A rotina da democracia alterna a retórica estridente dos discursos, as “terras prometidas” pelos candidatos, com palavras severas ditadas do realismo das gestões e com a serena avaliação dos efeitos do revés eleitoral.
Neste clima em que se restaura a normalidade cotidiana, não faltam a contabilidade das perdas e dos ganhos e as projeções aligeiradas sobre uma remota eleição eis que sujeita às chuvas, trovoadas e ao impacto do aleatório sob a forma implacável dos “cisnes negros”.
Em relação às previsões, projeções, e à certeza das pesquisas, os eleitores são a esfinge que devora todos que tentam decifrá-los.
Certamente quase tudo já foi dito sobre o assunto. Para não passar em branco, seguem despretensiosas reflexões:
1. Em geral, os resultados apontam para uma vitória dos partidos que formam o centro político (importante distinguir “o centrão de raiz”, governistas de sempre, e “o centro reformista” um conjunto de partidos e lideranças com tonalidades liberais, social-democratas, mantendo distância do bolsonarismo, porém dispostos a apoiar a agenda econômica do governo).
2. O enfraquecimento da esquerda com destaque para a desidratação do PT e o seu líder Lula, e uma emergência relevante Guilherme Boulos (PSOL) que, repaginado, sem perder a identidade, tem futuro. Ciro empina uma candidatura presidencial liderando as siglas da esquerda com olhares de cobiça para nacos do centro. O PT é um caso à parte.
3. O fortalecimento do DEM coloca o partido e suas lideranças nos rumos do cenário nacional. Tem palco, enredo, plateia e seu protagonismo vai depender do personagem. O PSDB tem, desde sempre, o personagem; falta o enredo.
4. O Presidente Bolsonaro faz de conta que nada tem a ver com a eleição, ou seja, nem ganhou, nem perdeu, mas se depara com um problemão: uma agenda travada e sem palanques, é hora de pegar no pesado.
Por sua vez, o setor produtivo aguarda decisões estratégicas para jogar o jogo da economia, com regras estáveis e previsíveis, de modo que a sociedade, especialmente os mais pobres, sejam efetivamente beneficiados por um crescimento sustentável.
Neste meio tempo, há uma decisão de grande significado político para o governo e que permite avaliar o custo de transação com “o centrão de raiz” para entregar as reformas necessárias para que o Brasil retome o caminho da recuperação. Refiro-me às eleições das Casas Legislativas.
Tudo indica que a economia será o grande cabo eleitoral do pleito de 2022. Este fator decisivo não se resolve com a fugaz popularidade de uma renda mínima generosa que levará o Brasil à ruína da insolvência. Pelo contrário, exige o fortalecimento estrutural da economia, enfrentando os privilégios corporativos de sempre e um prejuízo imediato da popularidade a ser compensado por um ambiente de maior solidez e menos afetado pelos solavancos dos esbirros ideológicos.
Em política, o que parece é, mesmo não sendo. A experiência recente demonstrou o inverso: o que parece a política velha é política velha e, sem ela, ao menos por um custo suportável, a agenda reformista não anda e os brasileiros padecem.
Gustavo Krause foi ministro da Fazenda