Alvo de investigações do STF e do TCU, de memes desairosos na Internet e da crítica geral da nação, o general Eduardo Pazuello pode não ser da artilharia, mas é a bucha de canhão da temporada. Em qualquer governo, sua cabeça já teria rolado. Mais dia, menos dia, porém, vai cair e, provavelmente, ser trocado por um político do Centrão, como, por exemplo, o atual líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). O timing para essa substituição é político. Não acontecerá com a pandemia em alta, pois nenhum louco quer se sentar na cadeira do Ministério da Saúde para administrar mortes. Enquanto o caos perdurar, o ministro é Pazuello. Quando a situação melhorar, segundo os planos do Planalto, sairá — de preferência levando consigo a imagem desastrosa de sua gestão.
O problema sempre está em fazer a realidade caber dentro dos planos de um governo sem noção. Difícil imaginar, nesse caso, que a troca do fusível vai levar a luz a acender. Já ficou claro para a maioria da população que Pazuello é Bolsonaro, e Bolsonaro é Pazuello. A frase do ministro em outubro, após ser desautorizado pelo presidente no compromisso de compra de vacinas Coronavac — que o governo acabou querendo — colou os dois para sempre: “Aqui, um manda e o outro obedece. Simples assim…”.
Simples assim, portanto, é deduzir que o inquérito aberto no STF para investigar a omissão do ministro da Saúde no caos em Manaus, e a ação do TCU para apurar o uso indevido dos recursos do SUS na compra da cloroquina deveriam incluir como alvo o próprio Jair Bolsonaro. Sua insistente defesa do remédio ineficaz, por exemplo, antecede a ida de Eduardo Pazuello para o Ministério da Saúde. É óbvio que a compra e a distribuição do medicamento foram feitas em obediência ao chefe, e o TCU tem amplas formas de provar isso — assim como se pode demonstrar que o vaivém no caso da vacina “chinesa” foi conduzido segundo as mudanças de humor de Bolsonaro.
Nomeado para a função à revelia da lista da categoria, e com alguma chance de chegar um dia ao STF pelas mãos de Bolsonaro, o PGR Augusto Aras parecia não ter vontade de investigar ninguém pelos desmandos da pandemia. Pressionado depois de uma nota desastrada em que jogou no colo do Congresso a missão, pediu ao Supremo abertura de inquérito contra Pazuello — livrando, é claro, a cara de Bolsonaro. Se as investigações prosseguirem seriamente, porém, será inevitável esbarrar na digital presidencial em algum ponto do caminho de desídia, inépcia, incompetência e insensibilidade que levou brasileiros a morrer por falta de oxigênio em Manaus.
Em qualquer lugar do mundo democrático, a responsabilidade, ainda que culposa, por mortes que poderiam ser evitadas, e o uso de recursos públicos para iludir a população com medicamentos ineficazes são crimes graves, suficientes para derrubar governantes. A pergunta que se faz agora é por que não serão aqui, perante instituições que já afastaram uma presidente da República por “pedaladas fiscais”…
Helena Chagas é jornalista