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‘Elvis’: filme reforça operação para rejuvenescer imagem do cantor

Longa de Baz Luhrmann marca o auge de um processo de resgate do legado lucrativo do ídolo

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h26 - Publicado em 15 jul 2022, 06h00

Por muito tempo, a imagem pública de Elvis Presley não honrou sua real importância na música e na cultura pop. Desde sua morte aos 42 anos, em 1977, o Elvis que ficou foi o da grosseira caricatura em que havia se convertido no fim da vida: decadente, cafona e inchado pelo consumo de remédios e álcool. As mais de 600 apresentações que fez em Las Vegas entre 1970 e sua morte viraram motivo de chacota, com o outrora ídolo do rock reduzido a um decrépito crooner em figurinos espalhafatosos. Nos últimos anos, no entanto, uma operação de resgate foi colocada em prática pela empresa Authentic Brands Group (ABG), que adquiriu os direitos de licenciamento da imagem do músico há uma década com a missão de fazer Elvis ser “cool” novamente. Um esforço que passa por tirar de cena o artista deprimente da fase Las Vegas e enaltecer a energia e o carisma revolucionários de sua juventude, bem como a autenticidade do amor que nutria pelas raízes negras da música americana. É esse ídolo retocado que surge na mesmerizante cinebiografia Elvis, dirigida por Baz Luhrmann e já em cartaz no país.

HERÓI - Elvis na fase madura: roupas cafonas e decadência -
HERÓI – Elvis na fase madura: roupas cafonas e decadência – (Michael Ochs Archives/Getty Images)

Elvis Presley: Último trem para Memphis

Estrelada por um Austin Butler que traz a sensualidade jovial à flor da pele, a produção marca o auge do processo de redenção do cantor. Narrado por seu controverso empresário, o coronel Parker (um canastríssimo Tom Hanks), que controlava a carreira do astro como um ditador excêntrico, o filme deverá servir para conquistar fãs mais jovens. No longa, Elvis é um bom moço temente a Deus e apaixonado pela esposa, mas também divertido, talentoso e intérprete de hits contagiantes. A trilha cumpre ainda a tarefa de rejuvenescê-lo: as músicas do rei surgem em versões modernas interpretadas por ídolos contemporâneos como Doja Cat, Kacey Musgraves, Tame Impala e Jack White. Para além do filme, ele ganhará ainda neste ano uma série de animação adulta na Netflix, concebida por sua ex-esposa Priscilla Presley. Na atração, intitulada Agente Elvis, ele deixa o rock para se tornar um espião a serviço do governo americano. O objetivo do filme ou da série não é mostrar Elvis como um simples roqueiro, mas um ícone que ajudou a moldar a história.

Elvis Presley – Blue Hawaii, 187 – Funko, Multicolorido

A exploração póstuma de sua imagem não chega a ser novidade, mas o sucesso da empreitada sempre esbarrou na inabilidade de sua filha e única herdeira, Lisa Marie Presley, de 54 anos, em administrar o legado do pai. Em 2005, à beira da falência, ela vendeu 85% da Elvis Presley Enterprises, que detinha os direitos do cantor, à CKX, dona do reality show American Idol. Com a crise de 2008, a empresa quebrou e, dois anos depois, acabou comprada pela ABG, por 145 milhões de dólares. Hoje, a firma — que também controla as imagens de Marilyn Monroe e Muhammad Ali — tem direito de licenciar tudo o que diga respeito a Elvis. E a meta de reconstruir sua imagem é obsessiva: a empresa proibiu até que pessoas fantasiadas de Elvis realizem casamentos temáticos em Las Vegas — a não ser, claro, mediante pagamento de taxa.

CARISMA - Elvis (Austin Butler) e o coronel Parker (Tom Hanks): a relação do cantor com o empresário é o fio condutor do filme -
CARISMA - Elvis (Austin Butler) e o coronel Parker (Tom Hanks): a relação do cantor com o empresário é o fio condutor do filme – (./Warner Bros)
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A gestão do espólio é compartilhada com outra empresa, a Graceland Holdings, do empresário musical Joel Weinshanker. Ele administra a mansão de Elvis em Memphis, a Graceland, transformada em museu e hotel, e produz shows ao vivo relacionados ao músico. Lisa Marie manteve a posse de Graceland, os bens pessoais do pai e tem 15% da Elvis Presley Enterprises. Com esse novo arranjo, o resultado foi uma enxurrada de iniciativas lucrativas. Segundo a revista Forbes, em 2021 Elvis foi a sétima celebridade morta mais rentável do mundo, com ganhos anuais de 30 milhões de dólares e um patrimônio entre 400 milhões e 500 milhões de dólares. “Creio que Elvis seja um dos maiores exemplos de gestão de carreira após a morte do artista”, analisa o produtor João Marcello Bôscoli, filho de Elis Regina e responsável pelo espólio da mãe. “Os produtos e iniciativas a respeito de Elvis se multiplicam ano a ano”, diz.

Retorno do rei: A grande volta de Elvis Presley

Em outro flanco, o resgate do roqueiro tem enfatizado a influência da música negra em sua carreira (veja abaixo). Por anos, Elvis foi visto como um cara que tirou espaço dos negros ao se apropriar de suas músicas e fez sucesso só por ser branco. O filme é muito bem-sucedido ao ressaltar como Elvis era amigo de B.B. King e venerava a música negra, bebendo do gospel, do R&B e do blues. Fisicamente, Elvis pode até ter morrido naquele fatídico 16 de agosto de 1977. Mas seu legado nunca esteve tão vivo.

As raízes negras do astro
As principais fontes de que o cantor bebeu para fazer sua revolução no rock

Sister Rosetta Tharpe
Sister Rosetta Tharpe – (Charles Peterson/Hulton Archive/Getty Images)
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Sister Rosetta Tharpe
O primeiro contato de Elvis com a música foi com o gospel nas igrejas — locais em que a cantora negra era estrela. A música dela influenciou não só Elvis Presley como o surgimento do rock

Little Richard
Little Richard – (Michael Ochs Archives/Getty Images)

Little Richard
A maneira espalhafatosa de dançar do artista — tida como indecente e subversiva na época — inspirou o famoso rebolado de Elvis. Ele também fez covers de hits de Richard, Tutti Frutti e Long Tall Sally

B.B. King
B.B. King – (Michael Ochs Archives/Getty Images)

B.B. King
Elvis era bem jovem quando conheceu o guitarrista na Sun Records. Cheio de atitude, King tentava andar na linha para não ser preso em tempos de segregacionismo, mas incentivou o amigo branco a quebrar regras

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Publicado em VEJA de 20 de julho de 2022, edição nº 2798

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