Por João Bosco Rabello
Ao final de quatro meses, o governo Bolsonaro colhe resultados previstos mesmo antes de sua posse: a reforma da Previdência caminha para aprovação, embora em ritmo menor que o desejável, e o pacote anticorrupção do ministro Sérgio Moro tramita em segundo plano com chances bem menores de preservar sua essência original.
A falta de uma coalizão parlamentar mínima, opção do presidente, responde apenas em parte por essa síntese. A dimensão das mudanças prometidas na campanha representa uma guinada no modelo político e administrativo de tal monta que mesmo uma base unida teria dificuldades em materializá-las integralmente e, mais ainda, de forma simultânea.
Para agravar, a composição ministerial é fraca, com poucas exceções, como no caso da área econômica e infraestrutura. O debate ideológico provocador do governo é proposto por perfis muito aquém do desafio e, por isso, encontra dificuldade em sustentar-se. De novo, a exceção é o ministro da Economia e o do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que ao menos sabe defender suas teses.
A área de comunicação, até aqui, dispensou todas as formas clássicas para focar exclusivamente nos meios digitais que para governar não tem a mesma eficácia que para eleger. Não se governa por twitter ou Facebook , que são apenas meios de apoio e difusão de conteúdos. A compreensão da reforma da previdência, por exemplo, ainda passa ao largo de boa parcela da população, como mostrou pesquisa do Ibope.
No parlamento, a mistura de inexperiência e desarmonia dos aliados ao governo, impõe derrotas pontuais evitáveis que se não impactam naquilo que é essencial no primeiro ano de governo – o resgate da economia a partir da Nova Previdência -, produz desgastes como o vai e vem do Coaf – ora no ministério da Justiça, ora no da Economia; ou da Funai, ora na Agricultura, ora na Justiça de novo.
Há erros de concepção no redesenho ministerial que obedeceu muito mais à necessidade de cumprir a promessa de redução de Pastas do que em dar-lhe alguma lógica. Tirar a Funai da Justiça, em si, não seria grave, se não fosse a transferência para a Agricultura, parte do crônico conflito entre populações indígenas e o agronegócio.
Outro erro foi reunificar Justiça e Segurança Pública,- este o maior acerto da gestão anterior.
Poderia a Funai ter ido para a pasta da Integração Nacional, análoga ao antigo e extinto ministério do Interior, por exemplo. Mas a Integração desaparecera para voltar agora quando a realidade se impôs e o presidente teve de ceder ministérios a políticos. Mudar a Funai é determinação de governo, mas precisaria ser feita de forma pensada.
O Coaf fará menos falta ao ministro Moro do que este tenta fazer crer, pois tem a garantia de seu comando dada pelo ministro da Economia. Não era o caso de colocar como prioridade da Pasta agora, acima do seu pacote anticorrupção. Para complicar, outras batalhas foram resgatadas, como a do poder de investigação da Receita Federal, que rivaliza em grau de polemização com a transferência do Coaf para Moro.
As duas medidas se inserem no contexto de disputa de poder, que o Parlamento farejou há muito tempo. Há os que temem o poder investigativo do Coaf por questões pessoais, e o vetam na Justiça em causa própria, mas há os que temem o poder político que o Coaf dará a Moro, um potencial candidato à Presidência da República.
Além do mais, apesar de contrariar uma condição que impôs para assumir o cargo, não se deve prever que Moro deixaria o governo por essa derrota parcial. Sua meta é maior, tem método, e seria ingênuo desistir por um obstáculo previsível no projeto que concebeu, com tal determinação que o levou a abandonar a zona de conforto da magistratura.
Em política, velha ou nova, não se pode tudo -, pelo menos, ao mesmo tempo. Os avanços são graduais e, quando o tempo é escasso, eleger prioridades é indispensável. Isolar-se do Congresso não é boa receita, do que a história está repleta de exemplos. Expor-se a perder o foco a partir de conflitos internos também não costuma dar certo.
Nesse momento, o governo comete todos esses erros ao mesmo tempo. Melhor seria que os ministérios trabalhassem em silêncio enquanto a Previdência passa.
(João Bosco Rabello é jornalista profissional há 40 anos em Brasília e sócio-editor do site Capital Político –capitalpolitico.info)