagonizou publicamente foram atenuadas. A overdose que ela sofreu em 2007, por exemplo, não é mostrada. A identidade dos cantores da banda, suas interações no estúdio e todos os bastidores das gravações são ignorados, como se os incríveis hits gravados por Amy tivessem surgidos num passe de mágica.
Ao final, Amy surge limpa e num diálogo com o pai, enquanto bebe um gole d’água, diz que tudo o queria era um drink decente. Sua morte não é mostrada e a famigerada tela preta se encarrega de dizer que Amy, após uma recaída de álcool, bebeu até morrer, aos 27 anos. Dado a incrível história de Amy Winehouse, Back to Black poderia ter sido uma cinebiografia sobre uma cantora que viveu intensamente a vida e sua música, mas acabou contando uma história banal e sem apelo algum.
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