Ao assistir a participação do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, na comissão especial da Câmara dos Deputados, na terça-feira passada – a ponto de quase arrebentar de empáfia, descaso e desinformação quanto à relevante função pública que exerce em tempos tão graves da pandemia Covid-19 – além da ignorância, tão estranha quanto lastimável, de lições primárias de Geografia e até das quatro estações do ano no País aonde nasceu, estudou e fez carreira a ponto de alcançar um dos postos mais elevados das Forças Armadas – lembrei imediatamente do coco magistral “O Secretário do Diabo”, do imortal Jackson do Pandeiro. Neste caso , o Tinhoso parece ter preferido mandar como representante um general de quatro estrelas da Infantaria do Exército Brasileiro. Uma lástima.
Meu Santo Antônio da Glória! Em plena celebração do seu dia (13/6), o jornalista – um ateu que já acreditava nos milagres do poderoso santo português desde menino da beira do São Francisco (rio da minha aldeia), muito antes de visitar seu templo maior de devoção, na italiana Pádua, e me ver ajoelhado diante de seu túmulo –, pergunta, meio desconcertado e com vergonha: O que se há de fazer, meu santo?
“O Diabo quando não vem, manda um secretário. Eu não vou nessa canoa, que eu não sou otário”, canta o insuperável ritmista da música popular brasileira, agora através do computador. Tiro e queda, diga-se a bem da verdade e do fato jornalístico, se comparado com a atuação tosca do ministro da Saúde do ponto de vista das informações e domínio dos dados e problemas específicos da pasta entregue pelo presidente da República ao general de infantaria, “eficiente cumpridor de ordens”, nesta quadra tão angustiante e temerária da saúde pública nacional. Mas, para surpresa geral, precário e sofrível até em termos de conhecimentos gerais primários, a partir do fato de que estamos falando de um oficial do mais alto rango das nossas Forças Armadas.
Na Câmara, ao tentar camuflar, jogar para debaixo do tapete e dificultar a divulgação dos dados reais de contaminados e mortos da pandemia no Brasil, o ministro Pazuello disse que a mudança aumenta a transparência, porque, a partir de então, os números ficariam à disposição 24 horas por dia. “Não precisa mais me perguntar que horas vai botar o dado. Na hora que o dado chega do gestor ele é colocado no BI (boletim de informação da saúde), e acabou, vai imediato. Se chegar às 16h, o nome do “cara” estará lá”.
Precisa desenhar a gravidade de tamanha grosseria e falta de sensibilidade? Se tais palavras de um ministro da Saúde, reduzindo a “caras” os mortos pelo novo corona vírus no País – quando o número já beirava os 40 mil – tivessem ficado restritas ao ambiente da comissão especial que acompanha o avanço da pandemia, já seria motivo de escândalo em qualquer lugar civilizado do planeta. Mas a fala de Pazuello, reproduzida nos noticiários de ponta a ponta da Nação, soou como uma botinada na memória das vítimas e de suas famílias, e uma bofetada humilhante na face da sociedade brasileira.
Glorioso Santo Antonio, louvado neste seu dia de pedidos e agradecimentos por seus milagres e graças, pelos católicos do Brasil e do mundo inteiro, peço licença para terminar este artigo que é também em seu louvor, com versos do imortal Jackson do Pandeiro: “Não vou na onda nem no conto do vigário, que o diabo quando não vem, manda um secretário”. Oremos!
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: vitors.h@uol.com.br